
Apesar de um processo de desindustrialização, o ABC ainda é uma das regiões mais industrializadas do País e grande grande parte do PIB (Produto Interno Bruto) vem da indústria. São cerca de 7 mil fábricas, segundo o Dieese (Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos), atrás apenas da Capital em volume. Mas o turismo industrial na região, das missões empresariais, comitivas de governos em visita às fábricas ou mesmo a abertura dos portões destas empresas para a comunidade em geral, estudantes e pesquisadores ainda é fraco.
Exemplo disso é de um professor do Ensino Médio, que não consegue empresas que possam receber seus alunos do ensino técnico, que precisam desta vivência. São Bernardo e Santo André têm programas de visitas às empresas. No ano passado 7,2 mil pessoas participaram.
O professor Marcos Coelho, que ministra aulas para alunos do Ensino Médio da Escola Estadual Dr. Francisco Emygdio Pereira Neto, no bairro Demarchi, em São Bernardo, quer levar seus alunos do 2° e 3° ano para conhecer empresas, uma exigência do curso técnico, porém enfrenta grande dificuldade para conseguir indústrias que aceitem receber os estudantes. “No ano passado eu consegui levar os alunos a duas empresas, a Scania e a Bombril, mas foi uma jornada árdua, para conseguir tentei mais de 15. Neste ano estou com dificuldade, não consegui nenhuma ainda. Algumas me respondem que estão reestruturando o programa, outras que não têm agenda”, relata.
“É uma experiência muito relevante para os alunos, proporciona uma vivência com outros profissionais e eles voltam da visita com brilho no olhar e com vontade de conhecer mais. Isso é extremamente importante num mercado de trabalho tão carente de profissionais qualificados”, resume o professor.
Para Marianna Redigolo, docente da área de Turismo e Hospitalidade do Senac (Serviço Nacional do Comércio) de São Bernardo, sem dúvida, trata-se de uma excelente estratégia de marketing, pois proporciona uma experiência rica e engajante para o público, ao mesmo tempo em que fortalece a imagem da empresa. “Embora muitas empresas já reconheçam essa estratégia como valiosa, ainda existe uma resistência em parte da classe empresarial, que talvez não perceba totalmente os benefícios de abrir suas portas. Acredito que ações de sensibilização e conscientização são necessárias para mostrar os impactos positivos dessas iniciativas. Organizar eventos para compartilhar cases de sucesso, como congressos ou workshops, poderia ajudar a promover esse tipo de prática e mostrar os ganhos institucionais e de imagem para as empresas”, analisa.
Executivos
No meio empresarial, por anos o ABC lamentou não ter infraestrutura hoteleira suficiente para atender a demanda. Hoje a região já conta com isso, mas ainda faltam centros de convenções e espaços para feiras e eventos. Para a professora Marianna Redigolo, a infraestrutura melhorou, mas falta reconhecer o potencial do turismo empresarial que a região tem. “A infraestrutura melhorou, mas a mudança de mentalidade e a promoção do destino turístico empresarial ainda são desafios. A falta de estratégias de marketing mais eficazes para divulgar a região e suas capacidades para receber negócios e eventos pode ser um dos motivos. Além disso, há a necessidade de um esforço contínuo de capacitação das empresas e das entidades envolvidas para que, mesmo com a estrutura existente, saibamos atrair e sustentar os negócios e eventos de forma efetiva”, analisa.
Para Marianna é preciso definir uma estratégia para promover o turismo empresarial e criar um órgão regional para fomentar essas iniciativas. Diz que a falta de atratividade para missões empresariais na região pode ser atribuída à ausência de uma estratégia integrada de promoção do turismo empresarial. Uma medida relevante seria a criação de um órgão regional, como um Convention Bureau, para centralizar esforços de marketing e a prospecção de novas oportunidades.
