O tempo nos semáforos para pedestres tem causado queixas, em especial de idosos e pessoas com mobilidade reduzida no ABC. Cada cidade tem uma temporização para travessia, nem sempre ideal para completar o percurso. Além do tempo curto, faltam semáforos de pedestre em muitas vias. Talvez isso ajude a explicar porque o aumento das mortes de pedestres por atropelamento. Em 2022, ficaram em segundo lugar, após os motociclistas.
Segundo o sistema Infosiga SP, do governo do Estado e divulgado dia 19 de janeiro último, 35% das mortes por atropelamento, ano passado no ABC, eram de pedestres. Categoria que cresceu na pandemia, por conta do delivery, os motociclistas lideraram com 36,8% dos óbitos, índice perto dos pedestres. Em 2022, foram 217 mortes registradas no trânsito, 7,4% a mais que o ano anterior.
Avenida Goiás
Em São Caetano, um dos pontos que tem gerado dificuldade é o do semáforo da avenida Goiás, na altura da Câmara. Após os carros pararem, o pedestre apenas tem 26 segundos para transpor a via. A equipe do Repórter Diário esteve no local e fez o trajeto e conseguiu atravessar um dos lados da avenida em três segundos, considerando a elevação da pista sentido bairro/centro a travessia completa, de um lado ao outro, 10 segundos, a simulação considerou um adulto sem qualquer problema de locomoção.
Em algumas observações, idosos conseguiram transpor a avenida até o canteiro central, em cerca de 20 segundos, desta forma tiveram de aguardar o próximo ciclo para conclusão do trajeto.
O cadeirante, Itamar Souza, conta que o tempo é “razoável”, mas seria melhor se tivesse uma “folga”, isso porque precisa de ajuda da esposa para transpor a avenida. Outros cadeirantes, sem ajuda, encontram dificuldades para concluir metade do trajeto.
A Semob (Secretaria de Mobilidade Urbana) de São Caetano explica que o tempo programado é mais do que suficiente, mas faz ressalva “Uma pessoa com deficiência ou idoso não vai conseguir atravessar a avenida por completo e a fará em duas etapas por conta da mobilidade reduzida deles”.
Outro ponto que deve ser levado em consideração é a questão dos horários do dia e da noite. Para dar mais fluidez aos veículos ou pedestres, a temporização é modificada pelo Departamento de Trânsito para mais ou para menos.
O mesmo problema é encontrado, por exemplo, nas travessias de pedestres na avenida Dom Pedro II, em Santo André. O tempo programado nos semáforos é insuficiente para uma transposição completa. No geral, até pedestres com passos mais largos e rápidos não conseguem atravessar de uma calçada a outra, precisam parar no canteiro central estreito e sem qualquer proteção ao pedestre.
Medo de ser atropelada
Ana Rodrigues, 28 anos, conta que muitas vezes precisa correr para conseguir atravessar os dois lados. “Tenho medo de ficar no meio do caminho, os veículos passam muito perto. Quando tem mais gente no mesmo lugar, a sensação é de que vamos ser atropelados”, discorre a administradora de empresas ao cruzar a Dom Pedro II na altura do Parque Prefeito Celso Daniel, no bairro Campestre. “Sou jovem e consigo até correr, agora, imagine a situação dos idosos ou cadeirantes”, questiona.
Humberto de Paiva Jr, engenheiro civil e professor na área de Transporte e Mobilidade Urbana da UFABC (Universidade Federal do ABC), explica que não há um tempo ideal para a travessia. No entanto, destaca que há uma faixa de velocidade de deslocamento dos pedestres. “Esse tempo varia de acordo com as características dos pedestres. Jovens se deslocam com velocidade média de 1,2 metros por segundo e idosos a 0,76 m/s”, afirma.
Para ter um tempo ideal de travessia, segundo o especialista, deve se pegar a velocidade e dividir pela largura da via, no entanto, pode-se adicionar um pouco mais de tempo como margem de segurança. O professor destaca que vários fatores devem ser levados em consideração, como a do perfil médio dos pedestres em determinada localidade. Além disso, tempo excessivo de travessia pode gerar congestionamentos.
Mas não é só o tempo de travessia que pode causar acidentes aos pedestres. A imprudência de quem conduz um veículo automotor é um dos agravantes, assim como a má sinalização ou ausência dela pode causar eventos adversos.
Ponto cego
Ainda em Santo André, quem precisa atravessar da rua Guilherme Marconi, na vila Assunção, corre sérios riscos de atropelamento, isso porque, na esquina há uma faixa de pedestre sem semáforo. O motorista que vira da rua Joaquim Távora à esquerda entra num ponto totalmente cego e pode atingir, em cheio, pedestres que tentam atravessar na faixa.
Eva Shilink, 77 anos, aposentada e moradora da vila Assunção, afirma que muitas vezes demora para atravessar a rua para ir à farmácia. “Assim que o semáforo da Guilherme Marconi fecha, imediatamente abre para o da Joaquim Távora, com isso os carros viram muito rápido aqui, é bem difícil atravessar, você tem de ser muito ligeiro pra não ser atropelado”, diz.
O professor da UFABC, Humberto de Paiva Jr, explica que a decisão de instalar um semáforo não é simples, e nem sempre é a melhor solução. “Deve-se avaliar o volume de tráfego de veículos e pedestres, a velocidade dos veículos, as estatísticas de acidentes e o impacto no tráfego. A solução pode não ser um semáforo, mas algo que evite o conflito com o fluxo de veículos e pedestres”, afirma.
Cadê o semáforo?
Outro problema identificado, que também pode levar a acidente diz respeito ao posicionamento semafórico para veículos. Em alguns pontos de Santo André, o motorista, ao parar no vermelho na área demarcada no solo, entre em um ponto cego e, para enxergar a luz indicativa de pare, atenção e siga, precisa abaixar a cabeça dentro do veículo e procurar o semáforo, o que tira a atenção do condutor.
Humberto de Paiva Jr explica que a recomendação é sempre posicioná-los antes ou depois das vias transversais. É importante destacar que os semáforos nas laterais das vias devem seguir o mesmo alinhamento do conjunto central. Se posicionados na lateral, podem ficar em ponto cego, se um veículo de grande porte parar ao lado.
Na rua Catequese com a avenida Dom Pedro II, há pontos cegos e semáforo apenas do lado esquerdo da via, para quem vai virar à direita não há, ou seja, o central está oculto. Com isso, o motorista tem de aguardar alguém avançar ou procurar no entorno a sinalização para seguir o trajeto.
Outro ponto cego foi identificado no cruzamento da rua Antonina com a alameda Vieira de Carvalho. A base para observação leva em consideração a visão do motorista, com 1,80 metro, em um carro popular hatch.
A Prefeitura de Santo André foi procurada, mas até o fechamento desta reportagem não se manifestou.
Estudos da USP (Universidade de São Paulo) indicam que sensores podem ser instalados em vias públicas que identificam os pedestres e autoriza a abertura dos semáforos para veículos apenas quando a travessia estiver concluída.
A reportagem citou apenas alguns pontos na região, mas você internauta, leitor do Repórter Diário, pode enviar suas demandas para o WhatsApp 11.9.4984-9581 ou para o e-mail redacao@reporterdiario.com.br.