Mesmo consolidada como opção de transporte mais econômica e menos agressiva ao meio ambiente, a bicicleta ainda não tem espaço para se tornar opção real de mobilidade urbana. O ABC, assim como todo o País, está atrasado em políticas públicas efetivas relacionadas ao uso da bicicleta como modal. A análise é do arquiteto Enio Moro Júnior, gestor do curso de arquitetura e urbanismo da USCS (Universidade de São Caetano do Sul).
Segundo Moro, o uso de bikes na região ainda é mais para lazer. “Os gestores têm boa vontade e surgem ideias, como ciclovias e ciclofaixas, mas ainda precisamos integrar esses roteiros com pontos de interesse da população, como terminais rodoviários e centros comerciais, bem como garantir a segurança e conforto no trajeto”, afirma.
Há três anos, Daniella Pretel, de 40 anos, moradora de Ribeirão Pires, comprou a primeira bicicleta e se apaixonou pelo ciclismo como esporte, lazer e mobilidade, mas relata os desafios ao utilizar o meio de transporte no cotidiano, como a falta de bicicletários no comércio, estabelecimentos, serviços públicos, bem como a relação com os outros veículos nas vias. “Infelizmente o ciclismo não é uma prática comum ainda, as cidades não estão preparadas. Ainda precisamos de consciência dos motoristas, o respeito e entendimento de que somos parte do trânsito e que há uma vida ali”, defende.
No ABC, apenas duas cidades possuem bicicletários. São Bernardo oferece três equipamentos, nos parques Cidade Raphael Lazzuri, no Jardim do Mar; Engenheiro Salvador Arena, em Rudge Ramos; e no parque das Bicicletas, no Jardim do Mar.
Em Santo André, a Prefeitura conta com um bicicletário público da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos) ao lado da estação Prefeito Celso Daniel. O equipamento tem capacidade para 334 bicicletas.
Diadema prevê a construção de bicicletário nos terminais Piraporinha e Diadema, a serem feitos pelas concessionárias responsáveis pelos locais. Ribeirão Pires planeja um bicicletário em 2023, com a entrega da reforma do terminal rodoviário.
Desmotivação
A falta de segurança das cidades também é outro ponto que desanima a utilização de bicicletas, equipamentos fáceis de roubar. “Não dá para ir a um local e deixar amarrada num poste, isso é comum ver. Acredito que quem tem bicicleta mais antiga deixa presa em grades e postes, por necessitar deste meio de transporte. Mas as bicicletas mais novas são mais fáceis de roubar, todas as peças são encaixadas”, comenta Daniela, que orienta os interessados pelo modal conhecerem antes as vias que serão utilizadas e entenderem os riscos. “Meu sonho é que possamos escolher trabalhar de bike, mas a falta de segurança e consciência ainda causa bastante desconforto”, diz.
Após ser assaltada quatro vezes, Graziane Nabarro, de 40 anos, moradora de São Bernardo, desistiu de utilizar a bicicleta como meio de transporte. “Tive três bikes furtadas e voltei a usar o carro. Em 2016, eu tive a oportunidade de conseguir outra bicicleta e retornei a utilizá-la como meio de transporte e esporte competitivo. Em 2018 perdi mais uma bike, dessa vez, roubada a mão armada por um casal”, conta e acrescenta que, por ser mulher, se sente mais insegura em pedalar pelas ruas.
Após um ano do último roubo, Graziane conseguiu comprar uma nova bicicleta, mas optou por não utilizá-la como transporte. “Hoje sou cicloativista e a bike é um hobby, melhora a saúde mental, corporal e você faz muitas amizades. Quem pedala se torna até um motorista melhor nas ruas. A desvantagem mesmo é a insegurança, além dos equipamentos e peças que no momento estão muito caros”, afirma.
Convivência no trânsito
Segundo Moro, além da integração das ciclofaixas e ciclovias, os gestores devem se atentar à localização e como promover a convivência das bicicletas ao trânsito das cidades. “A ciclofaixa é sinalizada no chão e a bicicleta fica mais próxima dos outros veículos, é mais utilizada em vias menos movimentadas. Já a ciclovia é feita de forma separada ao trânsito, é mais segura e utilizada em vias movimentadas, por outro lado demanda um novo espaço na via, é um desafio”, ressalta o arquiteto.
A atenção também é necessária para a escolha de materiais utilizados na sinalização da via. “As ciclofaixas muitas vezes são pintadas com uma tinta vermelha em toda sua extensão. Essa tinta deve manter a rugosidade da via, para evitar acidentes, principalmente em dias de chuva”, afirma Moro. “Outra questão que falta no País são regras mais fortes voltadas ao ciclista. Nas ciclovias e ciclofaixas deve ter faróis e a ultrapassagem tem de ser evitada. Quem anda de bicicleta nas ruas também deve seguir as regras de trânsito”, reforça.
Equipamentos no ABC
Quatro cidades da região possuem espaços para uso de bicicletas. Ribeirão Pires oferece ciclofaixa destinada ao lazer e sinalizada aos domingos e feriados, das 7h às 16h, na avenida Prefeito Valdírio Prisco, na região central da cidade.
Em São Bernardo, a malha cicloviária possui 12,3 km de extensão e a cidade prevê a expansão das ciclovias e ciclofaixas, bem como novos bicicletários, previstos pelo plano municipal de mobilidade, que segue em tramitação.
Diadema possui ciclofaixas nas avenidas Ulysses Guimarães e Paranapanema, num total de 9 km, destinadas a lazer e mobilidade urbana. A cidade prevê a construção de mais de 100 km de ciclofaixa até 2023.
São Caetano possui 16,5 km de malha cicloviária, sendo 14 km de ciclofaixas e 2,5 km de ciclovias; e estuda a construção de um bicicletário.
Já Santo André possui 10 ciclovias, localizadas nas avenidas das Nações, Presidente Roosevelt, Lauro Gomes, Valdemar Mattei, Adriático, Guarará, estrada do Pedroso, praça 14 Bis, viaduto Salvador Arena e na UFABC (Universidade Federal do ABC), que totalizam mais 8,1 km; além de três ciclofaixas nas avenidas das Nações e Queirós dos Santos e UFABC, com extensão de mais de 4,2 km e dois trechos compartilhados pedestres-ciclistas (avenida Queirós dos Santos e UFABC), que totalizam 603 metros de percurso.
A cidade também conta com a ciclofaixa de lazer na avenida José Antônio de Almeida Amazonas, com funcionamento aos domingos e feriados, como extensão das atividades do Paço. O plano de mobilidade urbana da cidade prevê diretrizes para novos pontos e indução de uso da mobilidade ativa como política pública.
Até o fechamento desta matéria, Rio Grande da Serra e Mauá não enviaram informações.