
Em três dias de vigência da nova medida do governo federal, criada para oferecer crédito mais barato para o trabalhador com carteira assinada, foram 40 milhões de simulações e 11 mil contratos assinados. A procura pelo crédito, que tem lastro no FGTS (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço), é criticada pois o programa não oferece ações de educação financeira que evitem que o trabalhador entre novamente em uma espiral de dívidas.
Pelo programa os trabalhadores podem solicitar empréstimo em 80 bancos, sendo que a prestação não pode ultrapassar 35% do salário. O governo quer que estimular o crédito a juros mais baixos, oferecer a oportunidade para quem tem carteira assinada.
Volney Gouveia, coordenador do curso de Ciências Econômicas da USCS (Universidade Municipal de São Caetano), considera a medida positiva, porém carece de um curso de educação financeira para evitar que o trabalhador continue a se endividar. “Por um lado ele é bom porque foge da taxa Selic (Taxa Básica de Juros), mas deveria vir acompanhado da educação financeira. O trabalhador precisa de um treinamento ou de um aplicativo que o ajude a cuidar do dinheiro, esse é o desafio maior”, diz.
O economista afirma que o problema não é o endividamento. Se olhar para os números, 8 em cada 10 brasileiros estão endividados, o problema é a inadimplência, que está em menos de 20%. “Dívida não é problema desde que se pague em dia. O programa pode ajudar o trabalhador a trocar a dívida mais cara por outra mais barata. A criatividade do governo com os recentes programas visa o crescimento econômico e a redução das desigualdades, só acho que seriam razoáveis as medidas virem acompanhadas de educação financeira, senão o trabalhador vai estar trocando uma poupança de longo prazo, que é o Fundo de Garantia, pelo consumo em curto prazo”, aponta Gouveia.
Ação populista
“O Empréstimo CLT é uma ação populista. Hoje só se tem o discurso, mas vejo que o mercado não vai deixar o juro cair muito. Com todas essas medidas, como o Saque FGTS, o Desenrola e agora esse empréstimo, quem ganha é sempre o setor financeiro”, aponta o presidente da CDL (Câmara de Dirigentes Lojistas) de São Caetano, Alexandre Damasio.
Para Damasio, o trabalhador, ao ser demitido, já usa o seu FGTS para pagar dívidas, em vez de aplicar para garantir o pagamento das contas até a recolocação profissional. “Não estou otimista com essa medida e imagino um terceiro trimestre com mais inadimplência e com crédito mais caro. Está se acabando com o emprego formal e quem tem carteira assinada está pagando dívida com o FGTS ou o crédito consignado”, lamenta.
Fernanda Medei, CEO da startup Medei, que atua com Recursos Humanos e realizou mais de 20 mil rescisões em 2025, diz que a grande maioria dos trabalhadores que perdem seus empregos, cerca de 60% segundo seus cálculos estão endividados. Esses trabalhadores ou estão com crédito consignado em andamento, o que compromete o saque do fundo, ou estão com o fundo bloqueado por terem feito o Saque Aniversário, o que impede a liberação do fundo por um prazo de dois anos.
“O trabalhador opta por esse saque porque é um dinheiro mais fácil. Isso foi criado na pandemia para ser uma ajuda emergencial, mas que perdurou. Aí o trabalhador sai do emprego e não tem o que sacar para pagar suas contas. O governo deveria focar mais na educação financeira que ensinasse como usar melhor o crédito”, sugere.
Armadilhas
Engana-se quem pensa que apenas os trabalhadores de baixa qualificação, ou os que têm pouco estudo, caem nas armadilhas do crédito fácil. “Caem os trabalhadores com menor instrução como também os que têm cargos gerenciais, tudo por falta de um planejamento. Hoje se tem até empresas aéreas que vendem passagens com dinheiro do FGTS. Enquanto o que deveria ser uma poupança para o trabalhador se vai em passagem aérea e pagamento de dívidas e se perde o objetivo que criou o fundo”, completa.
O ministro do Trabalho e Emprego, Luiz Marinho, destacou a abrangência do novo do Programa Crédito do Trabalhador na Carteira Digital de Trabalho, que entrou no ar nesta sexta-feira (21/03) e recomendou cautela. Marinho afirmou que os trabalhadores não precisam ter pressa e busquem o máximo possível de propostas, comparem todas, e só fechem negócio após análise criteriosa. “Tenha paciência, só tome [empréstimo] em caso de extrema necessidade, para trocar uma dívida cara para uma mais barata ou fazer um belo investimento que você esteja precisando”, ponderou.