
A falta de planejamento adequado de arborização nas áreas urbanas do ABC tem levado à supressão indiscriminada de árvores entre as cidades, o que compromete a qualidade de vida e meio ambiente na região. Ao RD, especialistas alertam que a ausência de estratégias efetivas para preservação e manejo florestal resulta em consequências graves, como aumento da poluição e a redução da biodiversidade.
Em janeiro deste ano, a Prefeitura de Santo André lançou um plano de arborização urbana pra cidade que pretendia ampliar em 50% o número de árvores plantadas em vias públicas no período de 15 anos. A iniciativa municipal foi impulsionada pelas consequências ocasionadas pelas mudanças climáticas, como chuvas e ventos isolados, mas quem vive na cidade comenta ter percebido que pouco foi efetivado desde a apresentação do plano.
Ao contrário, em fevereiro, já no mês seguinte, a avenida Sara Zírlis, na Vila Lutécia, foi alvo do corte radical de árvores. Na oportunidade, um morador que preferiu não ser identificado questionou o ocorrido após não concordar com o corte, por completo, das árvores. “Uma poda não bastava? Precisa cortar a árvore inteira?”, indagou. Ainda na cidade, a rua Belém, situada na região do Parque Antônio Fláquer (o Ipiranguinha), também foi alvo de arboricídio, com corte radical de várias árvores.
Em Ribeirão Pires, três árvores foram suprimidas na rua Cláudio Maurício Maciotta, no Centro da cidade, em menos de 15 dias. Ao RD, moradores comentam que o endereço tem sido alvo de arboricídio há anos. “Quando me mudei para cá, há 23 anos, tínhamos ao menos sete árvores na rua, mas hoje em dia temos apenas duas, resultado da falta de cuidado e planejamento para manter as árvores saudáveis e vivas na rua”, reclama a advogada Bruna Martines.

Na última chuva forte que atingiu a região, na primeira quinzena de outubro, a região registrou, pelo menos, 30 ocorrências de quedas de árvores e outras 62 solicitações para mobilização de autoridades para serviços de poda e manutenção dos indivíduos arbóreos. Ao longo deste ano, a Prefeitura de Santo André encaminhou 135 ofícios à Enel – concessionária de energia elétrica – para poda de árvores na cidade, mas 74 deles continuam pendentes.
Planos de arborização é de urgente necessidade
A bióloga Ana Paula Kordash destaca a urgência do cuidado com as árvores urbanas. “As cidades precisam entender que as árvores são seres vivos que necessitam de cuidados constantes”, afirma. Segundo a especialista, com o crescimento das áreas urbanas, a saúde das árvores tem sido cada vez mais comprometida, resultando em um ciclo de estresse e deterioração. Estima-se que as árvores nas cidades tenham uma vida útil significativamente menor do que aqueles que crescem em áreas de matas, fator que exige atenção imediata.
Em São Bernardo, 926 árvores foram suprimidas em 2023 e outras 1.146 foram retiradas entre janeiro e outubro deste ano. Na contrapartida, a administração informa que foram plantadas 2.103 mudas nativas em 2023 e 2.539 em 2024, com objetivo de substituir espécies exóticas por nativas. Já em Diadema foram 563 árvores suprimidas em 2023 e outras 440 até setembro deste ano. A média de plantio na cidade é de 1 mil árvores por ano.
Apesar do replantio, Ana Paula ressalta a importância da manutenção das árvores já plantadas. “Falta diagnóstico: é essencial saber quando ocorreu o plantio e como está a área de coleto, já que muitas árvores têm cimento que afeta seu desenvolvimento”, alerta. Ampliar áreas de coleto com jardins de chuva pode ajudar na absorção de água e enriquecimento do solo.
“Outra forma de contribuir é levar a agrofloresta para áreas urbanas, promovendo conectividade e biodiversidade”, acrescenta. Algumas espécies, como Canafístula, Jacarandá e Pau-brasil, são indicadas para o ambiente urbano. No entanto, muitas cidades priorizam a estética em detrimento da escolha das espécies adequadas.
Questionadas sobre os planos de arborização, nenhuma prefeitura da região forneceu informações.
Tecnologia e participação cidadã
O uso de tecnologia também pode ser um aliado na preservação das árvores urbanas. Ana Paula exemplifica o uso de softwares como o ARBIO, desenvolvido para auxiliar no controle das árvores com ênfase no diagnóstico e análise de risco, para que as prefeituras registrem e monitorem a saúde das árvores, com avaliação de riscos e para promover intervenções preventivas. “É um software de valor extremamente acessível que, inclusive, poderia ser adquirido através de consórcio, em compra coletiva para beneficiar todas as cidades”, diz.
Deste modo, é possível também realizar a capacitação de cidadãos para participarem do processo e engajarem a comunidade para conservação arbórea. “A ciência cidadã, onde moradores podem colaborar na coleta de dados e no monitoramento das árvores, assim como esse trabalho executado pelo poder público são estratégias que não só fortalecem a consciência ambiental, mas também fornecem dados valiosos para pesquisadores e gestores urbanos”, afirma.