“Além disso, o Consórcio Intermunicipal e a Agência de Desenvolvimento têm o potencial de intensificar suas ações, aproximar as empresas locais do setor público e privado, além de fomentar eventos e iniciativas que promovam a região como um polo de negócios. Os conselhos municipais, como o Comtur, também desempenham um papel importante nesse processo e podem contribuir significativamente para o fortalecimento do turismo empresarial na região”, descreve Marianna.
A docente da área de turismo do Senac aponta que as iniciativas devem ser regionais com o envolvimento do poder público e entidades. “Esse tripé fortalece a organização das ações e garante que as demandas de todas as partes envolvidas sejam atendidas de forma equilibrada. Entidades como o Senac, e outras têm um papel fundamental, não apenas na execução de projetos, mas também como mediadoras e orientadoras, trazendo sua experiência na condução de ações estratégicas para o desenvolvimento dessa atividade turística”, diz.

Enquanto isso não acontece o ABC perde para outras regiões, como Foz do Iguaçu e Belo Horizonte. “São exemplos notáveis. Foz do Iguaçu se consolidou como referência no turismo de incentivo, atraiu empresas que organizam viagens para premiar colaboradores e fortalecer relações de negócios. A cidade conta com uma infraestrutura hoteleira preparada para eventos corporativos, além de oferecer experiências exclusivas em seus atrativos turísticos, impulsionando a economia local. Já Belo Horizonte se destaca pelo seu forte ecossistema de inovação e tecnologia, sendo sede de importantes eventos, como a Feira Internacional de Negócios, Inovação e Tecnologia (Finit), afirma Marianna.
A professora diz que a cidade valoriza sua identidade gastronômica para atrair congressos e encontros empresariais, movimenta setores como a hotelaria e o comércio. Esses casos demonstram como o turismo empresarial estimula o desenvolvimento econômico, fortalece destinos estratégicos e pode inspirar as cidades da nossa região a explorarem melhor seu potencial.
Para o diretor do Ciesp (Centro das Indústrias do Estado de São Paulo) regional de Diadema, Anuar Dequech Júnior, infraestrutura para receber empresários e eventos o município ainda não tem, porém investimentos nesta área poderiam ser interessantes para a cidade. Cita a proximidade da cidade do São Paulo Expo, que recebe o ano inteiro feiras e eventos de grande porte. “A gente não consegue aproveitar isso, seria excelente termos um bom hotel para atrair esse público, e estamos no contra-fluxo da rodovia dos Imigrantes, o que facilitaria o acesso. Quando vem empresários convidados por empresas de Diadema a gente manda para hotéis em São Bernardo ou Santo André, e a gente perde a oportunidade de negócios. Não tenho dúvida que há uma demanda”, aponta.
Quanto ao interesse de empresas em atrair representantes de outras para celebrar negócios e também de abrir seus portões para a comunidade, estudantes e pesquisadores, é uma questão de perfil da gestão, segundo o diretor do Ciesp de Diadema. “Geralmente as maiores têm iniciativas assim como a Paranoá ou a Schuller, fazem isso, mas temos mais empresas médias e pequenas”, diz Dequech Júnior que cita a tecnologia das video conferências, impulsionada na pandemia, que reduziu muito as viagens empresariais, porém acredita que os encontros presenciais de empresários têm voltado. “Os grandes negócios são fechados mesmo com olho no olho”, completa.
A professora de Turismo do Senac concorda com o diretor do Ciesp de Diadema. “Análises mais recentes indicam que, no contexto atual, o formato presencial ainda é o preferido para muitos negócios, especialmente os que envolvem grandes transações. O contato direto continua sendo fundamental para fortalecer relações comerciais, gerar confiança e criar parcerias duradouras”, destaca.
