ABC - segunda-feira , 29 de abril de 2024

Exposição ‘Contaminações’ mostra influências que rodeiam livros de 3 escritores

Ao assistir ao clássico 8 e 1/2, de Fellini, Ignácio de Loyola Brandão vislumbrou a liberdade necessária para terminar seu não menos clássico romance Zero. Idêntica epifania marcou Luiz Ruffato – ao visitar a obra de Roberto Evangelista na Bienal de São Paulo de 1996, o escritor fez uma leitura particular e decisiva para disparar a concepção de Eles Eram Muitos Cavalos. Finalmente, ao acordar certo dia com uma música de João Gilberto tocando no rádio, Sérgio SantAnna percebeu ali a primeira figura icônica que influenciaria o livro de contos O Concerto de João Gilberto no Rio de Janeiro.

É desse jogo de influências entre artes distintas que nasceu a ideia do projeto Contaminações, que será aberto nesta terça-feira, 28, no Sesc Ipiranga, ocupando um bom espaço da unidade. “E, mais do que simplesmente mostrar como essas obras foram tocadas por outras obras, decidimos mostrar a visão de outros artistas a partir desses livros”, conta Daniela Thomas que, ao lado de Felipe Tassara, assina o projeto expográfico da exposição. Eles foram responsáveis pelo bem-sucedido pavilhão brasileiro na Feira do Livro de Frankfurt de 2013, quando o País foi homenageado. E parte daquela experiência se repete agora.

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Como na entrada do Sesc Ipiranga, onde o visitante (re)descobre a obra de Loyola Brandão, colunista do Caderno 2 – todas as paredes do hall de entrada foram revestidas com páginas de Zero, que vieram de mais de 100 exemplares. Também totens com fotografias de pessoas que representariam os personagens do romance estão espalhados pelo salão, inclusive com o próprio Loyola “interpretando” um deles. No topo de cada totem, descobrem-se folhas do romance, que podem ser arrancadas e colecionadas. “Esperamos que as pessoas explorem o livro, afim de descobri-lo a partir de seu caráter fragmentário”, observa Fernando de Lima, curador da exposição.

Ainda na entrada, o visitante terá contato com o primeiro trabalho dos artistas convidados para participar do Contaminações. Em Cubo Curioso Abrigo Ternurinha, Franklin Cassaro convida as pessoas a olhar para um buraco em uma estrutura plástica. Lá dentro, a representação de um aparelho de tortura, o que provoca um diálogo com o violento cenário do livro, escrito durante a ditadura militar. “Tinha pensado em um pau de arara, mas achei que seria violento demais”, comenta o artista, que convidou a performer Mábia Zambi para uma apresentação na noite desta terça-feira.

Caminhando para a sala de leitura do Sesc, o visitante encontrará a Bolha de Leitura, estrutura formada com boias, onde se vê uma cadeira dentro. Lá, acontecerão leituras das três obras destacadas, que as pessoas poderão acompanhar com fones de ouvido. A primeira a fazer uma leitura será a atriz Letícia Sabatella. Ao lado, a instalação de Heleno Bernardi, Enquanto Falo, as Horas Passam, composta por colchões em formatos humanos. Quem tomar o rumo das piscinas, encontrará mais novidades. “Pedi ao Cristiano Mascaro para utilizar fotos que ele fez em 2005 com pessoas que moram nas ruas”, conta Daniela, apontando para enormes e belíssimas fotos em preto e branco.

Na piscina, a parede lateral foi recoberta com um imenso pano, onde foram bordados trechos dos livros homenageados. “Não há identificação de onde vem cada trecho, assim queremos estimular a curiosidade das pessoas”, acrescenta Fernando.

Ao final do caminho, acontece o encontro com uma belíssima criação de Roberto Evangelista, inspirado agora no livro de Ruffato: caixas de sapato vazias de um lado, uma enorme quantidade de calçados do outro e um caminho limpo entre ambos. “É a transitoriedade da vida”, explica o artista, cuja obra causa impressão e prepara o visitante para o momento mais solar da exposição: o dedicada ao livro de Sergio SantAnna.

Em uma sala, o visitante encontrará antigos monitores de TV em que, ao se aproximar, será possível ouvir depoimentos de figuras importantes como Tom Jobim, Antunes Filho e o próprio SantAnna. Na sala ao lado, um trabalho que deverá encantar especialmente as crianças: a videoinstalação Call Waiting, de Eder Santos, com gaiolas de verdade e projeções de pássaros.

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