Em dois anos, aumenta em quase 20% número de mães solo no ABC

O Dia das Mães, celebrado neste domingo (14/05), é de homenagem e vitória à batalha diária que é viver a maternidade. Mulheres que têm filhos sabem disso. Se considerarmos que muitas não contam sequer com alguém no dia-a-dia para a missão de criar e educar os filhos, o quão mais difícil a missão se torna? Somente no período de dois anos (2021-2023), e em meio a pandemia da covid-19, os cartórios registraram alta de 19,2% no número de mães solo no ABC, se comparado o primeiro quadrimestre do ano.

Juntas, as sete cidades contabilizaram em 2021 cerca de 9,4 mil nascimentos e, destes, 4,14% resultaram em maternidade solo, um total de 390 mães que registraram seus filhos sem o sobrenome do companheiro para arcar com a difícil missão de educar e sustentar o próprio filho. Este ano, com um pouco menos de nascimentos registrados (9.085), os cartórios contabilizaram 465 mães na configuração de maternidade solo, alta de 19,2% entre os períodos.

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O que chama atenção é que, em 2021, a cidade que elencava o ranking de mães solo no ABC era Santo André, com 111 crianças que carregavam somente o nome da mãe na certidão de nascimento. Este ano, a cidade que lidera o ranking é São Bernardo, com 123 crianças nesta configuração, seguido de Mauá (122), Diadema (97) e Santo André (92), Ribeirão Pires (22), Rio Grande da Serra (11) e São Caetano (8).

O principal desafio diante desses números é reconhecer, principalmente, que não há equilíbrio entre a vida profissional, pessoal e maternidade, conforme aponta a gestora do curso de Psicologia da USCS (Universidade Municipal de São Caetano do Sul), Rebeca de Cássia Daneluci. “Reconhecer essa questão pode ser um grande causador de sofrimentos”, diz. Segundo a docente, não é possível ter a mesma dedicação em todas as áreas da vida, uma vez que cada período exige energia e tempo, em detrimento de outras.

Apesar de socialmente ter sido valorizado o papel de ‘mulher maravilha’ àquela que dá conta de tudo e ainda é feliz, Rebeca pontua que pesquisas têm mostrado que a busca deste lugar e modelo de referência, segundo ela, bastante ilusório, tem feito com que muitas mulheres sintam-se cada vez mais sobrecarregadas e culpadas. “Neste sentido, seria mais interessante a construção de uma sociedade mais compreensiva, com modelos de trabalho que consideram a mulher trabalhadora e também mãe, além de uma divisão de papéis mais igualitária”, defende.

Wanessa é mãe de Matheus (7) e de Antonella (1) (Foto: arquivo pessoal)

Mãe de dois

Wanessa Teixeira de Oliveira, 26, é mãe de Matheus, de 7 anos, e de Antonella, de 1 ano e 11 meses. A vida como mãe solo iniciou aos 18 anos, no auge de sua juventude, quando conheceu o genitor de seu filho em uma das saídas junto de seus amigos. A moradora do bairro Camilópolis, em Santo André, conta que quando soube que estava grávida foi um baque para o casal, em razão de estarem juntos há pouco mais de um mês. “Acabou que a minha aceitação foi melhor do que a dele, que pensou de primeiro instante comprar remédios para que eu abortasse, mas por opção minha decidi ter meu filho e foi a melhor escolha da minha vida”, conta.

A mãe conta ter tentado manter o relacionamento por causa da pressão da família, mas em razão de circunstâncias abusivas e um relacionamento repleto de traumas que prejudicaram a gestação, a separação aconteceu. “Acabei tendo muitas intercorrências ,como sangramentos, alergias, infecções, mas sempre me mantendo firme para que meu filho sobrevivesse. E quando digo que fui mãe solo desde a gestação, foi por esse motivo. Me via sozinha lutando desde que ele (Matheus) estava na barriga e o genitor nunca se importou e nem ajudou com nada”, afirma.

Após o nascimento do Matheus, alguns problemas de saúde do menino fizeram com que Wanessa tivesse de ser ainda mais forte. Uma jornada na UTI neonatal tirou forças da mãe de onde sequer ela sabia que existia. “Precisei me virar para ter as coisas básicas do meu filho, como fraldas, leite, lençol e roupas. Aceitei trabalhos que me humilhavam, fui negada em empregos por ser mãe solo e até parei meu sonho na faculdade para me dedicar 100% a ele, enquanto o genitor teve a vida que queria: saía com amigos, comprava roupas caras, viajava e não ajudava”, conta.

