
Os dados do Censo 2022 sobre educação, divulgados nesta quarta-feira (26/02) pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostram que São Caetano é primeiro lugar no país em percentual de moradores com curso superior completo. Na cidade 45,2% da população tem ao menos uma graduação concluída, o que significa quase 61 mil pessoas. A cidade primeiro lugar no ranking ficou muito acima da média nacional que é de 16,75% e do Estado, que é de 21,54%. São Caetano também não tem concorrente no ABC, a cidade melhor colocada depois dela é Santo André, que ficou apenas em 18° no ranking nacional com 28,98% de moradores com curso superior.
São Bernardo ficou na 27ª posição no ranking nacional com 27,02% de moradores com curso superior, o que representa 173 .211 moradores. As demais cidades da região ficaram abaixo do índice paulista. Ribeirão Pires, como uma das cidades com menor população surpreendeu no 195°; por lá 19,57%, ou 17.955 pessoas têm curso superior, índice muito maior do que Diadema (673° lugar com 15,14% ou 46.311 pessoas) e do que o de Mauá (711° lugar com 14,97% que representam 48.509 pessoas com curso de graduação completo). Mas o município com pior índice é Rio Grande da Serra, com apenas 10,38% da sua população com curso universitário concluído, número que representa 3.464 pessoas.
Para o professor Paulo Garcia, do Observatório da Educação da USCS (Universidade Municipal de São Caetano do Sul) as causas desta disparidade podem ser questões socioeconômicas, a postura do município de investir mais ou menos na educação básica e a diferença entre pobres e mais abastados além de brancos e pretos. A pesquisa revela que na universidade a maioria ainda é branca, apesar de pretos e pardos terem quintuplicado desde o Censo de 200o. “A primeira coisa que afeta esses números é a herança histórica da escravidão, fazendo com que pessoas ficassem muitos anos à margem da educação. Depois vem a desigualdade socioeconômica e a qualidade da educação básica. Muitas famílias mais pobres frequentam escolas onde faltam professores e tudo isso são barreiras para o ensino superior”, analisa.
De acordo com Garcia o ensino superior foi historicamente destinado a poucas pessoas. “São recentes as políticas de quotas, o Pró-Uni e as políticas de inclusão. Mas eu não vejo com grande surpresa as diferenças no ABC. Essa é uma característica do Brasil, que tem municípios trabalhado forte na Educação Básica. Por outro lado poderiam ter algumas políticas de diferentes cidades que conversassem. O problema é que o país não tem números bons de permanência nas escolas, então são duas coisas importantes; maiores e melhores políticas e não se pode deixar de lado a questão da desigualdade social, que se não observada pode virar uma desigualdade escolar”.
Baseado em pesquisas, Paulo Garcia aponta que quanto maior a renda da família, maior a formação e ocupação dos pais, melhores serão os resultados do filho na escola. “Essa tríade forma o arcabouço para a formação do aluno, determina o sucesso na educação básica e o acesso ao ensino superior”, aponta. Sobre o êxito de São Caetano, o professor avalia que pesam muito a infraestrutura escolar, a tecnologia oferecida e a formação dos professores e gestores. “Para tudo isso são precisos investimentos do poder público”, completa.

A professora Ana Célia Araújo da Silva, do curso de Pedagogia da Faculdade Anhanguera São Bernardo diz que é difícil estipular um percentual ideal de pessoas com curso superior considerando a realidade brasileira, ela cita exemplos de outros países. “O percentual ideal de pessoas com ensino superior depende de vários fatores, como as necessidades do mercado de trabalho, a estrutura da economia e a valorização de outras formas de qualificação, como o ensino técnico e profissionalizante. Podemos fazer uma comparação nos Estados Unidos e no Canadá, por exemplo, cerca de 40% a 50% dos adultos possuem diploma universitário. Na Europa, essa taxa também gira em torno de 30% a 45%, dependendo do país. No Brasil, um percentual entre 30% e 40% seria um bom objetivo a longo prazo, equilibrando a formação superior com outras formas de qualificação, como cursos técnicos e tecnológicos, que também são essenciais para aumentar a renda e atender às demandas do mercado”.
