
Casos recentes de abandono de animais nas cidades do ABC chamam atenção para uma situação invisível nas estatísticas oficiais. Apesar da gravidade, as prefeituras da região ainda não possuem dados consolidados sobre o tema, enquanto protetores independentes assumem o resgate e os cuidados dos animais, muitas vezes sem apoio ou recursos adequados.
“Abandono virou rotina, e nós, protetores, estamos sozinhos”, diz Patrícia Garcia, protetora independente que atua na região. “Infelizmente, as pessoas passam uma noite na cadeia e acabou, não pagam. A lei deveria fazer o contrário, multar quem abandona e recompensar quem resgata, pois esse custo recai sobre nós”, completa.
Prefeituras
A maioria das prefeituras do ABC não mantém registro sistematizado do número de animais abandonados. São Caetano e Santo André informam que não possuem um censo específico, mas destacam ações como castração gratuita, campanhas de conscientização e canais para denúncias.
Em São Bernardo, a Secretaria de Saúde ressalta que o abandono de animais é crime e deve ser denunciado à Dicma (Delegacia de Investigações de Crimes ao Meio Ambiente). A cidade não dispõe de abrigo público para acolhimento. O recolhimento municipal ocorre apenas em casos que representem risco à saúde pública, como mordeduras.
Mauá é a única cidade que apresenta estimativa dos casos: registrou cerca de 335 atendimentos a animais vulneráveis entre janeiro e maio de 2025, contra 250 no mesmo período de 2024. Oferece serviço móvel de resgate para animais atropelados ou debilitados e incentiva denúncias pela Central 156.
Diadema atua exclusivamente no resgate de animais silvestres, com 139 atendimentos em 2024 e 71 até maio de 2025. Esses números, no entanto, não abrangem abandono de animais domésticos, que permanece sem dados oficiais na cidade.
Em apuração feita pelo RD, em maio último, Ribeirão Pires registrou 55 ocorrências de maus-tratos a animais no ano. Em 2024, foram 586 casos, um crescimento expressivo em relação a 2023, quando 329 registros foram feitos. Já em Rio Grande da Serra, 25 ocorrências foram registradas até o momento neste ano. Em 2024, foram 143 casos e, em 2023, 93 registros. No que diz respeito às autuações, três pessoas foram penalizadas em 2023 e 2024, mas, até agora, nenhuma autuação foi feita em 2025. Ambas prefeituras não responderam até o fechamento da reportagem.
Casos recentes no ABC
No dia 15 de junho, em Santo André, moradores encontraram uma cadela que agonizava num saco plástico amarrado em um ponto de ônibus no bairro Jardim Alzira Franco. O animal apresentava ferimentos e desidratação, e voluntários resgataram o cão e o levaram para atendimento veterinário. O caso está sob investigação.
Em São Bernardo, no dia 22 de maio, uma cadela apareceu amarrada com correntes, sem acesso a água, em um terreno abandonado no bairro Nova Petrópolis. Após denúncias de vizinhos, protetores independentes resgataram o animal, que apresentava desnutrição e sarna. A ocorrência foi registrada na Delegacia de Investigações de Crimes ao Meio Ambiente.
Luta dos protetores independentes
Para Patrícia Garcia, o problema vai além do abandono em si. “Hoje existe falta de responsabilidade das pessoas com seus pets. A ausência de punição real e o descaso do poder público deixam os protetores sozinhos, acumulam dívidas com clínicas veterinárias, sem apoio para castração, vacinas e alimentação”, explica.
Patrícia defende que, além de campanhas de conscientização, o governo endureça as punições contra quem abandona e ofereça suporte financeiro e estrutural a quem atua no resgate. “Estamos no total descaso do governo, enquanto continuamos a fazer o trabalho social que deveria ser deles”, afirma.
Patrícia alerta que, sem medidas concretas, o problema tende a piorar. “Não existe uma única causa para o abandono, mas a falta de leis severas e a impunidade alimentam essa triste realidade. Quem resgata arca com todos os custos, enquanto quem abandona segue impune”, comenta a protetora independente.