Durante o período de isolamento social, a filial brasileira da farmacêutica sul-africana Aspen Pharma registrou aumento de quase 60% nas vendas de medicamentos para ansiedade e insônia. Embora as consultas presenciais da modalidade tenham reduzido na rede pública, a especialidade foi mais procurada nos últimos meses, segundo o psiquiatra Líbano Abiatar Csernik Monteiro. O médico afirma que, mesmo sem receita, pacientes têm adquirido medicações controladas, o que gera riscos à saúde.
De acordo com Monteiro, o aumento da venda de psicofármacos pode ter várias causas, como os atendimentos via telemedicina e prescrição à distância. “De fato, os psiquiatras no geral têm percebido maior procura por consultas nesse momento. Além disso, médicos de outras especialidades comumente prescrevem tratamentos dessa natureza”, diz.
O médico afirma que há pacientes que adquirem os medicamentos sem prescrição, prática perigosa. “Isso é muito comum, infelizmente, mesmo antes da pandemia. Com muita frequência ouço relatos dos próprios pacientes compraram medicações controladas sem receita ou usaram receitas falsificadas”, conta. Os riscos são grandes, pois podem provocar efeitos prejudiciais do ponto de vista físico e psíquico se não forem bem indicados os psicofármacos, de acordo com o psiquiatra.
Atendimentos
Na contramão dos registros de aumento nas vendas de psicofármacos, as prefeituras têm contabilizado variação de atendimentos psicológicos na rede. O fator responsável por isso foi a suspensão das consultas com especialidades, para evitar o colapso do sistema de saúde durante a pandemia da covid-19, que deu lugar à telemedicina.
Diadema registrou maior de procura por questões como ansiedade e violência doméstica. A população é atendida de maneira presencial e individual para avaliação e continuidade do cuidado em casos graves, visto que as UBSs (unidades básicas de saúde) mantiveram-se abertas. Já o monitoramento de pessoas que já passavam por tratamento, passou a ser feito via telefone ou WhatsApp.
De março a junho deste ano, foram realizados 1.540 atendimentos individuais com psicólogos na Atenção Básica. Nos CAPS (Centro de Atenção Psicossocial Álcool e outras Drogas), foram 2.325 atendimentos de psicólogos e psiquiatras no mesmo período. No Hospital Municipal, foram realizados 818 atendimentos por médicos psiquiatras. Em abril, a cidade iniciou m serviço de atendimento anônimo por telefone, onde os profissionais de saúde podem expressar suas demandas emocionais, e serem acolhidos por especialistas da área.
Mesmo sem o atendimento para todos, Santo André continuou a atender pacientes em casos mais graves de forma presencial. A cidade realizou 449 atendimentos individuais e 1.843 atendimentos coletivos em 2020 e 3.092 atendimentos individuais e 6.601 atendimentos coletivo em 2019. Em nota, a Prefeitura esclarece que os demais usuários continuaram a ser atendidos via Skype ou WhatsApp até mesmo com novos casos acolhidos, que foram registrados durante a pandemia.
A Prefeitura explica que todos os serviços de cuidado em saúde mental continuaram a funcionar normalmente., assim como as visitas domiciliares e Acolhimento Integral (internação).
Com números reduzidos, São Bernardo registrou entre março e maio 2.856 atendimentos psicológicos, contra 5.552 atendimentos no mesmo período de 2019. Já nos atendimentos psiquiátricos foram 6.462 pessoas nos três meses de 2019 e 3 605 pessoas no mesmo período de 2020.
Com a suspensão dos atendimentos presenciais até junho, feitos, até então, virtualmente, São Caetano atendeu de março a junho deste ano, 1.520 pacientes na ala psicológica e 3.481 na psiquiátrica, comparado a 4.022 e 3.488 realizados, respectivamente, no mesmo período em 2019. Apenas em junho as consultas passaram a ser feitas individualmente de forma presencial, e não mais em dupla ou grupo.
Outra cidade que registrou queda nos atendimentos foi Mauá, que diz ter realizado 1.128 atendimentos psicólogos entre março a julho de 2019, contra 395 atendimentos no mesmo período de 2020. Já nos atendimentos psiquiatras a cidade registrou 3.235 de março a julho de 2019 e 1.947 no mesmo período deste ano. Todos os atendimentos são pelo CAPS.
Em Ribeirão Pires, também houve queda nos atendimentos com psicólogos e psiquiatras, já que os CAPS, atendeu, ao todo, 3.389 adultos, 1.181 crianças, e 412 dependentes químicos em 2019. No mesmo período, em 2020, foram realizados apenas 1.718 atendimentos com adultos, 461 infantis e 375 de dependentes de álcool e drogas.
Espiritualidade como aliada
Para amenizar o estresse gerado pelo longo período de isolamento, o psiquiatra Líbano Abiatar Csernik Monteiro indica uma modalidade menos citada pelos especialistas, mas que considera eficaz. “A espiritualidade pode ser usada como estratégia de proteção à saúde mental durante a pandemia. A Associação Brasileira de Psiquiatria recomenda a espiritualidade como uma estratégia possível, e ressalta a importância de ser utilizada”, explica.
O médico diz que o fortalecimento das vivências com o sagrado e o transcendental são particulares e individuais para cada pessoa, e, no período atípico, pode trazer benefícios psicológicos sociais significativos. Além disso, o desenvolvimento de resiliência, de mecanismos de enfrentamento e de senso de propósito pode ser alcançado com a espiritualidade e religiosidade, de forma a proteger a saúde mental das pessoas, afirma. “Isso diminui a chance de desenvolver e de agravar transtornos mentais, o que já é bem consolidado pela ciência atual. Em suma, pode ser uma ferramenta de conforto e serenidade para muitas pessoas, aliada às estratégias habituais”, reitera. (Colaboraram Ingrid Santos e Fernando Scerveninas)