Estudante de enfermagem é proibida de entrar com filho na Anhanguera

Ingrid foi impedida de entrar com seu filho Henry, de quatro anos, na Anhanguera (Foto: arquivo pessoal)

Ingrid Braga Das Graças, estudante do 4º semestre de Enfermagem na faculdade Anhanguera (São Bernardo), foi impedida de assistir aula na acompanhada de seu filho Henry, de quatro anos. A jovem conta que a criança não teve aula na creche, e como também não tinha com quem deixar a criança, tentou levar o pequeno para a instituição.

“Tinha uma aula importante nesse dia e não queria faltar, pois é a matéria mais difícil do semestre. Acontece que fui impedida até mesmo de entrar na portaria com meu filho, mesmo explicando a situação e afirmando que eu não poderia perder a aula”, conta Ingrid. Ela lembra que a resposta na instituição foi de que “não poderiam liberar a entrada porque cumpriam ordens”, o que a fez se sentir humilhada, rejeitada, desvalorizada como mulher e, principalmente, como mãe. “Pedi para chamarem algum responsável, a coordenação ou diretor, e fui informada que não havia ninguém para me atender”, salienta.

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Ainda na tentativa de assistir as aulas, mandou mensagem para dois professores. “Minha aula começava 8h e fiquei até 9h15 tentando entrar na faculdade, apenas para conseguir aprender, estudar e dar um futuro para meu filho”, afirma. “Meu filho me ver nessa situação foi deprimente, e ele passou dois dias falando ‘mamãe ficou chorando na escola dela’, até ele presenciou essa rejeição”, afirma.

No outro dia, a coordenadora do curso de Ingrid entrou em contato para reafirmar que não seria possível uma criança adentrar na Universidade. “Ela comentou até que existia um regulamento pelo qual nunca tinha ouvindo falar, também me disse que tinha na portaria, nunca nem vi nesses quase dois anos de Universidade”, relata. A mãe diz ter solicitado o regulamento para que pudesse ler e se informar, e a resposta foi de que o material seria encaminhado para todos os alunos via ‘grupos’.

Na visão de Ingrid, as mães universitárias não merecem ser impedidas a assistir aulas com seus filhos, principalmente em casos de urgência, uma vez que pode ser considerado crime deixar um menor de idade desacompanhado enquanto a mãe assiste as aulas. “Infelizmente por conta disso muitas mães desistem de continuar nos cursos e universidades”, comenta.

Em nota, a Faculdade Anhanguera diz entender a importância do papel das mães na sociedade, principalmente aquelas que buscam se qualificar por meio da educação. No entanto, esclarece que a não permissão de acesso da aluna com seu filho na sala de aula não se trata de uma negativa deliberada, mas que se faz necessária para segurança e necessidades da criança, conforme regulamento do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), sob Lei nº 8.069/1990, que determina a proteção integral por todos os meios.

A instituição reforça também que o ambiente acadêmico, especialmente o de sala de aula, exige a concentração, foco e esforços por parte de professores e estudantes, o que pode ser prejudicado com a presença de uma criança em pleno desenvolvimento, que demandam de atenção continua, assim como pode haver ainda a tratativa de temas sensíveis e não recomendáveis que sejam expostos na presença de menores de idade.

“De forma excepcional, a Anhanguera oferece liberação de menores de idade, levando em consideração as circunstâncias específicas de cada caso. A marca ressalta que está em contato com a aluna para esclarecer possíveis dúvidas e para dar todo suporte necessário.”

O que dizem os juristas 

Na visão da advogada de Ribeirão Pires, Bruna Martines, é comum que a justiça condene instituições (sejam empresas ou universidades) que submetem mães a situações vexatórias relacionadas ao direito de estarem com seus filhos, cuidar dos pequenos e, inclusive, amamentá-los quando necessário. “Existe inclusive um projeto de lei que visa trazer luz a essa questão, classificando o aleitamento materno em locais públicos e de uso público como um direito da mulher e cuja proibição enseja penalizações”, explica.

Ainda de acordo com a advogada, este é um desafio que deve ser encarado com seriedade por todas as instituições de ensino superior, sejam elas públicas ou privadas, que devem garantir condições de permanência para estas mulheres. “Seja através de serviços de cuidado e creches gratuitas oferecidas, seja através do planejamento acadêmico personalizado para a universitária mãe, levando em consideração que ela terá mais dificuldades de frequentar as aulas por conta dos cuidados com a criança”, diz.

Apesar de muitas universidades oferecerem Ead (educação a distância) no período de gestação, Bruna avalia que apenas essa garantia não é suficiente para suprir todas as necessidades da aluna mãe. É preciso que pensem além. Já especificamente sobre o caso de Ingrid, a advogada afirma que permitir que a criança fique em sala de aula com sua mãe cumpre os princípios estabelecidos no ECA, que promove os direitos da criança e suas famílias. “Garante que a mulher tenha acesso à educação e que a maternidade não seja um impeditivo para que ela se desenvolva. Por outro lado, também garante que a criança seja cuidada e cresça ao lado de sua mãe”, comenta.

Questionadas sobre o assunto, as demais faculdades do ABC, como Metodista, USCS, Uninove, Direito de São Bernardo e Federal do ABC não informaram se existe algum impeditivo para a presença de crianças em salas de aula.

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