
A ONG ABCDS (Ação Brotar pela Cidadania e Diversidade Sexual) está preocupada com o aumento dos casos de violência praticados por adeptos de um grupo que se autodenomina nacionalista. Integrantes desse grupo teriam praticado pelo menos três atos de violência contra pessoas trans dentro das composições da CPTM (Companhia Paulista de Trens Metropolitanos). O RD conseguiu falar com uma dessas vítimas que teme ser identificada por medo de ser alvo de novos ataques.
O presidente da ONG, Marcelo Gil, disse que se trata de um grupo de skinheads já conhecido, mas que agora está ressurgindo. “Esse é o grupo chamado de Carecas do ABC, que estava meio adormecido, mas agora está voltando com muita força. A técnica deles é assustar as pessoas agredindo verbalmente para ver se a pessoa reage. O pessoal desse grupo diz defender o que chamam de Brasil livre, são separatistas, dizem valorizar a família e os valores tradicionais. Eles atacam não apenas o público LGBTQIA+, mas também negros e migrantes, principalmente os nordestinos”, explica.
O último caso que a ONG tem notícia aconteceu no último dia 19, na linha 10 – Turquesa da CPTM quando uma mulher trans, que estava sentada em um dos vagões, foi abordada por um homem e duas mulheres. O homem usava calça estilo militar preta, coturnos, e uma camiseta com a bandeira do Brasil e machados cruzados. A vítima foi agredida com comentários transfóbicos e machistas ditos em tom de ameaça. Os ataques diretos à vítima foram ficando cada vez mais incisivos e violentos ao ponto do homem apertar a mão da vítima, que não reagiu nem respondeu aos insultos.
“Fizeram muitas piadinhas racistas, machistas sendo indiretamente transfóbicas. Ele começou a apertar minha mão muito forte e ficava perguntando o que eu pensava sobre Deus, o que eu pensava sobre homens. Eu estava com muito medo, porque eu já sei de que grupo eles são. Depois eu consegui sair e desembarquei na Estação Santo André. Depois quando eu entrei no ônibus senti uma picada na nádega, tinha uma agulha espetada em mim”, declarou a vítima à reportagem.
A Secretaria de Segurança Pública mantém um único setor destinado a investigar esse tipo de crime. A Decradi (Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância), que funciona na avenida Brigadeiro Tobias, 527, no bairro da Luz, em São Paulo. O RD pediu à secretaria levantamento de investigações sobre esse tipo de crime dentro das estações e trens da CPTM, mas o órgão do Estado sustenta que não tem como levantar informações sem o registro do boletim de ocorrência, que a vítima entrevistada não registrou.
Marcelo Gil diz que a ABCDS protocolou pedido de instalação de uma Decradi para atender a região, mas não recebeu resposta do pedido. Para denúncias a Ong disponibiliza um canal via WhatsApp, através do número 11-98567-5530, e a denúncia também pode ser feita pelo Instagram Ong ABCD´s e pela fanpage da entidade no Facebook.
Em nota, a CPTM informa que neste ano registrou dois casos de homofobia em suas estações e vagões de trens e que o caso da mulher trans vítima de agressão no dia 19/03 não está entre eles. “A companhia reforça que não tolera nenhum tipo de violência ou atos de discriminação racial ou preconceito em suas dependências, nos trens e estações. O caso citado pela reportagem não foi localizado nos registros da empresa. Por isso, mensagens sonoras nos trens e estações estimulam os passageiros a denunciarem sempre que presenciarem situações deste tipo. A companhia adota medidas para garantir a segurança de todos durante as viagens nos trens e estações, com o aprimoramento e monitoramento no sistema de segurança e treinamento das equipes de atendimento e segurança para garantir uma rede de apoio”, informa a companhia.
Ainda de acordo com a CPTM, além de campanhas e ações educativas, a segurança da companhia está atenta a esses e outros casos de violência. “Em evidências de ocorrências deste tipo, os envolvidos são conduzidos à autoridade policial e a equipe de atendimento oferece o devido acolhimento às vítimas. A central de monitoramento da segurança funciona 24h por dia, 7 dias por semana, controlando as câmeras nos trens e estações. Em caso de ocorrências, as pessoas podem acionar a equipe de segurança e também entrar em contato com a Central de Relacionamento 0800 055 0121”.
A vítima dos ataques do dia 19 diz que não anda mais de trem desde o ocorrido. Optou por fazer o seu trajeto entre Santo André e São Paulo de carro e que, por conta disso, tem gastado muito mais com o transporte.