Casal financia imóvel em Ribeirão Pires e é surpreendido por penhora

Sonho da casa própria vira pesadelo para moradores de Ribeirão Pires. (Foto: Freepik)

O sonho da casa própria se tornou um pesadelo para Fernanda e Felipe Uliana. O casal comprou em 2021 uma casa em Ribeirão Pires, que teve checagem de documentação em cartório e análise de imobiliária do banco que concedeu o financiamento habitacional. Mesmo assim eles foram surpreendidos com a visita de um oficial de justiça que comunicou que a casa é parte de um processo trabalhista e seria penhorada para o pagamento de dívidas trabalhistas. Esse problema, no entanto, não foi descoberto na análise documental.

Os antigos donos eram sócios de uma empresa de transporte que faliu. A justiça agora busca bens em nome destas pessoas para indenizar os trabalhadores da empresa. “Não foi informado ao cartório de registro de imóveis de que havia esse processo, não constava nada como não consta ainda. Tirei uma certidão atualizada em dezembro e não aparece nada disso. Não constava nada, estava tudo em ordem, o banco também fez uma varredura. Agora a justiça está dizendo que eu, a imobiliária e o banco agimos de má fé, o que não é verdade”, lamenta a moradora.

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Fernanda diz que tentou contato com o banco para que ele a ajuda se a esclarecer a situação, mas não obteve nenhum retorno. “Eu acho que o banco tem que se interessar até porque a casa é do banco até que nós terminemos de pagar o financiamento. Aí fica esse jogo de empurra. Já procurei a defesa do consumidor e até o Banco Central e não tive ajuda. O juiz está irredutível”, diz, desapontada, a compradora da casa.

A advogada Renata Valera, que representa a família, acrescenta que todas as certidões necessárias foram avaliadas antes do negócio ser firmado. “Essa família foi injustiçada, porque todos os documentos foram analisados, os compradores não foram negligentes, tudo foi verificado e, em nenhuma das certidões, havia algum apontamento de ação envolvendo este imóvel. Nessa transação a família foi muito precavida”, disse a representante da família que, inclusive já entrou com o recurso de ‘embargos de terceiros’ visando modificar o posicionamento do juiz do caso em relação ao imóvel. “Estamos aguardando a decisão final desse recurso que, inclusive, foi apresentado antes do recesso do Judiciário, e ainda não tem decisão”, completa.

O banco Santander foi procurado e não respondeu ao questionamentos feitos por e-mail e nem as ligações telefônicas para o número divulgado como sendo de sua assessoria de imprensa.

Comprador de imóvel deve juntar o máximo de certidões para evitar riscos

Para o professor coordenador do curso de especialização em Direito Imobiliário da Faculdade de Direito de São Bernardo, Gilberto Carlos Maistro Júnior, o comprador, antes de celebrar a compra, deve se cercar de cuidados e se munir de uma série de certidões municipais, estaduais, federais e da justiça comum e trabalhista, para evitar problemas.

Professor Gilberto Carlos Maistro Júnior da Faculdade de Direito de São Bernardo. (Foto: Divulgação FDSBC)

A busca de informações e juntada de documentos começa pela verificação da situação do imóvel, que deve ser feita junto ao cartório de imóveis e também a verificação da situação dos proprietários e isso deve ser feito em várias instâncias, para verificar se essa, ou essas pessoas, devem para alguém. “Os compradores podem conseguir certidões de distribuição que esclarecerão se tem alguma ação em curso envolvendo os vendedores. Isso deve ser verificado na justiça estadual, federal e na do trabalho do local do imóvel e do local de domicílio dos vendedores. O ideal é que se peça as certidões referentes aos últimos dez anos, no mínimo. Se existir uma ação, é possível obter uma ‘certidão de objeto e pé’, que traz um resumo daquele processo informando tudo que aconteceu e como ele está hoje”, orienta Maistro Júnior.

Além da justiça o comprador deve também buscar débitos tributários relacionados à pessoa ou ao imóvel. “Se busca a certidão negativa de débitos municipais na prefeitura, sendo importante, também, a certidão negativa do cartório de protestos referente aos vendedores. Dessa forma, o comprador pode comprovar a sua boa fé e diminuir bastante o risco de perder o imóvel”, diz o especialista em direito imobiliário.
O professor recomenda também, se o vendedor for empresário, buscar certidões da empresa. Se a pessoa morou em outras cidades e estados também se pode juntar certidões. “Com essas informações dá para ter uma noção da dívida e se o vendedor tem outros bens suficientes para a quitação dessa. Se o comprador sabe da dívida e mesmo assim assume o risco, a compra pode ser considerada fraudulenta”, alerta.

Mudanças recentes na legislação garantem ainda mais tranquilidade para o comprador o que não impede que ele se cerque de cuidados. “As leis 13.097/15 e 14.382/22 já dizem que a matrícula do imóvel deve apontar se há ação ou execução contra os vendedores, ou constrição, como penhora, arresto ou sequestro de bens sobre aquele imóvel. Se não há nada disso inscrito na matrícula o comprador não pode ser considerado de má fé, independentemente da cautela quanto às certidões. Isso está na lei”, explica o professor da FDSBC.

Mesmo estando previsto na lei, muitas vezes o comprador não se livra da dor de cabeça e dos gastos de ter que propor uma ação judicial para afastar a penhora e demonstrar que a compra do imóvel não foi fraudulenta. “Ele vai ter que mover uma ação de embargos de terceiros. É uma ação cara que, além das custas, vai exigir o pagamento de honorários de advogado e tudo está vinculado ao valor daquele imóvel e da dívida. Então, mesmo com essa situação legal de que se a matricula não trouxer as informações sobre ações, execuções ou constrições judiciais não haverá presunção de má-fé do comprador, é recomendável que ele tenha as certidões. Assim, saberá dos riscos e decidirá se vale a pena assumi-los e comprar o imóvel. Mesmo tendo como se defender pela inexistência de informações sobre ações, execuções e constrições sobre o imóvel, como penhora, por exemplo, o comprador terá que arcar com um processo caro e ficará um bom tempo atrelado a isso, em razão da demora na solução judicial, passando a ter dificuldades para negociar o imóvel, dentre outros problemas”, completa Gilberto Carlos Maistro Júnior.

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