Câmeras de monitoramento, muros e portões altos e cercas eletrificadas além de fechaduras reforçadas são alguns dos recursos mais comuns adotados pelos moradores das grandes cidades. O motivo é a criminalidade, o medo de que bandidos invadam as casas para atacar a família e roubar. Mas o crime mais simples, o furto, é o que tem sido mais comum e apesar do indicador deste delito ter diminuído do ano passado para cá, a sensação de insegurança só aumenta.
De acordo com apuração feita pelo RD, com base nos números oficiais da Secretaria de Segurança Pública, o furto a residências caiu em percentual bastante significativo no primeiro bimestre deste ano se comparado com igual período do ano passado. Entre janeiro e fevereiro do ano passado, o ABC registrou 340 casos de furtos a residências e nos dois primeiros meses deste ano foram 154 registros, uma queda de 54,7%. Esses números consideram as invasões a casas e a condomínios residenciais, este último uma situação cada vez mais comum, com a audácia de criminosos que burlam a segurança dos edifícios.
Os números, no entanto, podem refletir apenas uma parte da realidade, pois como o furto em geral envolve bens com valores pequenos, nem sempre a queixa é registrada. O não registro dificulta a ação policial e o criminoso que encontrou facilidade na invasão continua a fazer novos crimes. Essa subnotificação dos furtos a residências faz com que o cidadão aumente a sensação de insegurança.
Medo
O medo tomou conta até das cidades menores em termos de população e com características de cidades pacatas, como Ribeirão Pires. Uma moradora do Centro da cidade, que preferiu não se identificar, testemunhou tentativa de furto e contou qual é o seu sentimento. Conta que no dia 3 de abril um rapaz tentou entrar em algumas residências na ruas Cláudio Maurício Maciotta e Bechelli, mas foi surpreendido pela polícia. “Ouvi os cachorros latindo ininterruptamente na rua e uns barulhos de portão. Quando saí de casa para ver o que era, encontrei com meu vizinho conversando com a polícia. Isso porque um rapaz tentou abrir os portões na rua e, sem sucesso, foi até a rua de trás tentar entrar nas casas”, conta.
Nas maiores cidades da região essa situação é bem frequente. No bairro Baeta Neves, em São Bernardo, outro morador relatou ao RD que o imóvel onde mora foi alvo de furto. Segundo o morador, que preferiu não se identificar, um homem invadiu o local onde há cinco casas, e levou uma bicicleta do vizinho. “Além do prejuízo, tivemos de colocar câmeras e aumentamos a segurança das fechaduras e cadeados. Nos últimos tempos temos percebido pessoas estranhas rondando o bairro”, relata.
No mesmo Baeta Neves, em março do ano passado, casos de furto de cabos de energia assustaram os moradores. Os criminosos subiam em muros e portões acessavam a rede elétrica para cortar a fiação e arrancá-la. Esse material vai parar em depósitos de recicláveis que compram fios de cobre sem verificar a procedência.
Para o major Fernando Carvalho, do 6° Batalhão da Polícia Militar, em São Bernardo, a queda dos boletins de ocorrência de furtos é uma realidade, mas também é real a sensação de insegurança e, na ótica do oficial da PM, as câmeras de segurança e a viralização de imagens de bandidos pulando muros, forçando fechaduras ou ainda entrada em prédios apenas contribuem para o temor da população.
Sensação
A facilidade de acesso a um sistema de videomonitoramento, algo que era distante das possibilidades econômicas da maioria da população, é um fator importante. “De fato os furtos a residências caíram bastante, mas tenho que concordar que a sensação de insegurança aumentou. Os números são bons para a polícia, mas é curiosa essa situação de sensação de insegurança, pois eu já tive números ruins em determinada região, porque os casos aumentaram, mas a população se sentia segura, o contrário do que acontece hoje”, relata Carvalho.
Para o major, as imagens captadas pelas câmeras são postadas nas redes sociais e ganham muitos compartilhamentos e esse é um fator que amedronta os moradores. “As notícias trafegam muito rápido e as imagens falam por si”, completa.
Para o professor de Direito Penal e coordenador do Observatório de Segurança Pública da USCS (Universidade Municipal de São Caetano do Sul), David Pimentel Barbosa de Siena, primeiro é preciso analisar um período maior de dados para aferir se há uma tendência forte de queda deste tipo de crime. “Se até o final do primeiro semestre repararmos que continua em queda, já podemos falar que é uma tendência. O crime de furto tem algumas especificidades. Ele aumenta em períodos de férias e festas, porque é quando as casas ficam desabitadas. Há esse fator sazonalidade”, aponta.
Crime e notícia quase em tempo real
Siena concorda com o major da PM sobre a contribuição das imagens compartilhadas em redes sociais para a sensação de insegurança. “A sensação de insegurança depende não só do número de registro de boletins de ocorrência, ela tem a ver com a criminalidade real e não com a estatística. Antigamente a gente tinha hora marcada para ter contato com a mídia do crime, quem quisesse ter contato com esse tipo de informação tinha de esperar determinado horário e ir à televisão e, em determinados canais, consumir esse tipo de notícia, hoje em dia isso não ocorre mais, os crimes são transmitidos quase em tempo real. A gente acaba consumindo essas notícias quase que instantaneamente pelas redes sociais”, diz Siena.
O uso de câmeras pelo poder público por empresas e por moradores transformou o que antes era uma notícia de crime que parecia distante, algo de preocupação de toda comunidade. “Hoje em praticamente todas as ruas se tem câmeras gravando. O que antes nos era contado hoje somos testemunhas de crimes e eu acredito que isso deve ter um impacto nessa sensação de insegurança. A gente consome essas imagens e elas acabam alterando o nosso ânimo, ficamos preocupados, às vezes revoltados. Essa super exposição pelas redes sociais colabora com essa sensação de insegurança”, analisa o professor da USCS.
“Por mais que a SSP divulgue dados positivos, as pessoas continuam a testemunhae crimes graves. Cidadão comum não vai se sentir mais seguro com as estatísticas porque acabou de ver um roubo na rua dele. O que importa é o que ele está vendo”, completa David de Siena.