
Dois trabalhos artísticos surgidos durante a pandemia em 2020 se mesclam para a criação de Canto ao Fim. O espetáculo de dança, resultado da parceria inédita entre Clarissa Sacchelli e Isabel Ramos Monteiro, que voltaram seus olhares para os labores envolvidos nos gestos de cuidados recebidos e doados, estreia dia 25 de agosto, domingo, às 18h, no Teatro Conchita de Moraes, em Santo André.
Contemplado com o ProAC Editais, Produção Inédita em Dança (03/2023), o espetáculo, após passar por Campinas, também faz apresentações em São Paulo de 29 de agosto a 1º de setembro, quinta-feira a sábado, 19h e domingo, 17h, na Galeria Olido.
Em Canto ao Fim , que acontece em meio a uma instalação de som e luz, Clarissa Sacchelli e Isabel Ramos Monteiro levam para a cena a oralidade, as canções de ninar, os gestos que não se arquivam pois são atualizados a todo tempo na transmissão corpo a corpo. São gestos que moldaram os gestos das duas artistas, movimentos forjados por danças pregressas e formas que orientam danças futuras. No palco, Isabel assume a partitura dos gestos e Clarissa comanda em tempo real a paisagem sonora.
Durante a criação de Canto ao Fim foram realizadas conversas com mães e cuidadoras, buscando levantar e investigar relações entre som, memória e cuidado. Destas conversas emergiram diferentes paisagens sonoras, interjeições características da oralidade, e coros de canções de ninar que acabaram por dar forma à trilha sonora da peça. O processo de criação também envolveu uma série de oficinas ministrada pelas artistas além da proposição de uma vivência estendida de dança e criação para gestantes e puérperas.
Substantivo e verbo
A nova obra das duas artistas surge a partir de dois experimentos artísticos realizados durante a pandemia em 2020. Ao fim da Dança, de Isabel Ramos Monteiro, que logo após virou a dissertação de mestrado Ao fim da dança: ensaios sobre o dançar e o fazer literário – Usp (2022) e Um canto de trabalho, de Clarissa Sacchelli, peça sonora on-line que investiu na relação entre a ação de dançar e ação de fazer alguém ninar. Na ocasião, Isabel assistiu ao trabalho de Clarissa e vice-versa e perceberam que havia um universo comum a ser explorado em conjunto.
Canto ao Fim aposta na vida e em questões limites como nascimento e morte. Para Clarissa e Isabel, a dança faz lembrar daquilo que só podem assimilar em companhia. “Aprendemos a dançar olhando, sentindo ou dançando junto de alguém. Balançando, para frente e para trás, nos perguntamos como perduram os rastros das danças dos que nos antecederam e dos que ainda virão depois de nós”, explica Isabel. Já Clarissa questiona: “O que a dança e a manutenção da vida têm em comum?”
O nome que dá título ao espetáculo propõe uma abertura de sentidos: canto como substantivo, mas também como verbo. Cantar, tão intrínseco a dançar, é também uma homenagem e celebração aos sons e movimentos que trouxeram as duas artistas até a essa nova obra. “Canto como insistência e aposta nos gestos vindouros que nos sucedem”, aponta Isabel. “O som como um agente que pode nos devolver a imagem daquilo que se transmite no corpo a corpo, que se repete nas nossas vozes”, completa Clarissa.
Na montagem, palco e plateia não se separam e o público é convidado a se sentar dentro da instalação onde a peça acontece. Tanto a trilha sonora como o desenho de luz são compostas em tempo real, seguindo a dramaturgia da coreografia. A dança formada de gestos acontece tanto no centro como nos bastidores da cena.