A Prefeitura de São Paulo estuda a implementação de uma ciclovia e de uma “motovia” suspensas sobre os taludes do Rio Tietê ao longo dos 25 quilômetros da Marginal, da Rodovia Castelo Branco, no chamado Cebolão, até as imediações do Parque Ecológico do Tietê. A proposta prevê também a construção de acessos para as bicicletas e motocicletas por “rampas caracóis” ao lado de cada ponte. A proposta tem dividido opiniões entre especialistas em urbanismo e tráfego.
O estudo é inicial e propõe que a “motovia” fique em uma das margens do rio, e com duas pistas em cada um dos sentidos. Já a ciclovia seria adotada no lado oposto, com o mesmo número de pistas e futuramente interligada com a ciclovia do Rio Pinheiros.
Ao Estadão, o secretário municipal de Mobilidade e Trânsito, Ricardo Teixeira, destacou que se trata de uma ideia em desenvolvimento desde janeiro, que ainda não entrou em fase de projeto. A estimativa é de que a obra levaria de um ano e meio a dois anos para ser implementada, porém o custo está em detalhamento e será divulgado na segunda quinzena de abril.
Velocidade
Para evitar colisões entre motociclistas em sentidos distintos, a ideia é construir uma divisão de concreto e impor um limite de velocidade mais baixo do que o da via expressa. “A velocidade nessa nova pista (elevada) seria de 40, 50 quilômetros por hora no máximo, com radar para fiscalizar”, destacou.
As estruturas estarão acima do nível de vazão das cheias, nos taludes da Marginal. A proposta inclui a colocação de floreiras, parte delas com 1,5 mil árvores de pequeno porte, a fim de criar 25 mil metros quadrados de novas áreas verdes, que idealmente ajudariam na recuperação do rio. Em março, o governador Tarcísio Freitas (Republicanos) anunciou um programa bilionário de despoluição para o Tietê, aos moldes do aplicado no Rio Pinheiros.
A implementação das novas pistas depende de anuência do Estado, responsável pelo rio, como apontou o prefeito Ricardo Nunes (MDB) em uma agenda pública sobre outro tema na quarta-feira. “Como está em fase de estudo, a gente precisa ver agora se há uma concordância do governo do Estado, lembrando que ali estamos nas margens do rio”, respondeu após ser questionado por uma jornalista.
Ele ressaltou que a proposta nasceu a partir do projeto Faixa Azul, de pistas exclusivas para motocicletas, hoje em operação nas Avenidas 23 de Maio e dos Bandeirantes, mas que terá outros moldes, com a via elevada. “A Faixa Azul nas margens dos rios é uma outra etapa que a gente espera que dê certo. É importante estar sempre buscando alternativas, para poder melhorar e diminuir o número de acidentes de trânsito na cidade de São Paulo.”
O secretário municipal da Mobilidade e Trânsito, Ricardo Teixeira, descreveu a proposta como uma junção de exemplos que a Prefeitura conheceu na Malásia (país com uma alta frota de motocicletas e com variedade de vias segregadas) e da ciclovia Tim Maia, no Rio. Sobre os quatro desabamentos enfrentados pela inspiração brasileira, de 2016 a 2019, ele destacou a competência da engenharia brasileira e o fato de a Marginal não ser vizinha do mar, como no caso carioca.
Teixeira diz que a proposta é uma estratégia para reduzir o número de acidentes graves nas Marginais. Somente na Tietê, a média que cita é cerca de dez mortes de motociclistas por ano. Como a do Pinheiros tem estações de trem e um parque, percebeu-se que a alternativa da via segregada seria recomendada e viável apenas nas margens do Tietê.
Pelo tráfego pesado e pela característica de via expressa da Marginal, a Prefeitura chegou à conclusão de que uma faixa azul nos moldes já adotados na cidade deixaria os motociclistas ainda mais vulneráveis. “Tem um risco muito grande de dar errado, com a agressividade que o tráfego tem na região”, diz o secretário.
Especialistas criticam ou sugerem ajustes
A proposta de pistas elevadas divide opiniões entre especialistas, tanto do ponto de vista de segurança viária quanto urbanístico. Pós-doutoranda em Engenharia Ambiental e Urbana na UFABC e autora do livro Várzea do Tietê: Projeto e urbanização marginal, Jordana Zola comenta que a proposta da Prefeitura pode fazer sentido do ponto de vista da mobilidade, mas que “carrega a herança de um modelo de urbanização século 20?, do entorno dos rios como vias de circulação expressa.”
Ele pontua que as autopistas são consideradas ultrapassadas e a tendência internacional é de intervenções para “acalmar” as vias expressas. “Com, por exemplo, um novo desenho de pistas, mais amigável, com a redução do número faixas.”
Doutoranda em Arquitetura e Urbanismo na USP com uma pesquisa sobre as várzeas, Anita Freire observa que se quer “mais uma vez ceder o espaço do rio para o sistema de mobilidade individual motorizado e de alta velocidade”. “É mais uma barreira que se coloca entre a cidade e o rio”, diz.
Já o doutor em Engenharia com foco em Mobilidade Urbana Luiz Vicente Figueira de Mello Filho avalia a proposta como positiva, mas que precisa de alguns ajustes técnicos. Ele propõe que a implementação seja por trechos, e será necessário regular quais veículos poderão utilizar a ciclovia, especialmente elétricos. Ele salienta que são necessárias ações para reduzir acidentes com motos. “A via expressa tem veículos pesados, o motociclista fica fragilizado.”