Com o filho um pouco maior, Wanessa voltou a se permitir sair e ir para festas. Foi quando conheceu seu atual marido (Rafael) e, da noite em diante, não se separou mais. “Nos conhecemos por três meses até que me senti pronta para apresentá-lo ao Matheus e foi amor à primeira vista, uma verdadeira conexão”, diz. Segundo ela, Rafael foi responsável, ainda, por ajudar na criação e educação do menino. Hoje, há cinco anos juntos, o casal teve a segunda filha, Antonella, e no Dia das Mães, o recado é: “Ser mãe é viver a montanha russa de emoções e acontecimentos, mas com a certeza de que Deus jamais irá desampará-la. Lembre-se sempre que há um motivo maior para lutar e esse motivo te chama ou ainda vai te chamar de mamãe”.

Agatha superou a depressão (Foto: arquivo pessoal)

Superação

A moradora de Santo André, Agatha Gonçales de Assis também se tornou mãe solo cedo, aos 21 anos. Conta que começou a viver um romance com o pai do menino ainda aos 19, após conhecê-lo por causa de amigos em comum. Após dois meses de convivência e relacionamento, passaram a viver juntos, em um apartamento mobiliado pelo casal e, aos cinco meses de namoro, Agatha engravidou. Assim que soube da novidade, contou ao namorado percebeu o distanciamento e, desde então, tem se comunicado por meio de advogados. “Ele simplesmente fugiu de mim e disse que o filho não era dele”, afirma.

Sem entender a situação, a mãe conta que, meses após a separação, descobriu que o genitor de seu filho era casado com uma outra mulher, então preferiu se afastar de Agatha. “Tanto que mesmo depois do exame de DNA dar positivo e de eu ter comprovado que o filho era dele, fomos para caminhos diferentes e meu filho não foi registrado com seu sobrenome na certidão”, conta.

Quem ajudou Agatha a superar as dificuldades e criar o pequeno Arthur – hoje com 11 meses – foi sua mãe e a família, que não só a acolheram como a tiraram de uma depressão profunda, pós relacionamento. “Cheguei a perder 18 quilos em razão disso”, conta. Foi preciso muita terapia e ajuda de projetos sociais para que a mãe superasse essa fase e se reerguesse para dar conta da situação. Hoje, de volta em casa e prestes a se formar em técnico em administração, Agatha diz que a mensagem para o Dia das Mães é de superação e agradecimento. “Ele (Arthur) curou feridas que não foi nem ele quem as causou”, afirma.

Talita precisa conciliar a vida entre carreira e maternidade (Foto: arquivo pessoal)

Maternidade e carreira

Talita Cricca, moradora do bairro Batistini, em São Bernardo, precisou aprender na prática conciliar a carreira e maternidade, após o nascimento de seu filho Kenzo, hoje com 8 anos de idade. Em entrevista ao RD, a mãe conta que vivia um relacionamento sério há 12 anos com o pai do menino, mas após seis meses do nascimento de Kenzo resolveram se separar.

A mesma idade do menino é o tempo em que Talita vive só em São Bernardo, e apesar das dificuldades como mãe solo, não deixa de dar conta de tudo dentro de casa. É empreendedora, trabalha com produção de massas artesanais na Cozinha da Cricca, ministra aulas de informática em colégios e também é professora de Muay Thai. Ainda nos tempos livres, concilia a maternidade com o trabalho informal de churrasqueira em eventos. “Dou meu jeito porque preciso ‘me virar nos 30’ para cuidar do meu filho e dar conta de tudo”, diz.

Segundo Talita, o processo de gestação foi tranquilo, mesmo após o casal ter sido pego de surpresa com a gravidez. O que mudou foi a rotina com a chegada do bebê. A mãe conta que a maternidade de certo modo a anulou como mulher, e ela precisou adaptar suas amizades e também suas saídas para que muitas vezes pudesse incluir o filho na programação. “Confesso que fiquei mais sozinha nesse ponto também”, diz. Neste Dia das Mães, o recado de Talita é que a maternidade não seja vista apenas pelo ponto de vista “cor de rosa”, mas que a mãe dê o seu melhor e não se culpe por fazer mais do que pode. “No final, tudo vai dar certo!”, diz.

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