
Estudo feito pela CDL (Câmara de Dirigentes Lojistas) de São Caetano, com apoio da Agência de Desenvolvimento Econômico do ABC, mostra que a inadimplência no ABC cresceu 13,58% em abril, comparado com o mesmo período do ano passado. Os números mostram que o valor médio da inadimplência é de R$ 5.191,73, porém a maioria dos inadimplentes (64%) deve até R$ 1.000.
O levantamento mostra que o número de dívidas em atraso cresceu na região praticamente o dobro do que cresceu a inadimplência na região Sudeste, que subiu 6,87%, e também é bem maior do que a média nacional que teve crescimento de 8,08%. Somente entre março e abril, o número de devedores no ABC subiu 1,84%, enquanto que no Sudeste a variação foi de 0,17%.
Em abril de 2023, cada consumidor negativado da região devia, em média, R$ 5.191,73 na soma de todas as dívidas. Os dados ainda mostram que 64,16% têm dívidas de até R$ 1.000. O tempo médio de atraso no ABC é igual a 25,2 meses, sendo que 33,22% dos devedores possuem tempo de inadimplência de 1 a 3 anos. A apuração da CDL mostra que em abril de 2023, o número de dívidas em atraso de moradores do ABC cresceu 26,60%, em relação a abril de 2022. O dado ficou acima da média da região Sudeste (17,52%) e acima da média nacional (18,42%). Só entre março e abril esse número cresceu 2,47% enquanto que em todo o Sudeste a variação foi de 0,08%. Com relação ao perfil das dívidas, o setor bancário registrou o maior número de dívidas na região, em novembro de 2022 eram cerca de 74,37% e em abril de 2023 ultrapassaram 75%. As contas de água e luz seguem em segundo lugar, com 10 % das dívidas ativas.
Para o presidente da CDL de São Caetano, Alexandre Damásio, considerando o tempo médio de endividamento, de 1 a 3 anos, ocorreram situações na economia e na política que influenciam esses números. “Tínhamos o bolsa família beneficiando um certo número de pessoas e agora não tem mais, tínhamos empresas do setor metalmecânico no ABC que agora não temos mais e soma-se a isso o encarecimento do crédito. Existem apontamentos que parte dessa população inadimplente aguarda alguma medida do governo e essa é uma possibilidade plausível”, analisa.
Sobre o programa Desenrola, do Governo Federal, Damásio está cético. “E não acredito no programa do governo porque ele continua com a política de endividamento, não fala nada em educação financeira. Esse programa vai depender do banco leiloar a dívida e 50% das pessoas do mercado estarão acima do valor para serem beneficiados. O governo não se preocupou com a educação financeira, então vai resolver uma dívida e abrir espaço para outra”.
Damásio chama atenção para os últimos levantamentos que mostram o aumento da inadimplência com despesas ordinárias, como água e luz. “Isso também tem aí o efeito da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) da Enel, que tem essa prática abusiva de cobrar e negativar”, comenta. Para o presidente da CDL o nível alto de endividamento com as instituições financeiras, mostrado na pesquisa tem a ver com a redução do crédito direto. “Cada vez se tem menos cartões de loja, carnês e cada vez mais os lojistas transferem isso para o setor financeiro e as bandeiras de cartão de crédito”.

Para o economista e gestor do curso de Ciências Econômicas e gestor adjunto dos cursos de Administração, Comércio Exterior, Gestão Comercial e Gestão Financeira da USCS (Universidade Municipal de São Caetano do Sul), Volney Gouveia, os números da inadimplência no ABC refletem a realidade de uma economia que teve uma leve recuperação, porém causando um descolamento entre a renda e o potencial de endividamento. “Os números maiores do ABC podem ser explicados pela maior atividade econômica da região. É resultado da alvancagem da economia e esse descolamento entre dívida e renda. Podemos ver também que são os mais pobres que estão devendo mais e é essa camada da população que é mais penalizada com os tributos. Uma família que tem renda de R$ 3 mil tem 45% de carga tributária, sobra R$ 1.800. São famílias que só conseguem gastar com itens essenciais e arcam com uma carga tributária excessiva”, analisa.
Para o professor da USCS, chama a atenção o perfil das dívidas que mostra que 74,37% está nas mãos de instituições financeiras, que são aquelas dívidas com cartão de crédito, cheque especial ou empréstimos. “O setor financeiro é o que pratica as maiores taxas de juros, hoje o custo médio do crédito para as famílias está em 54%, isso porque as famílias representam risco maior para os bancos, o juro do cheque especial chega a 130% ao ano, o do cartão de crédito está perto de 500%. Por isso eu vejo que o caminho para a redução da inadimplência é a redução das taxas de juros que hoje estão multo altas sem qualquer fundamento plausível, a educação financeira e a redução dos tributos sobre os mais pobres”.
Para Alexandre Damásio, presidente da Câmara dos Dirigentes Lojistas de São Caetano do Sul, a importância do monitoramento está na possibilidade de encontrar soluções antes que a inadimplência seja irreversível. “A manutenção das dívidas por um longo período demonstra a dificuldade econômica da população e a ausência de um pacto regional a favor da educação financeira. Precisamos aproveitar para ensinar como administrar o dinheiro enquanto ainda há dinheiro na praça”, explica Damásio.
O presidente da Agência de Desenvolvimento, Aroaldo da Silva, falou sobre o endividamento das famílias e a forma que isso afeta a economia regional. “É necessário um novo modelo, uma nova forma de pensar como será essa questão do crédito na região, que seja também conectado à renda regional. Há o endividamento das famílias e, de fato, a necessidade da organização dos atores regionais para enfrentarmos e cadenciar essas dívidas, que vem comprometendo a renda econômica da região”, comenta Silva.