Não há qualquer nível de segurança ao se tentar atravessar áreas alagadas com a água chegando na altura do centro da roda do veículo. Este nível de água já é suficiente para que o carro sofra uma pane e pode já ser arrastado pela força da correnteza. O automóvel pode ser um local seguro para se ficar dependendo do nível da água, mas esse volume pode variar bruscamente em poucos minutos. Há quatro meses, bem no início desta temporada de chuvas, um homem de 56 anos morreu afogado dentro de um carro que foi arrastado pela enxurrada e foi parar dentro do rio Tamanduateí.
O ocupante do veículo que se vê parado no meio da enchente, primeiramente deve evitar o contato com a água que vem de rios e córregos que é altamente contaminada podendo causar diversas doenças, a mais comum delas a leptospirose. Segundo o enfermeiro responsável pelo Núcleo de Educação em Urgência do SOS Cidadão/Samu de São Caetano, Renan Tomas, as pessoas que estão dentro do carro devem superar o pânico inicial e analisar a situação. “Primeiramente não deixe o veículo, isso porque se arriscar na água contaminada e sem ver onde pisa pode ser pior, sem falar que uma pessoa é mais facilmente arrastada do que um veículo. Se a água chega ao meio da porta a situação fica mais crítica e os ocupantes devem sair pela janela e subir no teto do veículo para aguardar o resgate”, recomenda.
Mas se a correnteza for forte e o carro passar a ser arrastado, os ocupantes devem ficar no carro até que este encoste em algum muro ou ponto mais alto que possa ser acessado. “Muita gente fica mais preocupada com o patrimônio, mas nessa hora não se deve pensar no carro, apenas na vida. Se não tiver outro jeito, em último caso, tem que entrar na água. As doenças que podem ser adquiridas no contato com a água de esgoto são tratáveis. Então é tudo uma questão de não entrar em desespero e avaliar a situação. O pânico é o grande inimigo e a ansiedade dificulta o raciocínio lógico e a reação”, diz o enfermeiro do Samu.
No caso da vítima cair na água e se afogar, o tempo é crucial para o salvamento. Dez minutos sem oxigênio podem fazer com que a reanimação não tenha mais êxito e a vítima venha a óbito. “Depois do décimo minuto começam a ser considerados os danos cerebrais, isso se a vítima voltar porque as chances da circulação ser retomada normalmente vão diminuindo. Por isso se a vítima está parada há mais de 15 minutos já é considerado o óbito”, diz Tomas.
O professor de engenharia automobilística da FEI (Fundação Educacional Inaciana) de São Bernardo, Cleber Willian Gomes, considera também que o veículo pode ser um local seguro até certo ponto. “O melhor mesmo é não estar dentro do carro numa situação como essa, mas se acontecer, observar o nível da água é a principal coisa. Qualquer coisa acima do centro da roda já é um perigo. Neste estágio o escapamento do carro já está praticamente submerso, o carro para de funcionar e começa um colapso em todos os sistemas do veículo, que hoje tem centenas de módulos de controle eletrônicos. O volume água pode aumentar de forma abrupta e sair do veículo fica difícil porque a pressão da água do lado de fora impede a abertura das portas. Com a água no meio da porta os ocupantes já devem abandonar o interior do automóvel”, explica.
Gomes também considera que ficar sobre o teto do carro, se não houver correnteza muito forte é o melhor lugar para aguardar o resgate. “A previsibilidade do quanto a situação pode ou não ficar pior é pequena, então a atitude deve ser pelo cuidado com a vida. Não há nenhuma garantia de segurança quando a água está acima do meio da roda”, diz o professor que trabalha na disciplina de freios da FEI. Ele diz que a tecnologia pode tornar mais acessível a previsão do tempo e com isso evitar que as pessoas estejam em áreas de risco para enchentes. “Seria possível hoje com os aplicativos de rota, através do GPS, cruzar as informações de previsão do tempo e alertar o motorista que o caminho pode estar alagado e traçar uma rota alternativa ou um local de fuga mais alto, isso aumenta a previsibilidade do motorista”, completa.