Em abril deste ano, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou nova lei de funcionamento para as delegacias de defesa da mulher (DDMs) em todo território brasileiro: agora com atendimento integral (24h por dia). Apesar de já instaurada, a lei se aplica a poucos municípios, em razão da falta de pessoal e valorização profissional. Ao RDtv, a presidente do Sindicato dos Delegados do Estado de São Paulo (Sindipesp), Jacqueline Valadares, comenta que o problema vai além: envolve também a falta de estrutura para efetividade dos serviços e concursos públicos para mais contratações.
Segundo Jacqueline, São Paulo é o Estado com a maior rede de atendimento à mulher no País, representa cerca de 38% de todo território nacional, mas apesar da dimensão do serviço, ainda existe pouca efetividade no que se refere a proteção da mulher. O que tem ajudado, segundo a delegada, são os atendimentos online, que permitem a vítima realizar a denúncia virtualmente, direto de sua casa. “Apesar disso, precisamos de unidades físicas que estejam em pleno funcionamento e com profissionais capacitados para atendimento”, frisa.
A delegada comenta, ainda, que a falta de profissionais em todo o Estado impacta diretamente no número de mulheres atendidas pelas delegacias da mulher. “Hoje o grande problema que temos em São Paulo é o alto déficit de servidores em todos os municípios”, diz. Jacqueline comenta que a Polícia Civil enfrenta um déficit histórico de quase 40% no seu pessoal.
Esses dados também foram apresentados no lançamento da Frente Parlamentar em Prol das DDMs. A Polícia Civil bandeirante tem, hoje, mais de 16,9 mil cargos vagos. O levantamento se tornou público recentemente, durante o lançamento da mais nova Frente Parlamentar, na Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp).
Para o estudo, foram ouvidas 41 pessoas, todas vinculadas, de alguma maneira, ao expediente de uma DDM ou da Polícia Civil. Os entrevistados citaram 118 pontos de melhorias para os equipamentos. As informações foram classificadas, na tabulação final, em sete grupos.
E os concursos públicos?
Segundo a delegada, existe uma pressão do Sindicato para que sejam abertos novos concursos, e no momento existe um concurso que está sendo finalizado para o cargo de delegado, que por sua vez conta com um déficit de 1 mil profissionais.
“Existe um concurso prestes a finalizar que tivemos aprovação de um pouco mais de 300 delegados. A expectativa é que todos sejam chamados, para minimizar um pouco esse déficit”, afirma. Para isso, já existe um novo concurso aprovado, e a prova será realizada em dezembro deste ano, com 500 vagas para o cargo de delegado de polícia. “Contudo há uma grande demora, pois são concursos complexos, que envolvem a realização de várias fazes, como: testes teóricos, testes práticos, exames psicotécnicos etc.”, diz.
Qual é o impacto?
A falta de material humano afeta diretamente no funcionamento das DDMs e no atendimento desse grupo vulnerável, que envolve mulheres vítimas de violência doméstica e crimes sexuais, além de crianças e adolescentes que também são atendidos pelas delegacias.
Apesar da possibilidade de abrir um boletim online, infelizmente a internet e as novas tecnologias ainda não são acessíveis a todos, tendo em vista que uma parcela da população possui grande dificuldade em utilizar esses meios, fato que também impacta diretamente na sobrecarga de trabalho, aos profissionais que reclamam das baixas remunerações e plantões exaustivos.
Quais os principais crimes?
As DDMs recebem, diariamente, diversas queixas que vão desde crimes contra honra, como injúria e difamação, até abusos, estupro, abortos (onde em muitos casos a mulher é obrigada pelo seu parceiro a realizar um aborto), lesão corporal, ameaças etc.
Acontece que, em muitos casos, as mulheres associam aos crimes de violência somente agressões físicas, e por isso, a delegada frisa a importância de analisar e denunciar outras situações. “Violência moral, psicológica, sexual e patrimonial também estão prescritas na Lei Maria da Penha, e devem ser denunciadas”, afirma. Também há um grande aumento de crimes virtuais, em que o agressor divulga fotos da vítima, começa a persegui-la na internet ou até mesmo no mundo real. Nestes casos, a orientação é que também seja realizada denúncia.
Dados
Segundo dados da Secretaria de Segurança Pública do Estado de São Paulo (SSP-SP), em setembro de 2023 foram registradas, ao todo, 21.537 denúncias de violência contra mulher e todo Estado, aumento considerável em relação ao mês anterior. Entres os crimes com mais denúncias estão: ameaça (8.409 casos), calúnia – difamação – injúria (5.481) e lesão corporal (5.130).
Os dados também apontam crimes como: feminicídio e homicídio doloso (48 casos), estupro consumado (267 casos), estupro tentado (34 casos), estupro de vulnerável (858 casos), estupro de vulnerável tentado (16 casos) e outros crimes sexuais (90). Todos esses dados estão disponíveis no portal da SSP-SP.
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