Morre atriz Laura Antonelli, mito sexual dos anos 1970

Laura Antonelli foi catapultada à categoria de mito erótico por filmes como “Malícia”, de Salvatore Samperi, no começo dos anos 1970.

Ela foi um das mais belas e sexy mulheres do mundo. Tendo iniciado sua carreira como modelo para anúncios de Coca-Cola na Itália, Laura Antonelli foi catapultada à categoria de mito erótico por filmes como “Malícia”, de Salvatore Samperi, no começo dos anos 1970. Na década mais gloriosa de sua carreira, ela fez filmes como “O Inocente”, de Luchino Visconti, e “Esposamante”, de Marco Vicario. E aí, sabe-se lá por quê – um desejo de aperfeiçoar o que já era belo -, Laura lançou-se numa série de cirurgias plásticas. A primeira não deu certa, as outras foram piorando. A donna belíssima tornou-se uma aberração. Para fugir ao próprio rosto no espelho, ela começou a se drogar. Em 1991, aos 50 anos, a polícia encontrou 36 gramas de cocaína em sua casa. Tratada não como dependente, mas como traficante, Laura, a freak, foi a julgamento.

Condenada a 42 meses de prisão, passou a década de 1990 recorrendo na Justiça. Em 2000, foi inocentada, mas o estrago já estava feito. Com a vida destruída, Laura Antonelli mandou um recado ao mundo – Esqueçam-me. Isolou-se em Ladispolli e foi lá que morreu. Nesta segunda, 22, aos 73 anos. Feche os olhos por um momento, e o que vem? Laura, esplendorosa, em “Malícia”, em “Minha Mulher é Um Violonsexo”, em “Esposamante”. Nascida em Pula, na Croácia, em 1941 – quando a região pertencia à Itália -, formou-se em educação física em Nápoles. Tornou-se professora até ser descoberta nos anúncios de refrigerante. Fez o primeiro filme em 1965 e, na sequência, já estava filmando em inglês, com Vincent Price. Só depois a carreira deslanchou na Itália.

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Salvatore Samperi já havia feito “Obrigado, Tia”, quando, em 1973, carregou nas tintas da comédia lasciva – a definição é de Jean Tulard no Dicionário de Cinema – “Malícia”. Instantaneamente, o salário de Laura saltou de 4 milhões de liras para 100 milhões e ela virou a atriz mais bem paga da Itália. O filme é sobre garota contratada como doméstica na casa de mulher que morreu. Sobram o marido e os três filhos, e o quarteto inteiro vai se dedicar obsessivamente à tarefa de arrastar a jovem Laura para a cama. Transformada em estrela, e mito sexual, logo em seguida, Laura estava filmando com o grande Visconti, mas a experiência de “O Inocente” foi um tanto traumática.

Em 1976, quando fez o filme adaptado de um romance de DAnnunzio, Visconti estava com a saúde precária, preso à cadeira de rodas e com dificuldade de falar. Foram as sequelas da trombose que havia sofrido anos antes. Numa cena, Visconti queria que um véu amassasse o rosto de sua estrela. O filme é sobre um marido que desconfia da traição da mulher e acha que o filho não é dele. O rosto amassado era uma metáfora, um desejo dele. Em condições normais, Visconti teria feito a cena como desejava, mas sem poder falar nem ajeitar o véu com as próprias mãos, o que seria simples virou um inferno para todo o mundo. Mais dois anos e Laura, em outro filme de época, encontrou talvez seu melhor papel – que um Visconti em pleno vigor teria lhe ofertado em O Inocente.

Em “Esposamante”, ela faz a mulher de Marcello Mastroianni. Ele faz um comerciante que vive viajando. Suspeito de crime, precisa esconder-se – na casa em frente da sua. Laura faz sua mulher histérica. É frígida e vive presa ao leito. Para suprir a ausência do marido, ela assume os negócios. Passa a viajar, como ele fazia. Da sua janela, incógnito, Mastroianni assiste à transformação da mulher. Vê como ela desabrocha, assume sua sensualidade e vai para a cama com outro(s) homem(ns). Mais do que o ciúme, corroído pelo desejo o macho não sossega enquanto não recupera a mulher e faz dela sua amante. Na militância feminista da época, a Laura Antonelli de “Esposamante” provocou polêmicas que extrapolaram o universo do cinema.

No filme, para se liberar, a mulher refaz a trajetória do marido. É significativo que seja o cavalo, na charrete que ele usava, que leve a mulher aos ambientes que o ex frequentava. Houve réplica e tréplica sobre se agir como homem era o que poderia liberar a mulher. O que não houve dúvida é que Laura, nas cenas de sexo, era um furor. Uma cena, na escada, ficou indelevelmente gravada na memória de quem viu o filme. Seios, bumbum, os lábios carnudos, a respiração ofegante, tudo fez de Laura Antonelli – em 1978! – um símbolo do empoderamento (palavra horrível) da mulher. A nova mulher, ciente do seu poder, da sua sexualidade.

Outros diretores importantes, como Ettore Scola e Mauro Bolognini, lhe ofereceram papéis à altura de sua beleza, talento – e cachê. Mas logo criou-se o inferno. A bela virou fera na suíte de experiências desastrosas com o próprio corpo. Nem David Cronenberg imaginaria uma história tão trágica – e triste. “Esqueçam-me”, pediu Laura. O mundo cumpriu seu desejo, e a esqueceu. A morte a resgata. E La Antonelli que agora se chora é a diva, a encarnação da malícia, a esposamante. La donna piú bella del mondo.

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