
Entidades que atuam nas comunidades mais carentes confirmam que a falta de recursos para a compra de absorventes íntimos tem feito muitas jovens faltarem e até abandonem a escola. Na região, o poder público municipal tem algumas iniciativas no assunto. Em outubro, foi aprovado projeto de lei, do vereador de Santo André, Eduardo Leite (PT), que prevê fornecimento do item de higiene íntima para as jovens das escolas municipais. Mas falta sanção do Executivo.
Em São Bernardo, que já possui serviço na área, a Cufa (Central Única das Favelas) inicia na terça-feira (22/11) campanha para angariar doações de absorventes que serão destinados a mais famílias carentes.
Ninguém sabe mais da dificuldade destas famílias do que quem atua diretamente com elas, realiza ações sociais para atender as necessidades mais urgentes. Vanessa Aparecida Santos, da unidade da Cufa de São Bernardo, que atende o núcleo Capelinha e outros na região do Riacho Grande, confirma que a falta de condições para comprar o item de higiene íntima faz meninas faltarem na escola mesmo. “Algumas me ligam e perguntam se eu tenho, eu acabo dando do meu mesmo, porque as doações estão muito difíceis”, relata.
A Cufa realiza reuniões a cada dois ou três meses com mulheres das comunidades e esse é um dos principais temas dos encontros. Vanessa estima que, somente nas comunidades que atende, são pelo menos 200 meninas e mulheres que vivem a pobreza menstrual e precisam do auxílio. Explica que a central já fez diversas ações de doação de absorventes que integram kits de higiene, montados na própria sede da Cufa. “A gente monta um kit com o absorvente, um creme dental, preservativo, álcool em gel e máscara. Tudo é feito com doações. Elas percebem o carinho que a gente tem em montar esses kits e se sentem especiais”, comenta a voluntária. Vanessa afirma que a campanha começa dia 22 e espera que tenha bom resultado, dada a necessidade das famílias carentes.
O líder da Cufa, em São Bernardo, Marcos Miranda, diz que a campanha de doação de absorventes vai até o dia 18 de dezembro, quando começará a distribuição para 15 comunidades da cidade. As doações podem ser feitas na sede da entidade, que fica na Estrada do Poney Club, 90, no Jardim das Orquídeas, atrás do ginásio poliesportivo do bairro. “Nossa expectativa é conseguirmos 5 mil pacotes. Vamos entregar três para cada jovem, nosso foco são as meninas de 12 a 19 anos neste momento”, explica.
Leis
Para o vereador de Santo André, autor da proposta que se tornou lei, a medida traz um custo muito pequeno para o município e um ganho enorme para a população mais carente. Segundo o parlamentar, a proposta nasceu após um debate organizado no gabinete e que teve a presença da deputada federal Tabata Amaral (PSB) e da primeira dama Ana Carolina Serra, eleita deputada estadual pelo Cidadania. “A Ana Carolina disse que iria nos ajudar a concretizar essa nossa ideia junto ao Executivo. O nosso projeto surgiu no sentido de conscientizar a Prefeitura sobre a urgência desse auxílio. O absorvente íntimo pode parecer uma coisa simples para muitas famílias, mas outras precisam escolher se vão se alimentar ou comprar o item de higiene”, disse Eduardo Leite.

Eduardo Leite diz, ainda, que o custo não será impeditivo. “Como a Prefeitura atende até o ensino fundamental I, não são muitas as jovens que já tiveram a primeira menstruação, porém é um ato é muito importante. É até uma questão de saúde pública, já que o acesso ao item pode prevenir infecções urinárias”, analisa. O projeto de lei foi aprovado em outubro, mas recebeu um veto do Executivo, ao alegar inconstitucionalidade. O veto, no entanto, foi rejeitado por unanimidade na Câmara e a propositura se tornou lei, promulgada no dia 4/11.
Paulo Serra precisa atender
O vereador diz que aguarda o início de ações por parte da Prefeitura. “Vamos continuar insistindo no tema, vamos buscar emendas parlamentares se for necessário para viabilizar o projeto. Já conversei sobre isso com a Tabata e com os deputados estaduais Caio França (PSB) e Luiz Fernando Teixeira (PT). Tenho muita esperança de que o prefeito (Paulo Serra – PSDB) vai atender a demanda, porque esse é um tema sensível e que requer pouca verba orçamentária”, diz.
Em Diadema, outra medida que surgiu no Legislativo veio para atacar a pobreza menstrual. São duas leis de autoria do vereador José Antonio da Silva (PT), uma prevê a criação do banco de absorventes higiênicos e outra cria a campanha permanente de conscientização sobre a menstruação. De acordo com a Prefeitura, são entregues mensalmente 2,5 mil pacotes com oito unidades cada.
CadÚnico
A estimativa é que 60 mil mulheres sejam beneficiadas com a medida, número que corresponde aos cadastrados no CadÚnico e que, portanto, vivem em situação de vulnerabilidade. “Além da legislação, o Fundo Social de Solidariedade também criou a campanha Ciclo do Bem, que busca doações de absorventes para distribuição para esta população. As 20 unidades básicas de saúde são pontos de recolhimento para absorventes e demais itens de higiene íntima. O Consultório na Rua também disponibiliza para as mulheres em situação de rua kits de higiene íntima arrecadados pelo Programa Ciclo do Bem.
São Bernardo tem o programa Dignidade Menstrual, que oferta absorventes, todos os meses, às alunas matriculadas no 4º e 5º ano do ensino fundamental e Educação de Jovens e Adultos (EJA). A entrega também será antecipada em dezembro para a utilização em janeiro de 2023. A administração não informou quantos pacotes são distribuídos a cada mês.
Discussão
Em São Caetano, o debate sobre a pobreza menstrual ainda está aberto. Na sessão extraordinária de sexta-feira (18/11), a Câmara retomou o debate a partir da apreciação do parecer inconstitucional do projeto de lei que institui o Programa Higiene Feminina no município, de autoria da suplente Professora Magali (Cidadania), empossada em 2021.
A vereadora Bruna Biondi (Psol) discursou sobre o tema. Ressaltou que o debate da pobreza menstrual é importantíssimo, que trata da dignidade das mulheres em situação de vulnerabilidade. Passa também por um debate de permanência estudantil para que as estudantes tenham condição de estar na escola
O vereador Pio Mielo (PSDB) destacou que há outros projetos de lei na Casa que versavam sobre o mesmo tema, sugeriram que fosse feito um projeto único pela Câmara. Já o líder do governo, Gilberto Costa (Avante), propôs que fosse feita indicação, assinada por todos os vereadores, como uma forma de dar um encaminhamento mais célere à proposta. “Eu acho que nessa linha a gente vai achar solução, agilizar o tema e atender o que todos nós pensamos conjuntamente, que é essa proteção social para as mulheres”, disse o parlamentar. O projeto saiu da pauta após o plenário aprovar o pedido de vistas por duas sessões, feito pelo vereador Jander Lira (PSD), para que seja trabalhada a melhor solução para a proposta.