
No último dia 11/11, sentença do juiz Alexandre Chiochetti Ferrari, da Vara Única do Fórum de Rio Grande da Serra, determinou a reintegração de posse de um terreno de mais de 2 mil metros quadrados na Estrada do Rio Pequeno, no bairro Oásis Paulista, onde moram aproximadamente 150 pessoas, a maioria vive no local há mais de duas décadas, alguns há 40 anos. Famílias contatadas pelo RD dizem que os pais é que tiveram a permissão para morar no local através de um contrato de comodato antigo e agora temem não terem para onde ir.
O processo de reintegração de posse é antigo, data de 2012, mas em decisão liminar Ferrari determinou que o terreno seja desocupado e determinou, inclusive, o uso de força policial para a retirada dos moradores. De acordo com o advogado Wellington Souza da Silva, que representa algumas das famílias ainda há esperança de reverter a situação. “Eu apresentei um recurso de apelação no Tribunal de Justiça para a anulação da sentença para que o processo volte na fase de instrução, já que há várias nulidades e eu peço o efeito suspensivo. Uma das nulidades é o fato do local ter crianças e idosos e por isso a Defensoria Pública e o Ministério Público deveriam ter sido ouvidos e não foram; outra nulidade é que o proprietário precisaria comprovar também a sua posse anterior a ocupação, o que não ficou comprovado. Também pedimos a retenção pelas benfeitorias que foram feitas no terreno para que as famílias possam ser indenizadas por isso”, explicou.
Em seu despacho o magistrado determinou um prazo de 15 dias para a desocupação voluntária do terreno, mas esse prazo já foi cumprido na medida em que todos já tomaram ciência da medida. “Estamos correndo contra o tempo”, disse Silva.
O autônomo Mário de Lima Leite, de 47 anos, e há 40 morando no local diz que tem medo de ficar na rua. “Nós não invadimos, a minha mãe chegou aqui há 40 anos, e tinha um contrato de comodato que ela assinou. Eu tinha 7 anos, agora tenho 47 e sempre morei aqui. Esse terreno era dos ingleses, não sei se ele (o autor da ação) é mesmo o proprietário. Eu até tentei uma época conseguir a documentação, mas não consegui, a única coisa que eu tenho é a conta de luz no nome da minha mãe que prova que a gente está aqui há muito tempo. Tem 20 anos que a gente está nessa luta, já ameaçaram tirar a gente daqui antes, a gente nem dorme mais. Se eu tivesse condição já tinha ido embora. O mais estranho é que nesse tempo todo nós nunca fomos ouvidos, mesmo assim o juiz decidiu”, reclama o morador que vive com a esposa Rute, em uma casa no terreno que alvo da reintegração.
Ivete Leite, de 36 anos, conta uma história bem parecida. Ela vive no terreno desde criança. “A gente quer negociar afinal estamos aqui há muito tempo desde que minha mãe veio morar com seis crianças pequenas. A gente precisa de moradia, é o mínimo que um ser humano precisa ter. Em 2012 chegaram a cortar a luz e água daqui para mandar a gente embora e nós resistimos”, conta a moradora.
A prefeitura de Rio Grande da Serra fez o cadastro de parte das famílias e diz que pouco poderá fazer já que elas não se enquadram na lei municipal que disciplina o auxílio aluguel. “A prefeitura atendeu uma comissão de moradores em 27/10. A administração acolheu o pedido dos moradores para intermediar um acordo entre as 25 famílias e o proprietário. Para que tenham uma relação mais direta com a prefeitura, ficou combinado que os moradores a organização de um estudo social com as famílias atingidas. Das 25 famílias, 14 aceitaram ser participar do estudo; duas se negaram e nove não foram encontradas. As assistentes sociais ainda fizeram a avaliação para verificar quem está com dados atualizados no CadÚnico (Cadastro Único que dá acesso a programas sociais do governo federal)”.
Ainda de acordo com a prefeitura se a reintegração de posse ocorrer não há recursos financeiros para socorrer as famílias. “Em caso de se efetivar a reintegração de posse, a prefeitura está estudando como pode auxiliar as famílias, em um primeiro momento, pois a administração possui graves problemas orçamentários. E eles não se enquadram no artigo 1º, inciso 1 da Lei 2.413, de 06/10/2021, que regulamenta o Aluguel Social para famílias em emergência habitacional que tenham seu imóvel em área de risco e interditado pela Defesa Civil”.
A prefeitura informou que o autor da ação judicial, Flávio Figueiredo Filho e a esposa são os donos da empresa Estate Patrimonial S/S Ltda e que a área a ser reintegrada é parte do loteamento Decauville. “No momento não há dívida ativa junto à administração, somente débitos de IPTU em aberto, referentes ao exercício de 2021”.
Sobre o uso de força policial autorizado pela justiça para a reintegração, a Polícia Militar não se posicionou até o fechamento desta reportagem.