Hotéis
A rede hoteleira cresceu no ABC nos últimos anos. Para o presidente do Sehal (Sindicato das Empresas de Hospedagem e Alimentação do ABC), Beto Moreira, o que é necessário hoje, é que os municípios adotem estratégias para segurar as empresas na região. “Temos hotéis, bons restaurantes, serviços e locadoras de carros, então o que precisa é manter as indústrias na região, porque elas é que pagam os melhores salários, com isso ela mantém o comércio também. Se preciso, dar benefício para as empresas ficarem e o ABC não perder mais indústrias para o interior do Estado. Não podemos mais perder indústrias por causa da falta de segurança, ou pelo preço do metro quadrado. Sem o emprego da indústria vamos virar cidades dormitório”, analisa.

Municípios
Santo André e São Bernardo contam com programas através dos quais são organizadas visitas monitoradas às empresas.
O programa Turismo Industrial e de Inovação de Santo André estimula, segundo a Prefeitura, o networking com os visitantes (empresários, empreendedores, estudantes etc) e a visibilidade das empresas e instituições visitadas. A partir de um movimento regional que busca estabelecer as cidades do ABC como destino de turismo de negócios, Santo André lançou seu programa municipal em abril de 2019.
O programa conta atualmente com a participação da Solvay, Braskem, Cervejaria Madalena e Unipar, e com a parceria institucional junto ao Itescs (Instituto de Tecnologia de São Caetano do Sul) e Acisa (Associação Comercial e Industrial de Santo André), para fomento à divulgação do programa. Em 2024 foram realizadas 10 visitas pelo programa de Turismo Industrial, com 220 beneficiados. Ao todo, desde sua criação, foram realizadas 39 visitas, com 940 visitantes”, diz nota da prefeitura. Informações em: https://www3.santoandre.sp.gov.br/turismosantoandre/turismo-industrial/.
A Prefeitura de São Bernardo, diz que atende cerca de 7 mil pessoas por ano com seus programas nesta área. Agora a Prefeitura expandiu o programa com o Turismo Industrial Inclusivo, voltado para cegos, surdos e pessoas com autismo, além de consolidar os roteiros para públicos específicos, como o Turismo Industrial Kids, Teens e para grupos temáticos e comemorativos. “O município estuda ainda a viabilidade de lançar um programa de Turismo Empresarial, voltado para empresários, com foco em network e troca de experiências, como forma de fortalecer o desenvolvimento econômico local. Lançado em 2013 com apenas uma empresa parceira — a Wheaton Brasil Vidros — e oferta de 20 vagas mensais, o projeto, atualmente, disponibiliza mais de 600 vagas por mês em 18 empresas parceiras, totalizando mais de 7.000 visitantes anuais”, diz nota da Prefeitura.
Metaindústria
São Caetano informa que quer fortalecer programas que incentivem a visitação às fábricas, a atração de pessoas para a rede hoteleira da cidade e o consumo no município por empresários e investidores. “A Sedeti tem trabalhado na estruturação de um programa voltado ao turismo empresarial, com iniciativas para fomentar visitas técnicas nas indústrias e empresas da cidade, além de estimular a permanência de visitantes na rede hoteleira e no comércio local. No dia 20 de março, a cidade recebe um evento, o Metaindústria, com o objetivo de aproximar as indústrias de novos processos, tecnologia e modelos de negócios da indústria 4.0. Esse evento contribuirá diretamente para o turismo de negócios, atraindo empresários, especialistas e investidores para São Caetano, movimentando a rede hoteleira, restaurantes e o comércio local. A expectativa é consolidar São Caetano como um destino estratégico para negócios na região metropolitana de São Paulo”, diz o município, em nota.
Rio Grande da Serra informa não ter nenhuma ação de estímulo ao turismo industrial, mas revelou que, dentro do Projeto “Escola sem muros”, ocorreu visita de alunos da Escola Edmundo Luiz de Nobrega Teixeira à Unipar. O projeto contou com patrocínio da empresa.
As prefeituras de Diadema, Mauá e Ribeirão Pires não responderam. O Consórcio Intermunicipal que mantém o GT (Grupo de Trabalho) de Turismo, também não se pronunciou sobre o assunto.