ABC - domingo , 6 de outubro de 2024

Auricchio quer trazer escola militar criticada por educadores e população

Tite, Auricchio e Thiago, fizeram vídeo para dizer que vão iniciar trâmite na Câmara de Vereadores sobre as escolas cívico militares. (Foto: Reprodução)

Não se passaram nem duas semanas da aprovação pela Assembleia Legislativa do projeto que cria as escolas militares no Estado, e nem uma semana da sanção pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) da medida e a prefeitura de São Caetano já iniciou trâmites para atrair uma destas escolas para a cidade. Em vídeo publicado nas suas redes sociais o prefeito de São Caetano, José Auricchio Júnior (PSDB), seu filho e deputado estadual Thiago Auricchio (PL) e o vereador e pré-candidato a prefeito Tite Campanella (ambos do PL), aparecem falando sobre a indicação para a instalação de uma escola militar na cidade. Na publicação que foi ao ar na segunda-feira (03/06), o vereador afirma que vai agilizar o trâmite no Legislativo municipal. O projeto das escolas militares foi altamente criticado por entidades ligadas à educação e há até medida judicial no STF contra a lei estadual. Especialistas falam em doutrinação militar e piora da qualidade de ensino.

“Não há apoio de conselhos, movimentos de educação e sindicatos. Não há sequer uma entidade representativa do setor educacional que apoie essa medida do governador. Eu entendo essa militarização das escolas com um grande retrocesso; que significa contradizer todo o processo de uma educação pública e democrática em nome de uma demanda de setores militares, o que não é coerente com a política educacional”, aponta o professor Salomão Ximenes da UFABC (Universidade Federal do ABC), integrante da Campanha Nacional Pelo Direito à Educação e coordenador do Observatório Regional de Políticas Educacionais do ABC.

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Para o especialista que tem se dedicado a estudar o projeto do Estado e prováveis impactos no ensino, a medida vai prejudicar o ensino de uma forma geral. “Trata-se de uma ocupação militar nas escolas de forma violenta na forma pedagógica e na forma física também. Essas escolas passam a ter uma característica de doutrina militar, única e exclusivamente para dar a setores militares uma remuneração extra. O governo vem com um discurso de que vai levar essas escolas para as periferias, trazendo mais infraestrutura, mas não ataca o problema do desmonte da educação pública e ainda vai sugar mais dinheiro da educação que serviria a outras escolas”, diz Ximenes.

O professor disse que o assunto vai ser amplamente debatido e que há muitos aspectos até legais a serem combatidos. “Os militares inativos que forem atuar nas escolas vão ganhar mais que suas aposentadorias e vão ser mais remunerados que os professores para atuarem em desvio de função, já que eles não têm formação para isso. Além do que isso não está previsto na LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação). Ordem e disciplina são princípios de ordem militar que são o oposto do que está na Constituição e na LDB sobre o ensino. As escolas militares trarão disciplinamento hierárquico e violento ao silenciar os estudantes”, completa.

Na esfera estadual o PSol entrou com uma ADIn (Ação Direta de Inconstitucionalidade) contra a lei que instituiu as escolas militares no Estado. Em outras instâncias o partido também vai atuar para tentar evitar a instalação destas escolas. A vereadora Bruna Biondi, de São Caetano, disse que vai iniciar um debate nas escolas sobre esse tema, conversando com alunos, professores e pais. Na próxima semana seu gabinete vai iniciar a coleta de assinaturas contra a medida e também estuda elaborar um projeto de lei que visa proibir escolas militares na cidade. “A intenção desta iniciativa é é que a presença da PM dentro da escola reprima a lógica do pensamento crítico que combata os grupos de estudantes e os grêmios. Uma prova disso foi a repressão durante a aprovação da lei na Alesp, que foi um banho de sangue”, sustenta a parlamentar.

Segundo Bruna, os policiais militares entrariam na estrutura das escolas como agentes de organização escolar e ela avalia que a presença irá aumentar problemas como conflitos entre alunos, racismo, machismo e preconceito por causa de orientação sexual. “Tem casos de escolas militares que interferem até no corte de cabelo. Não é isso que nós queremos, queremos uma cultura de paz nas escolas e trazer a polícia para dentro só vai piorar. Como um policial militar vai agir durante uma briga de alunos? Ele não tem formação pedagógica para isso”, completa.

Na própria publicação feita pelo prefeito no seu Instagram, muitos moradores criticaram a medida. “Baita retrocesso, botar militar aposentado como fiscal de corredor de escola ganhando mais do que os professores”, disse um internauta. A todos que criticaram a medida a equipe do prefeito encaminhou a mesma resposta em nome do alcaide: “A adesão à escola cívico-militar é uma opção adicional e voluntária para as famílias, com o objetivo de oferecer mais qualidade e segurança no ambiente escolar. Vamos aguardar a finalização dos trâmites necessários e manter todos informados através de nossos canais oficiais”.

Santo André também tem projeto de iniciativa de vereador da situação

O vereador de Santo André Rodolfo Donetti (Cidadania) protocolou na Câmara um projeto de lei complementar que visa autorizar o município a instituir e regulamentar na cidade o programa de escola cívico militar nas escolas públicas de Ensino Fundamental I, ou seja, para alunos da primeira à quinta séries.

De acordo com o projeto a comunidade escolar deve decidir se quer a conversão da escola para o modelo cívico militar, mas também diz que é papel da Secretaria de Educação conscientizar a comunidade sobre as vantagens do modelo. A secretaria também seria responsável pela seleção dos policiais militares que vão atuar nas escolas.

Donetti que é policial militar da reserva, destacou que as escolas militares contam com melhor qualidade de ensino. “O Programa Municipal de Escola Cívico Militar se constitui em um importantíssimo complemento às políticas de melhoria da qualidade da educação básica municipal por meio do desenvolvimento de um ambiente escolar adequado que promova avanço no processo de ensino aprendizagem, na gestão de excelência dos processos educacionais, pedagógicos e administrativos e no fortalecimento de valores humanos e cívicos”, disse em sua mensagem de justificativa, que acompanha o projeto de lei.

O parlamentar andreense tem estreitas ligações com o comando da Polícia Militar. Em março ele representou o prefeito Paulo Serra (PSDB) em um evento de formatura de um curso de aperfeiçoamento para oficiais. Na ocasião ele esteve ao lado do ex-secretário estadual de Segurança Pública e deputado federal Guilherme Derrite, e do comandante geral da PM, coronel  Cássio Araújo de Freitas.

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