“Eu não vou lá por causa do cemitério, vou lá por causa dos meus parentes que estão ali”, assim Adriana Oliveira descreveu o sentimento em relação ao Cemitério Carminha, no Bairro dos Casa, em São Bernardo. Não é apenas tudo que envolve o cemitério, como reviver a perda, nem a conservação nem sempre ideal do cemitério que a afastam; no caso de Adriana, os restos mortais do seu pai foram exumados e provavelmente incinerados sem o consentimento da família. Não fosse a perda da mãe recentemente ela não teria mais motivos para ir à necrópole.
Quando o pai morreu, disseram que Adriana poderia esperar até seis anos para então exumar, mas quando ela chegou lá, cinco anos depois, já tinham exumado e os restos mortais foram perdidos. O pai de Adriana, Cícero Ferreira de Lima, faleceu aos 67 anos em 2017. A filha disse que só não entrou com uma ação contra o município por não conhecer um advogado especializado. Isso tudo aconteceu em outubro, pouco tempo depois Adriana perdeu a mãe e o sepultamento também foi no Carminha. Ela disse que não foi ao Cemitério neste Dia de Finados por causa da recuperação de uma cirurgia recente, mas que depois irá.
Na época que o RD fez a reportagem, em maio de 2023, a Prefeitura de São Bernardo informou que o prazo para exumação é de três anos. “Após esse período, é preciso providenciar a exumação dos despojos mortais para cemitério ou cremação particular. Caso não seja providenciado, o município promove, após publicação dos atos no Diário Oficial, a exumação para o ossuário geral, onde ficará perpetuamente”, sustentou a administração.
O RD também destacou em outubro o caso de Ivanice Nunes Martins, que passou pela mesma situação de Adriana, só que no cemitério de Rio Grande da Serra, o único da cidade. Ela perdeu a mãe, Helena Nunes Martins em outubro de 2019 e tem documento que informa que ela teria até seis anos para fazer a exumação, prazo que venceria em outubro de 2025. No dia 21/10 deste ano ela foi ao cemitério para visitar o túmulo e quando chegou lá não havia mais túmulo e uma alameda estava sendo construída no lugar. Na administração soube que o corpo da sua mãe fora exumado em junho e seus restos mortais estariam em saco plástico no ossário. Um desses sacos foi apresentado, mas ela desconfia que os restos mortais podem ser de qualquer pessoa.
“Os sacos estavam todos acumulados, havia muita sujeira e resíduos nos sacos, mas a etiqueta estava limpa, branquinha, como nova. Quem me garante que o pacote que nos apresentaram era o certo? E tem outras 17 famílias que tiveram os corpos exumados e ninguém da família apareceu”, diz. Ivanice disse que não foi comunicada e que um ano antes funcionários do cemitério estiveram em sua casa para falar da exumação e ela não autorizou pois não tinha dado nem quatro anos do falecimento. “Quero ter certeza de que a ossada entregue era realmente da minha mãe para termos paz”, disse Ivanice que deseja fazer um exame de DNA, mesmo que precise acionar a Justiça para isso. A Prefeitura de Rio Grande da Serra não quis comentar o caso.
Prazo varia de três a quatro anos
Cada Prefeitura tem suas regras para as exumações mas, em geral, é determinado um prazo de três a quatro anos para que a família providencie o envio para ossuário ou cremação.
Em Ribeirão Pires o prazo é de três anos, mas há uma tolerância. “A municipalidade estende por dois anos, atingindo total de cinco anos, para que a exumação seja realizada. Caso os parentes não compareçam ao cemitério neste período, fica a cargo do Serviço Funerário realizar a exumação e destinar ao ossário geral. A administração municipal dá 10 dias para que haja contestação dos familiares. Caso, ainda assim, nenhum parente compareça, o Serviço Funerário prossegue com a exumação”, informa. Na cidade foram realizadas neste ano, até o dia 31 de outubro, 302 exumações. Taxas de exumação e destino de resíduos é paga no ato. Famílias de baixa renda, comprovada pelo CadÚnico podem requerer isenção.
