A morte do menino Henry Borel, de apenas 4 anos, no mês passado, no Rio de Janeiro, chocou o país, principalmente depois de comprovadas agressões físicas e da prisão da mãe da criança, Monique Medeiros, e do padrasto, o vereador Dr Jairinho, acusados do crime. Em entrevista ao RDTv a docente de Clínica Pediátrica e vice-coordenadora de Psicologia da FMABC (Faculdade de Medicina do ABC) Maria Regina Domingues de Azevedo, e a coordenadora do Pronto Socorro e da Unidade de Internação de Pediatria do Hospital e Maternidade Christóvão da Gama, Talita Rizzini, falam sobre como identificar se uma criança está sofrendo algum tipo de violência, física ou psicológica.
“Toda mudança de comportamento é um sinal evidente de que há algo acontecendo”, aponta Maria Regina. “Se não se detecta o que está acontecendo, as consequências, se não são tão danosas como caso do Henry que foi a óbito, é quase que uma morte em vida porque as marcas e as cicatrizes emocionais vão se perpetuar na vida daquela criança. Em geral as crianças aprendem por modelo, por imitação; portanto uma criança que apanha, vai bater; o que hoje é violentado, amanhã será um violentador. E não é só a violência física, a violência psicológica permeia todas as outras violências”, explica.
Para a especialista da FMABC, a pandemia e o isolamento social das famílias afastaram os pequenos do convívio com colegas, amigos e pessoas que poderiam identificar essas violências. “A medida que ela começa a ficar mais apática ou nenhum canal da televisão serve; fica irritada por qualquer coisa, morde, bate, chuta, ou fica o tempo inteiro agressiva jogando coisas ou quebrando brinquedos como não fazia antes é hora de olhar com atenção. Um sentimento muito presente sempre nesses casos é o medo, o olhar da criança. O olho de uma criança feliz brilha, o de uma criança amedrontada não se abre igual, a expressão do rosto é outra”, orienta Maria Regina.
Para a coordenadora de internação de pediatria do Hospital Christóvão da Gama, diz que os casos de violência aumentaram durante a pandemia. “Os pais estão mais em casa trabalhando, e as crianças estão expostas a irritabilidade dos pais, que estão estressados com o trabalho ou por motivos financeiros. Antes as crianças passavam por um observatório natural, na escola, os amigos, os vizinhos, A gente observa que isso se perdeu. Crianças de até 4 anos, provavelmente não vão denunciar que sofrem violência ou maus tratos, mas vão mudar o comportamento, só que estando dentro de casa, você não vai conseguir observar que ele está sofrendo uma violência, não vai ter quem socorrer”.
Outra situação que vem ocorrendo na pandemia é que os pais levam menos as crianças ao pediatra. “Quando são os pais agressores, procuram levar em atendimento de pronto socorro, porque não querem vínculo com o pediatra. Isso porque numa consulta de rotina o médico vai tirar a roupa, observar porque ela está com comportamento alterado, então nem sempre isso chega a alguém que tenha uma voz mais ativa para acionar um conselho tutelar, o ministério público ou um disque denúncia, temos vários canais para denunciar. Mas a gente precisa ter a cultura de denunciar” recomenta Talita Rizzini.
Maria Regina recomenda procurar ajuda profissional em posto de saúde ou marcar consulta com pediatra. “Procurar ajuda sempre nos primeiros sinais, para não ficar com dúvida. Importante é que se quebre a cultura do silêncio; precisamos aprender a falar e denunciar, não se pode pensar que ir ao psicólogo é sinal de loucura, ao contrário, é sinal de saúde e cuidado”. Segundo Maria Regina os municípios oferecem atendimento psicológico nos Caps (Centro de Atenção Psicossocial) e há também serviços que estão funcionando online em universidades.