“O morador de um dos apartamentos agredia bastante a esposa, que se manifestava com gritos e pedidos de socorro. Imediatamente chamamos a polícia. Só veio a grande dificuldade depois porque a vítima tentou proteger o agressor. Aconteceu umas três vezes esse ciclo. O agressor foi embora e depois votou a morar com ela. Mas em todos os momentos chamamos a polícia”. O relato é do síndico Antônio Carlos Lopes da Silva, síndico há oito anos, e que tem se tornado comum nos condomínios residenciais.
Maida Castaldi, síndica há 27 anos, também enfrenta problemas. “Ouvimos crianças gritando e chorando muito de dentro de um dos apartamentos. Subi e comecei a bater na porta da moradora. Eu disse que iríamos arrebentar a porta, mas ela não abriu. As duas crianças gritavam muito e a pessoa espancava demais, batia muito nelas. Eu e alguns moradores tentávamos fazê-la abrir a porta. A polícia chegou rápido, as crianças estavam muito machucadas e foram levadas para os primeiros socorros”.
Alessandra Bravo, advogada especialista em Gestão e Direito Condominial e diretora da Associação Nacional da Advocacia Condominial, afirma que casos assim acontecem dentro de condomínios residenciais, ao lado de quem pode ajudar a salvar e proteger a vida das vítimas, sejam crianças, mulheres, idosos, deficientes e animais, que necessitam do apoio e da denúncia de vizinhos, moradores, síndicos e administradoras dos condomínios. “A violência doméstica e familiar pode ocorrer de cinco formas, juntas e/ou distintas”, diz.
Tipos de violência doméstica e familiar
- Violência Física – qualquer ação que comprometa a integridade física ou saúde corporal da vítima;
- Violência Psicológica – qualquer ação que traga dano emocional, prejudique ou perturbe o desenvolvimento psíquico da vítima;
- Violência Sexual – qualquer ação que coíba a liberdade sexual, reprodutiva, induza a prostituição ou mutilação genital da vítima;
- Violência Patrimonial – qualquer ação que demonstre retenção, subtração parcial ou total, destruição de bens e recursos econômicos da vítima;
- Violência Moral – qualquer ação que configure calúnia (imputar falsamente cometimento de crime), difamação (ofensa à honra e reputação) ou injúria (ofensa à moral – verbalmente ou por escrito) da vítima.
Segundo a advogada, a violência doméstica deve ser denunciada, caso haja flagrante ou suspeita através dos indícios básicos: lesão corporal, gritos, barulhos estranhos, solicitações de ajuda, choros, desaparecimento prolongado.
Alessanda afirma que a violência doméstica deve ser denunciada à Delegacia especializada quando a vítima for Mulher, telefone 180. Quando a vítima for criança, acionar o Conselho Tutelar da cidade. Se a vítima for idosa, acionar o Conselho Municipal do Idoso, caso haja. Entretanto, para todos, pode e deve ser acionada a Policia Militar, no telefone 190.
- Violência doméstica contra crianças, mulheres, homossexuais, idosos, deficientes, incapazes, animais – ligar 190 (Polícia Militar)
- Se a vítima for mulher – ligar 180 (Central de Atendimento à Mulher) – gratuita e sigilosa, funciona 24 horas todos os dias – a denúncia é anônima
- Criança e adolescente – Conselho Tutelar do Município
- Idoso – Conselho Municipal do Idoso
- Animais – DEPA (Delegacia Eletrônica de Proteção Animal)
O Disque 100 ou Disque Direitos Humanos é um canal de atendimento 24 horas que recebe, analisa e encaminha denúncias de violação dos direitos humanos para os órgãos responsáveis. As ligações são gratuitas (e anônimas) e podem ser feitas de qualquer telefone fixo ou celular.
O papel do profissional de portaria
Através do trabalho dos porteiros nos condomínios residenciais, muitos casos de violência doméstica são cessados. Alessandra Bravo afirma que é primordial realizar o treinamento dos porteiros. “Em caso de flagrante, o profissional de portaria deve ligar imediatamente 190. Quando o condomínio já tem a conscientização, pode utilizar-se das palestras informativas para montar um plano de ação e estratégia para os casos de violência doméstica.
A advogada alerta que as medidas protetivas, levadas ao conhecimento do condomínio, devem ser repassadas aos profissionais da portaria. Em caso de tentativa do agressor querer ir até o apartamento, o porteiro deve chamar 190 e o síndico apresentar o documento para a autoridade policial.
Omissão de socorro
Omissão de socorro, quando a denúncia não é feita. Alessandra comenta que o síndico, como qualquer outro morador, pode ser responsabilizado pelo crime de omissão de socorro, previsto no Código Penal, se deixar de prestar assistência ou socorro, caso tenha ciência da agressão através de denúncias, flagrante ou imagens das câmeras internas.
Omissão de socorro – Art. 135 – Deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública. Pena – detenção, de um a seis meses, ou multa. Parágrafo único: a pena é aumentada de metade, se da omissão resulta lesão corporal de natureza grave, e triplicada, se resulta a morte.
Está em tramitação na Câmara dos Deputados em um estágio avançado o projeto de lei (PL) Nº 2510/2020, que obriga moradores e síndicos de condomínios a denunciarem às autoridades competentes casos de violência contra a mulher que ocorram nas dependências do condomínio. O projeto já foi aprovado pelo Senado.