Em São Caetano, a família é avisada quando do sepultamento de que o corpo será exumado após três anos. “Como a família está ciente de que o corpo será exumado após três anos de sepultamento, ela tem de tomar as devidas providências antes da exumação. Caso não tenha tomado providência alguma, o cemitério tem autonomia para realizar a exumação e colocar os restos mortais num ossário geral”, explica a Prefeitura, em nota. Na cidade foram feitas 310 exumações este ano.
Uma situação que pode ocorrer é que o corpo não esteja pronto ainda para exumação. Neste caso, é inumado novamente, mas a família tem de arcar com as taxas do serviço mesmo assim. Em São Caetano, se a família tem jazigo próprio arca apenas com a exumação, do contrário ainda arcará com os serviço de nicho no ossário. Famílias hipossuficientes precisam fazer um requerimento de isenção no Atende Fácil e esse pedido será analisado, podendo ser aprovado ou não.
No Cemitério Público de Diadema, as exumações são feitas no prazo de três anos. O município salienta que a família é avisada, no sepultamento sobre o prazo. Lei municipal determina que a Prefeitura envie carta via correio com 30 dias de antecedência. A Prefeitura ainda aguarda 30 dias, pela manifestação da família. Se ninguém for localizado os restos mortais são exumados e levados ao ossuário geral. De janeiro a agosto deste ano foram feitas 1.622 exumações. Atualmente, a taxa de exumação é de R$ 333,63 e a de reinumação é de R$ 193,16. A taxa de manutenção do ossuário é de R$ 94,17, a cada 5 anos. As famílias que alegam falta de recursos para arcar com as taxas são avaliadas pelo serviço social.
Em Rio Grande da Serra, a comunicação de exumações é feita pelo Diário Oficial, uma publicação que, em geral, não é vista regularmente pela população, e a Prefeitura também diz informar as famílias por telefone. Na cidade o prazo para exumar varia de quatro a sete anos. “O processo de exumações é feito após sete anos (antes da pandemia) e quatro anos após a pandemia. Não sendo localizados os familiares, a Prefeitura, uma vez autorizada dentro do prazo da lei, após a data vencida, autoriza o cemitério a fazer a exumação”, diz nota da Prefeitura. Este ano foram feitas 258 exumações.
Mesmo se o corpo não estiver pronto após o prazo legal, o que é verificado só no momento da exumação, a família terá de pagar a taxa em Rio Grande da Serra para recolocação do corpo na sepultura. Além da taxa para exumar o ente, a família paga taxa de nicho no ossário. Famílias hipossuficientes devem fazer o pedido por carta e enviar à assistência social.
Em Santo André, o prazo para exumação é de três anos. “No caso do Cemitério Nossa Senhora do Carmo – Vila Curuçá -, onde são realizados sepultamentos em jazigos temporários, no momento do sepultamento o familiar responsável assina um termo onde é cientificado do prazo de exumação e que deve procurar a administração do cemitério no vencimento do prazo da sepultura. Nos casos em que a família possua jazigos perpétuos no município vencidos os prazos legais, a mesma pode solicitar quando julgar necessário”, explica o Paço andreense.
Se a família não se apresenta no prazo, a Prefeitura faz o aviso apenas pelo do Diário Oficial. “Vencido o prazo estabelecido na publicação do Diário Oficial, não havendo o contato da família, os corpos são exumados e os despojos são encaminhados para o ossuário coletivo conforme legislação municipal, nos casos em que o corpo estiver integro permanece por mais três anos sepultado”, detalha nota da Prefeitura que informou ter feito 400 exumações só em outubro.
Se o corpo não estiver pronto para ser exumado ele permanece sepultado por igual período e a cidade é a única na região que, nestes casos só cobra uma vez a taxa de exumação. A taxa de exumação é de R$ 411,88, a concessão de nicho para munícipes de Santo André é de R$ 567,27 e de R$ 1.196,36 para não munícipes. Nos casos em que a família possuir jazigo nos cemitérios municipais a taxa de exumação é de R$ 612,92 e os despojos geralmente permanecem no jazigo familiar. Quem não pode pagar terá os despojos enviados para ossuário coletivo. São Bernardo e Mauá não responderam.