Para a professora cada município tem uma realidade socioeconômica, que influencia no acesso aos cursos de graduação. “Alguns pontos devem ser levados em consideração como: o perfil socioeconômico. São Caetano, que lidera o ranking, tem um IDH muito alto e uma economia mais voltada para setores de tecnologia e serviços qualificados, que exigem maior escolaridade. A cidade também possui uma população com renda média mais elevada, o que facilita o acesso ao ensino superior. Santo André e São Bernardo possuem uma economia diversificada, incluindo indústria e serviços, o que permite um índice intermediário de educação superior. Os municípios como Diadema, Mauá e Rio Grande da Serra têm uma maior presença de empregos industriais e operacionais, que historicamente não exigem ensino superior, o que reduz o estímulo à busca por um diploma universitário. Outro fator é a qualidade e acesso à Educação Básica. O Ensino Fundamental e Médio de qualidade é essencial para preparar os estudantes para o vestibular e o Enem. Municípios com escolas públicas mais estruturadas e maior investimento na educação básica tendem a ter mais alunos ingressando no ensino superior. A falta de escolas técnicas e de ensino médio de qualidade pode desestimular os jovens a seguir para a faculdade”, lista Ana Célia.
A professora da Anhanguera diz que a oferta de cursos de Ensino Superior na região também influencia no ranking. “Cidades que possuem universidades públicas ou privadas bem avaliadas tendem a ter maior adesão ao ensino superior. São Caetano, Santo André e São Bernardo contam com instituições de ensino renomadas, enquanto cidades como Mauá e Rio Grande da Serra possuem menos opções, o que pode dificultar o acesso dos moradores. Assim essa disparidade entre os municípios do ABC não é apenas uma questão de investimento no ensino fundamental e médio, mas também reflete aspectos socioeconômicos, culturais e estruturais. Melhorar a educação básica é essencial, mas também é importante ampliar o acesso ao ensino superior (bolsas, financiamento estudantil, universidades públicas) e valorizar o ensino técnico e profissionalizante para garantir melhores oportunidades para todos”.
Amparo
Não se pode pensar no acesso ao Ensino Superior da população mais carente sem apoio governamental e numa boa base da Educação Básica, segundo Ana Célia. “Precisamos pensar que a população mais carente acaba por necessitar de maior apoio em programas de bolsas e auxílio financeiro como transporte, alimentação e moradia. Se faz necessário pensar em melhorar a qualidade da educação básica para aumentar a preparação dos estudantes, um bom exemplo e a criação de mais oportunidades no ensino técnico e profissionalizante, além do incentivo a educação. Acredito que o problema não é apenas financeiro, mas envolve fatores estruturais, culturais e de planejamento educacional.
Muitos jovens entram no mercado de trabalho cedo e não veem no ensino superior uma prioridade. Falta um modelo que concilie educação e trabalho, como cursos universitários flexíveis e ensino técnico de alta qualidade. As empresas da região poderiam criar mais programas de estágio e parcerias com universidades para incentivar a qualificação dos funcionários”, diz a educadora.
Por fim a professora da Anhanguera diz que o compartilhamento de experiências que deram certo poderiam ser mais compartilhadas regionalmente e diminuir as desigualdades no ABC. “A liderança isolada de São Caetano no ranking da educação superior, contrastando com a realidade muito diferente das cidades vizinhas, indica uma falta de articulação regional para estimular o ensino superior no ABC. O fato de São Caetano estar tão à frente sugere que seu modelo de gestão educacional e desenvolvimento econômico poderia ser compartilhado e adaptado para os demais municípios, o que poderia ser feito por meio do Consórcio Intermunicipal”, completa Ana Célia Araújo da Silva