ABC - segunda-feira , 29 de abril de 2024

SP: investigados incluem presidente da União dos Vereadores em fraude na merenda

O presidente da União dos Vereadores do Estado de São Paulo (Uvesp) Sebastião Misiara, foi apontado por investigados na Operação Alba Branca, que desmontou um esquema de fraude na merenda de escolas de 22 prefeituras e do governo do Estado, como intermediador de negócios Cooperativa Orgânica Agrícola Familiar (Coaf).

Atuando como uma empresa, a cooperativa fornecia produtos agrícolas superfaturados, com documentos fraudados e pagando propinas que chegavam a 25% dos contratos, segundo relatos de investigados da Alba Branca.

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“(O Coaf) firmou contrato fraudado com a prefeitura de Americana (SP), porque a Coaf lhe vendeu arroz. Esse contrato foi feito por Cássio e Emerson Girardi, agenciado pelo dr. Misiara, tio de Emerson e presidente da entidade União dos Vereadores”, afirmou o funcionário do departamento financeiro da Coaf Adriano Gibertoni Mauro, em depoimento terça-feira, dia 19, quando foi deflagrada a operação.

“Dr Misiara também agenciou contrato com a Secretaria Estadual de Educação de São Paulo e prefeituras de Barueri; Santos e Americana”, afirmou Mauro. Misiara é apontado também por outros funcionários da Coaf. Ele integraria o grupo de operadores que colocavam a “empresa” em contato com os agentes do poder público e políticos.

A Operação Alba Branca foi desencadeada na terça-feira, dia 19, pela Polícia Civil e pelo Ministério Público de Bebedouro, região de Ribeirão Preto (SP). Sete investigados ligados à cooperativa tiveram prisão decretada pela Justiça – seis foram detidos e um está foragido.

Três investigados ligaram ainda o presidente da Assembleia Legislativa de São Paulo, deputado Fernando Capez (PSDB), e o ex-chefe de gabinete da Casa Civil do Governo Geraldo Alckmin (PSDB), Luiz Roberto dos Santos, conhecido como Moita, ao suposto esquema de fraudes na merenda. Moita foi desligado da chefia de gabinete do secretário Edson Aparecido um dia antes do estouro da Alba Branca. Ele retornou à sua repartição de origem na administração, a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM).

O presidente da UVB foi um dos envolvidos pelos investigados com a transação de maior interesse para a Coaf, o contrato com a Secretaria Estadual de Educação.

Os interrogados por investigadores da Alba Branca narraram com detalhes como ocorreu a aproximação entre a cooperativa e Moita.

O vendedor da cooperativa Cesar Augusto Lopes Bertholino afirmou, em depoimento à Polícia Civil e ao Ministério Público, que depois que a Secretaria da Educação do Estado suspendeu pedidos, ele, o presidente da entidade, Cássio Chebabi, e um sobrinho de Misiara, Emerson Girardi, foram até São Paulo para um reunião com o presidente da União dos Vereadores.

Misiara, segundo o relato de investigados, comprometeu-se a buscar informações sobre a suspensão da chamada pública da secretaria.

Em outra frente de investigação, Cesar Bertholino disse ter sido apresentado para o ex-deputado estadual Leonel Julio para tentar resolver o problema do contrato de fornecimento para o Estado. “(Leonel) indicou o próprio filho de nome Marcel, que poderia defender os interesses da Cooperativa”, afirmou o vendedor da Coaf à Polícia.

Marcel Ferreira Júlio, filho do ex-deputado, agia como lobista com trânsito em prefeituras e se apresentava como alguém ligado à Secretaria da Educação estadual – a pasta, no entanto, informou que Marcel não integra seus quadros.

Após os contatos, teria ocorrido uma segunda chamada em que a Coaf foi contratada para o fornecimento de R$ 12 milhões em produtos para a Secretaria, conta o interrogado. “Antes da conclusão da chamada pública, Marcel se ofereceu para ser representante da Coaf na região de São Paulo, cobrando, no entanto, 10% dos valores contratados”, afirmou Bertholino.

Segundo o vendedor, a exigência foi repassada a Cássio Chebabi, presidente da Coaf, que aceitou o pedido. “Depois do recebimento pela Coaf, de pagamentos feitos por órgãos públicos cuja contratação havia sido intermediada, de algum modo, por Marcel, o declarante era escalado para levantar as ‘comissões’ para Marcel”, disse.

O funcionário da Coaf afirmou que, no começo, Marcel “se recusava a receber de outra forma que não fosse dinheiro vivo”. Ele citou entregas em postos de combustível, entre São Paulo e Bebedouro, e posteriormente depósitos de dinheiro nas contas da esposa, do seu pai, ex-deputado Leonel Julio, e sua falecida mulher.

Bertholino disse ter ouvido do próprio Marcel Júlio que da cota de 10% que ele recebia por intermediar contratos da Coaf, 2% ele repassava para o pai, Leonel Julio. E outra parte para dois assessores do deputado Fernando Capez (PSDB), presidente da Assembleia Legislativa de São Paulo, identificados nos autos como “Licá” e “Jeter”.

Luiz Gutierrez, o Licá, é muito próximo de Capez e seu cabo eleitoral na região da Mooca. Capez diz que acredita na honestidade de Licá. Jeter Rodrigues também trabalhou com o tucano na presidência da Assembleia, mas ambos romperam em dezembro de 2015. Fernando Capez afirma que demitiu Jeter porque ele e Leonel Júlio teriam usado seu nome para indicar um delegado de polícia para um cargo em São Paulo.

Defesas

Sebastião Misiara refutou taxativamente envolvimento com o esquema da Operação Alba Branca. “Em nenhum momento eu sugeri a algum prefeito que comprasse da cooperativa Coaf. Até porque não sou vendedor e não tenho essa intimidade com os prefeitos. Exerço atividade na União dos Vereadores de capacitar o agente público”, afirmou.

“Nenhum tipo de lobby eu fiz na minha vida e não faria”, afirmou Misiara, por telefone, desde o Uruguai, onde se encontra. “Não existe a mínima possibilidade de eu ter participado dessas vendas citadas. Não houve absolutamente nenhum contato de nossa parte com qualquer prefeito do Estado de São Paulo”, disse.

Misiara esclareceu que seu sobrinho, Emerson Girardi, trabalhou na Coaf, mas depois de algum tempo, segundo ele, deixou a cooperativa e até moveu contra ela uma ação trabalhista.

A Secretaria da Educação do Estado divulgou nota informando que “vai colaborar com a Polícia Civil e o Ministério Público no que for necessário para dar sequencia às investigações. A Pasta segue a legislação do Programa Nacional de Alimentação Escolar – PNAE – criado pelo Governo Federal que institui a inserção, na alimentação escolar, de 30% de alimentos cultivados e produzidos por meio da agricultura familiar.”

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