Apesar do tema da conscientização ambiental estar em alta, neste momento, em razão dos desastres ocorridos no Rio Grande do Sul, a simples lição de casa de realizar a reciclagem de resíduos sólidos ainda é desafio para o poder público e a população. De um lado, prefeituras que pouco fazem para instruir munícipes quanto a como e quais itens reciclar, e do outro lado, o baixo volume de famílias que se empenham na separação de itens para destinação correta.
Dados fornecidos por quatro, das sete prefeituras do ABC, revelam que, em 2022, foram recolhidas 225,4 mil toneladas de resíduos secos. Em 2023, o volume coletado foi 35% maior, e chegou a 304,4 mil toneladas recolhidas. Embora pareça muito, o professor de Direito Ambiental da Fundação Santo André (FSA), Tasso Cipriano, analisa que os números são baixos, e poderiam ser ainda melhores se houvesse uma melhor instrução à população através de campanhas publicitárias, incentivo nas escolas e empresas, outdoors etc.
Segundo Cipriano, uma das maiores implicações para o tema são as regras municipais, que variam entre os municípios. “É um problema complexo, porque embora saibamos que falta informação de como reciclar adequadamente, na prática, a gestão de resíduos muda entre um município e outro, o que complica a vida do cidadão que quer reciclar seus itens”, diz. Na visão do docente, o ideal seria que todas as prefeituras realizassem um estudo clínico de quanto resíduo é gerado na cidade, consultasse corretamente o manejo destes materiais para, logo após, adotar as ações necessárias.
Para Cipriano, a metodologia do poder público deveria ir além, e começar desde o ensino da triagem de materiais, a como fazer a separação dos itens, até um investimento mais sério na coleta seletiva. “Nada disso funciona se não houver educação, e precisa ser de maneira simples e clara, para comunicar de maneira concreta como fazer a separação corretamente”, afirma. O professor nota a carência na transparência quanto à reciclagem destes itens. “Esses números não são divulgados de forma clara e aberta à população, é somente repassado ao governo federal que exerce a cobrança”, diz.
Para se ter ideia, em Rio Grande da Serra, a Prefeitura sequer possui serviço de coleta seletiva. Ainda está em processo licitatório a contratação de uma empresa especializada para implementar o serviço na cidade, mas sequer existe uma previsão para que o serviço seja iniciado.
Com o programa Mauá Recicla, em 2023 a cidade registrou 172,7 mil quilos de materiais recicláveis coletados, número 70,4% maior do que em 2022, quando 101,3 mil foram coletados. Este total, no entanto, representa somente 5% do potencial de coleta, segundo a administração.
Já Diadema, que reciclou 104,9 mil toneladas em 2022, e 106,4 mil toneladas em 2023, registrou somente 0,6% de reciclagem nos dois anos, justificado por materiais contaminados. São Bernardo reciclou 12,6 mil toneladas de resíduos recicláveis em 2022, mas ano passado saltou para 13,5 mil toneladas. Este ano, entre janeiro e abril, forma recolhidas cerca de 5 mil toneladas, até o momento.
Santo André, por sua vez, recolheu 9,1 mil toneladas de resíduos secos em 2022 e 11,3 mil toneladas em 2023. Já este ano, foram recolhidas 7,7 mil toneladas entre janeiro e abril, quase que a totalidade do resultado de 2022.
Ribeirão Pires, que reciclou 305 toneladas em 2022, subiu para 354 toneladas no ano passado e já contabiliza 124 toneladas este ano. Diante dos índices, Cipriano analisa que a população tem tido maior consciência ambiental, mas falta maior conscientização e educação ambiental para que estes números cresçam ainda mais e as prefeituras invistam em práticas sustentáveis.
Mauá e São Caetano não responderam até o fechamento da reportagem.
Programas de incentivo
Além dos serviços de coleta de resíduos porta a porta e da possibilidade de entrega de material em estações de coleta, alguns municípios possuem programas de incentivo para a população reciclar material, a exemplo do Moeda Verde, Meu Condomínio Recicla, Moeda Pet, Gincana Ecológica, e Breshopping Sustentável, em Santo André, e o Tigela Cheia, em Ribeirão Pires.
Nestas ações, a população pode participar ativamente com a reciclagem de material e, na troca, podem resgatar produtos. Exemplo é o Moeda Verde (clique aqui) em que moradores de comunidades carentes de Santo André podem trocar itens recicláveis por alimentos hortifrúti.
No Tigela Cheia (clique aqui), moradores de Ribeirão Pires podem trocar garrafas plásticas por alimentos para pets. Cada quilo de material equivale a um quilo de ração. Locais e horários de trocas, de ambos programas, podem ser consultados nas redes sociais e sites oficiais das prefeituras.
Para o docente, mesmo com os programas de incentivo, a questão do tratamento de resíduos no País ainda é complexa e desafiadora, ainda mais por conta da falta de transparência sobre o tema. Assim, se faz necessária maior atuação dos governos municipais, assim como a responsabilização das empresas para garantir logística reversa para seus produtos. “Ainda há muito o que se explorar, incentivar e aplicar nos municípios para que possamos avançar no tema”, garante.
Como reciclar?
Também conhecidos como lixo seco, os resíduos recicláveis são compostos por itens limpos e secos feitos de papel, plástico, vidro ou metal. Ou seja, uma garrafa PET de refrigerante é um item reciclável, desde que seja limpa e seca. Não precisa lavar com sabão, mas passar uma água e depois deixar todos os itens recicláveis para secar é fundamental.
Entram nesta categoria: embalagens de alimentos industrializados, revistas, latinhas, embalagens plásticas de shampoo, sacolas plásticas, papelão, tampinhas, etc. No caso de vidros quebrados, é importante colocar os cacos em uma garrafa fechada ou embalá-los em papel de jornal ou revista, para prevenir cortes em quem terá de lidar com o resíduo.
Resíduos orgânicos (ou molhados)
Quase metade dos resíduos produzidos em casa são orgânicos. Ou seja, restos de comida, como talos, cascas e bagaços. Quando este tipo de resíduo vai para a lixeira comum, ele chega ao aterro sanitário, onde gera metano, um gás 23 vezes mais poluente que o CO2. Neste caso, as opções são: diminuir o consumo e/ou transformar os resíduos em adubo por meio da compostagem.
Resíduos especiais
Dentro desta categoria, estão resíduos que não são recicláveis, mas que também não podem ser encaminhados para o lixo comum porque envolvem algum tipo de risco para quem os manuseia. Entre os exemplos estão: pilhas e baterias, lâmpadas, eletrônicos e medicamentos.
Rejeitos
O rejeito é aquele material que não é possível reciclar, compostar ou dar uma destinação apropriada. Nesse caso, vai para o aterro mesmo, mas corresponde a apenas 10% dos resíduos produzidos em casa. Entram nesta categoria poeira de casa, papéis higiênicos usados, fraldas descartáveis, absorventes, camisinhas, etc. (Obs: materiais recicláveis muito sujos ou contaminados também entram nesta categoria).
Onde reciclar?
Cada cidade possui seu programa específico de reciclagem, que pode ser acessado e/ou agendado via telefone, redes sociais ou site oficial da Prefeitura. Além disso, existem alguns serviços de estações de coleta voluntária, como é o caso de Santo André, que possui 113 PEvs (Postos de Entrega Voluntária), espalhados em equipamentos públicos, como escolas, parques, hospitais, etc.