O governo do Estado não deu nenhuma informação sobre a ampliação de unidades de Delegacia de Defesa da Mulher (DDM) no ABC. Indagada pelo RD, a Secretaria de Segurança Pública, em nota, reafirma os planos do governador João Doria (PSDB) de ampliar o número das delegacias especializadas, mas não aponta a região. Baseada no déficit de policiais civis no ABC, que chega a 664, a delegada e presidente do Sindpesp (Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado de São Paulo), Raquel Kobashi Gallinati, acha difícil a ampliação do número de DDMs com serviço de qualidade sem a ampliação do efetivo de delegados, escrivães, investigadores, agentes policiais e outros cargos que compõem a carreira da Polícia Civil.
“A atitude do governador é política e baseada em marketing e não em critérios técnicos. Se temos um déficit de 14 mil policiais civis no Estado, e não há pessoal suficiente nem para manter as delegacias de bairro, é uma utopia pensar que, sem contratar mais gente, o governo conseguirá aumentar o número de delegacias da mulher. Pode até piorar a situação piorando ainda mais o déficit existente abrindo mais prédios”, analisa Raquel. Segundo a delegada, o último concurso público realizado para contratação de policiais civis foi há seis anos. Agora está em andamento novo concurso.
Enquanto não há aparelhamento no tipo de atendimento, os casos de violência doméstica só aumentam. Até abril, somente no ABC foram registrados pelo menos 7 casos de feminicídio. Não existe, porém, um número oficial da violência doméstica, pois a mulher pode ser vítima de vários tipos de violência: a física, psicológica ou financeira. A delegada Renata Cruppi, titular da DDM de Diadema, explica que a mesma mulher acaba sendo vítima várias vezes. “Não é porque ela gosta, é porque não consegue sair do ciclo da violência, muitas vezes não tem força de denunciar. Quando a gente divulga o que é a violência doméstica elas passam a procurar, por isso há um aumento de demanda”, relata.
A nota do governo diz que o Estado trabalha para ampliar o número de DDMs em todo o Estado. “Atualmente, o Estado conta com 133 DDMs, sendo 10 com atendimento 24 horas e assumiu o compromisso de transformar mais 30 unidades em atendimento ininterrupto até 2022. Além das especializadas, todas as delegacias de São Paulo são capacitadas para acolher as vítimas e registrar casos de violência contra a mulher. Todos os distritos adotam o Protocolo Único de Atendimento, que estabelece padrão para o acolhimento das vítimas. Além disso, os cursos de formação dos policiais, civis ou militares, contemplam disciplinas direcionadas ao tema”.
Nenhuma 24 horas
O ABC tem apenas quatro delegacias da mulher: em Diadema (rua Santa Rita de Cássia, 42 – telefone 4043-2856); São Bernardo (rua José Meza Mendonça, 40, Jardim do Mar – telefone: 4368-2032), Mauá (rua General Osório, 365, v. Bocaina – telefone 4514-1706) e em Santo André (praça Min. Salgado Filho, 674, v. Guiomar – telefone 4432-2379). Mas as quatro funcionam apenas de segunda a sexta, das 9h às 19h, período com menos ocorrências de violência contra a mulher. Já na Capital são nove DDMs, sete com funcionamento 24 horas.
Advogada diz que falta pessoal para atendimento
Para a advogada Maria Luiza Monteiro Canale, integrante da Frente Regional de Enfrentamento à Violência contra a Mulher, e também membro do grupo Promotoras Legais Populares de Santo André, há empenho grande das delegadas e equipes, o problema é a falta de pessoal. “As mesas da delegada titular e da assistente estão sempre assoberbadas de processos. Elas são competentes, mas têm limitações pela falta de equipe. A DDM de Santo André tem apenas uma escrivã, faltam funcionários para dar informações e fazer triagem no atendimento, pois as mulheres pegam uma senha e ficam horas esperando”, relata.
Por isso, por meio da Proleg, foi criada a DDMAmiga, serviço de acolhimento com amparo no trabalho de Maria Luiza e de mais uma psicóloga. “As mulheres que chegam a uma delegacia precisam de informação sobre leis, encaminhamento e medidas protetivas, pois elas sofreram violência física, sexual, psicológica e patrimonial, imagine como ela está psicologicamente, e é esse o trabalho que fazemos, mas só temos como fazer isso uma vez por semana, porque somos apenas duas voluntárias”, lamenta.
A advogada avalia que não adianta criar novas delegacias sem pessoal novo. “Se criar vai apenas dividir o efetivo e desfalcar ainda mais as que funcionam”, diz. A delegada de Diadema acrescenta que há carência também de serviços complementares de apoio 24 horas. “Não adianta o atendimento durante a madrugada se eu não tenho para onde encaminhar a mulher. Essa cobrança por DDMs 24 horas é justa, mas ela tem de vir junto com uma rede de proteção com funcionamento ininterrupto também”, completa.