A política industrial do governo para o setor automotivo, o Inovar Auto, acaba no próximo dia 31 sem a definição de um sucessor. O anúncio do Rota 2030, elaborado pelo governo para cumprir esse papel, não ficou pronto a tempo, segundo fonte envolvida nas negociações. O presidente Michel Temer adiou para fevereiro a decisão sobre as divergências entre os ministérios da Fazenda e da Indústria que travaram o fechamento de um novo programa.
Nesta quinta-feira, 21, havia movimentação nos bastidores para que Temer decidisse a questão ainda este ano. O presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Antonio Megale, veio a Brasília para a reunião de cúpula do Mercosul e na expectativa de uma reunião no Palácio do Planalto para discutir o programa. O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, comentou que caberia a Temer decidir entre a questão fiscal e o interesse da indústria.
Segundo fonte da área econômica, o adiamento da entrada em vigor do Rota 2030 não representará problema em termos de tributação. A partir do dia 1 de janeiro de 2018, volta a vigorar a tabela do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) que existia antes do Inovar Auto, com alíquotas de 7%, 11%, 13%, 18% e 25%, dependendo do tipo de motor.
O Inovar Auto impôs um adicional de 30 pontos porcentuais sobre essas alíquotas. Mas as montadoras que usassem componentes locais poderiam reduzir essa tributação extra até zerá-la. Esse mecanismo, porém, foi condenado pela Organização Mundial do Comércio (OMC) por discriminar os importados.
Na proposta do Ministério da Fazenda, o Rota 2030 também prevê um adicional sobre a tabela do IPI, porém bem menor: 2 pontos. Porém, a montadora pode zerar esse extra se concordar em cumprir metas nas áreas de segurança veicular, eficiência energética e etiquetagem dos veículos. A partir de 2021, se a meta não for cumprida, o adicional passará a ser cobrado.
A proposta do MDIC é um pouco diferente. Ela também tem as três metas que constam da proposta da Fazenda, acrescida de mais uma: gastos mínimos de 1,2% da receita operacional líquida com pesquisa e desenvolvimento. E prevê que poderá haver uma redução de um a dois pontos porcentuais do IPI, conforme o cumprimento das metas. Mas esse corte só aconteceria a partir de 2021.
O que as duas propostas têm em comum é que, para 2018, não haverá efeito sobre a arrecadação do IPI, havendo ou não havendo o Rota 2030. E que, no ano que vem, as alíquotas voltariam aos níveis anteriores ao Inovar Auto.
Do ponto de vista das montadoras, o principal prejuízo do adiamento é a ausência de uma política de estímulo à área de pesquisa e desenvolvimento. A proposta do MDIC prevê que, se os gastos forem superiores ao mínimo estabelecido como meta, a montadora poderá reverter o adicional num crédito tributário que poderia ser usado para pagar qualquer tributo federal.
Se os gastos forem inferiores, a montadora teria de depositar a diferença num fundo ainda a ser criado, que seria gerido pelo MDIC e não passaria pelas contas do Tesouro Nacional. O dinheiro seria aplicado em tecnologia. Alternativamente, a diferença poderia ser usada em investimentos diretos em empresas que atuem na área de mobilidade ou tecnologia.
A Fazenda tem várias ressalvas a esse modelo, e esse foi outro ponto submetido a arbitragem do presidente Temer. Para a área econômica, o incentivo para o desenvolvimento tecnológico poderia ser o fortalecimento de um mecanismo que já existe, a “Lei do Bem”. As montadoras e o MDIC não gostam dessa proposta porque a indústria tem tido prejuízo. Nessa condição, não é possível usar os benefícios da legislação.
Rota 2030 é decisão política, diz ministro
O destino do Rota 2030, a nova política industrial para o setor automobilístico, será decidido pelo presidente Michel Temer, disse nesta quinta-feira, 21, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles. “Isso é uma decisão de ordem política”, afirmou. “Uma questão da indústria versus a questão fiscal.” Segundo fontes próximas à negociação, o martelo poderá ser batido no início da próxima semana.
A atual política de incentivo às montadoras, chamada Inovar-Auto, acaba no dia 31. O Rota 2030 foi elaborado para substituí-la, mas ainda não foi anunciado por uma razão simples: não há dinheiro. Não só o governo enfrenta uma situação de forte restrição fiscal, como também não há previsão, na proposta de Orçamento de 2018, de nenhum incentivo tributário para as montadoras. Assim, o que está nas mãos de Temer é decidir se haverá algum incentivo.
A Fazenda é contra
O Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (Mdic) quer dar descontos em impostos para estimular investimentos em pesquisa e desenvolvimento. Mas, para isso, será preciso tirar dinheiro de outras áreas. Mdic e montadoras falam em incentivos de R$ 1,5 bilhão.
“Não tem país com indústria automobilística que não tenha uma política automotiva”, disse o presidente da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), Antonio Megale. “É uma decisão de País, se quer ou não ter indústria.” A indefinição, disse, é um problema principalmente para as montadoras “premium”, que investiram muito no País na esteira do Inovar-Auto e agora “estão a descoberto”.
Os embates entre Fazenda e Mdic chegaram a um impasse e o formato do Rota 2030 ficou a cargo da Casa Civil, que exerce um papel de coordenação entre as diversas pastas do governo. A decisão final, porém, depende do presidente.
Divergência
Segundo fontes da área técnica, um dos principais pontos de divergência está na questão do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI). Em ambas as propostas, as alíquotas voltam aos níveis que estavam antes do Inovar Auto, como 7% para os populares e 25% para os com motor acima de 2.000 cilindradas.
Mas, na proposta do Mdic, caso a montadora cumpra um conjunto de metas envolvendo, por exemplo, gastos mínimos em pesquisa e desenvolvimento, ela pode ter um desconto de 1 a 2 pontos porcentuais no imposto, a partir de 2021.
Já a proposta do Ministério da Fazenda prevê que, a partir de janeiro, a tabela do IPI volte para os níveis pré-Inovar Auto, com um acréscimo de dois pontos porcentuais. Mas, se as empresas cumprirem determinadas metas, esse acréscimo não seria cobrado.