ABC - domingo , 10 de novembro de 2024

Protocolo Não Se Cale se arrasta no ABC e empresários culpam Secretaria da Mulher

Mulher que for vítima de algum tipo de violência pode sinalizar para os funcionários do estabelecimento com o dedo indicador flexionado e os dedos fechados. (Foto: Divulgação Governo de SP)

O Sehal (Sindicato das Empresas de Hospedagem e Alimentação do ABC) reclama de problemas na plataforma criada há mais e um ano pelo Estado para inscrição e treinamento para o programa ‘Não Se Cale’ voltado a quem trabalha em bares e restaurantes. A dificuldade com a plataforma é tamanha que o sindicato estima que nem 10% da categoria concluiu o curso. Além de não estarem preparados para agir em caso de violência contra a mulher, os estabelecimentos estão sujeitos a multas.

A queixa é que a plataforma não responde e a secretaria não tem resposta para o número de treinados hoje na região. “Nós mesmos não conseguimos acessar a plataforma, tive informações que a Acisa (Associação Comercial e Industrial de Santo André) também não consegue, se a gente não consegue, imagine os trabalhadores”, aponta Beto Moreira, presidente do Sehal.

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Moreira diz que faltou diálogo com as entidades de classe, que poderiam ser parceiras e formar grupos, invés de formar pessoas individualmente. “Eles quiseram ficar no controle, mas os sindicatos patronais e de trabalhadores teriam condições de fazer isso muito mais rápido. Se quiserem eu formo pessoal aqui no Sehal, mas tem que ser em grupos, não com um login para cada um, porque assim fica inviável”, diz .

Enquanto a esmagadora maioria dos trabalhadores ainda não está formada no curso, segundo o Sehal, a orientação que o sindicato dá aos associados em caso de qualquer tipo de violência contra a mulher é que a polícia seja chamada. “A gente não pode colocar o nosso funcionário entre a mulher e o agressor, porque o funcionário pode ser uma vítima também da agressão e indiretamente o comércio também acaba envolvido. Um monte de coisas pode sair errado. Essa situação que o Estado nos coloca não é razoável, traz o curso aqui para o Sehal que eu dou e não cobro nada, mas tem de funcionar”, critica.

O representante do Sehal diz que, se algum comerciante da região for penalizado com multa pelo não cumprimento do Protocolo Não Se Cale a entidade vai recorrer à Justiça em nome do setor inteiro. “Se multarem vou recorrer e entrar com ação contra o Estado”, anuncia.

Secretaria da Mulher não tem números do ABC

Em nota, a Secretaria da Mulher de São Paulo diz que ao menos um funcionário de cada estabelecimento precisa estar formado no protocolo para evitar ser multado. O Procon é o órgão responsável por essa fiscalização. A secretaria foi indagada pelo RD sobre o número de trabalhadores que já concluíram o curso no ABC, mas o questionamento não foi respondido, a pasta estadual limitou-se a falar em números estaduais divididos apenas entre Capital, litoral e interior.

Beto Moreira diz que se o Estado entregar a formação para Sehal fará a formação sem custos (Foto: reprodução)

“Desde o início do curso do Protocolo Não se Cale, em agosto de 2023, são mais de 70 mil inscritos no Estado, com mais de 25 mil que concluíram a capacitação no primeiro semestre deste ano. Na Capital, o Procon já orientou 341 estabelecimentos em três ações específicas do Não Se Cale em dezembro de 2023, março de 2024 e abril de 2024. Desde maio de 2024, protocolo integra a fiscalização regular do órgão, com mais 100 estabelecimentos paulistanos impactados. No interior e litoral, 1.345 fornecedores foram orientados em 100 municípios”, diz a nota da Secretaria da Mulher de São Paulo.

Ainda de acordo com a Pasta, nas operações, quando encontrada alguma inadequação à lei – falta do cartaz obrigatório e a não apresentação do certificado que comprova a capacitação de funcionários – o estabelecimento é notificado e tem  prazo de sete dias para apresentar defesa.

Apesar das medidas de punição, a fiscalização aceita que pelo menos um trabalhador tenha a formação no Protocolo Não Se Cale. “Tendo em vista que a legislação é recente e ainda não foi possível todo o contingente estimado de trabalhadores desses setores se qualificarem nestes primeiros meses, o Procon-SP considera a obrigatoriedade de que ao menos um funcionário no turno em que ocorrer a fiscalização esteja habilitado com o curso de formação. Quando nenhum dos funcionários tiver realizado o curso o estabelecimento será notificado e isto pode resultar em multa – no ato da fiscalização é feita uma notificação ao estabelecimento e o proprietário tem um prazo de 7 dias para responder ao Procon-SP”, sustenta a secretaria.

O que é?

De acordo com a lei aprovada no Legislativo paulista o Protocolo Não se Cale tem o objetivo de auxiliar as mulheres em situação de assédio, violência ou importunação sexual nos bares, restaurantes, espaços de eventos, hotéis e estabelecimentos do setor de lazer. Os profissionais deverão prestar auxílios previstos no novo protocolo diante de qualquer pedido de socorro ou suspeita destes casos.

Veja a seguir como deve ser o atendimento (as informações são da Secretaria da Mulher de São Paulo):

1) Identificação do caso: a mulher que precisar de apoio pode pedir ajuda tanto verbalmente quanto por meio do gesto de socorro conhecido mundialmente e adotado no protocolo. O sinal é feito com apenas uma mão: palma aberta para cima, polegar flexionado ao centro e dedos fechados em punho.

2) Acolhimento inicial: em caso de situação de risco ou violência à mulher, o estabelecimento deve atender a mulher em local reservado, afastado do agressor por ela apontado e de terceiros, de modo que ela se sinta segura e acolhida.

3) Acompanhamento: após ouvi-la, o estabelecimento deverá ofertar uma ou mais formas de auxílio indicados pela lei – acompanhá-la até o carro, oferecer auxílio para que ela peça outro meio de transporte ou comunicar a polícia. O estabelecimento não está obrigado a disponibilizar um acompanhante no trajeto e nem a pagar o táxi para a vítima, mas poderá fazê-lo se entender possível e se a vítima aceitar. Em todo o caso, a comunicação à polícia é sempre uma alternativa válida e que atende a lei. Caso a vítima esteja em situação de vulnerabilidade química (embriagada ou sob efeito de substâncias químicas), incapaz de se manifestar ou oferecer resistência, seja criança ou adolescente, será necessário o acionamento da rede de proteção (Polícia, Samu, Assistência Social).

4) Registro: é recomendável que os estabelecimentos tenham um livro de ocorrências, que servirá para comprovar o atendimento realizado e a forma de auxílio prestado à mulher vítima de violência ou em situação de risco.

Já em situações em que a mulher sofrer algum incômodo, mesmo em estabelecimento totalmente adequado, ela pode registrar uma reclamação no site da Secretaria de Políticas para a Mulher ou no site do Procon-SP. Nos próprios cartazes afixados nos estabelecimentos há endereços para reclamações e denúncias.

O formulário de inscrição e canais para que a vítima possa pedir ajuda podem ser consultados em: https://www.mulher.sp.gov.br/naosecale/

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