Pouco mais de 100 dias de governo do prefeito de São Bernardo, Orlando Morando (PSDB), o setor cultural ainda não respira. Com problemas que vieram da administração do antecessor Luiz Marinho (PT), equipamentos como Clac (Centro Livre de Artes Cênicas), CaJuv (Coordenadoria de Ações para Juventude) e CAV (Centro Audiovisual) as aulas não começaram, com isso estão atrasadas há três meses.
Nesta segunda-feira (10), o Repórter Diário foi ao Clac com portões fechados, assim como as portas dos quatro salas e mais o palco, onde deveriam funcionar cursos de formação em teatro e dança. A atividade mais recente no local ocorreu no fim de semana, com a pintura de paredes do prédio, que passou do vermelho, cor predominante do PT de Marinho, para o azul, usada pelo PSDB de Morando.
Há três meses sem aula no Clac, a aluna Melissa Suarez, 38 anos, lamenta ouvir dos gestores públicos que a Cultura é uma responsabilidade secundária, apesar de sua tarefa social de incluir jovens ao meio artístico, em vez da criminalidade e do abandono, por exemplo. “Cultura não é [apenas] evento, é formação. O que parece é que essa Administração entende cultura apenas como shows na cidade, mas Cultura é contínuo, alia-se à Educação”, pondera.
No começo do ano, o Clac recebeu a visita do vice-prefeito Marcelo Lima (SD) e do vereador governista Toninho Tavares (PSDB). Em um áudio gravado no local, o número dois do Paço supostamente teria sugerido que o espaço fosse comandado por uma organização não-governamental, a fim de oferecer cursos gratuitos, embora o equipamento nunca tenha cobrado valor algum aos alunos. Pelas falas, ficou claro o objetivo de eliminar os custos ao governo.
Ao RD, o vice-prefeito confirma que esteve no Clac, embora atenue o conteúdo do áudio. “Essa discussão tem de ser feita com o diretor de Cultura [Adalberto José Guazzelli]. Apenas olhei as pichações no lado de fora, pois por dentro, é um prédio bonito. Os professores estavam preocupados [com a situação do Clac] e falei o que pensava, mas não que seja ideia da administração”, pontua.
Os alunos do Clac afirmam que o governo tucano cortou o investimento previsto ao equipamento de cerca de R$ 400 mil para aproximadamente R$ 160 mil por ano. Indagada pelo RD, a Prefeitura de São Bernardo não confirma e nem desmente a informação. Do Orçamento em 2017, de R$ 5,3 bilhões, apenas R$ 26,6 milhões eram destinados para Cultura, o que representa percentual 0,56%. No entanto, o Paço estima que a arrecadação deste exercício não ultrapassará R$ 3,3 bilhões.
Empurra-empurra
O governo Morando culpa Luiz Marinho pela interrupção do curso, por não realizar o edital de convocação dos professores do Clac. Pela página oficial do Facebook, publicada no dia 20 de março, a Prefeitura de São Bernardo ratifica que até a próxima semana, publicará a grade de aulas e convocação dos professores.
O ex-secretário-adjunto de Cultura da gestão passada Evandro de Lima, justifica a contratação não sair no governo petista e repassa a responsabilidade na administração tucana. “Decidimos não fazer o edital em dezembro, porque estávamos encerrando o governo. E se o governo Morando não quisesse fazer essa política de governo? Iriam falar que estávamos forçando uma situação. O novo governo deveria lançar o edital em janeiro, e março ou abril estariam contratados os professores”, retruca.
Faltam monitores e guarda municipal no CaJuv
Com status de secretaria, o CaJuv (Coordenadoria de Ações para Juventude) deve ser incorporado à Secretaria de Esporte e Lazer, gerida pelo vereador licenciado Alex Mognon (PSDB) a partir da reforma administrativa da Prefeitura. O espaço foi inaugurado em 1998, pelo ex-prefeito Maurício Soares (PHS), hoje responsável pela Pasta de Desenvolvimento Social e Cidadania.
O CaJuv é uma rota usada por muitos jovens que buscam inserção no meio artístico e esportivo, que funciona como recurso contra criminalidade. Hoje, porém, o local segue sem nenhuma perspectiva de quando o governo contratará monitores para retomada das aulas de circo, teatro, dança, música, produção cinematográfica e fotografia.
Hoje aluna do Clac, Mariana Carvalho, 25 anos, passou quase uma década no CaJuv, que a inseriu no meio artístico. “O que mais me chateou foi a situação do CaJuv, do que o próprio Clac, pois é um lugar que dá uma instigada cultural. E hoje olho para os jovens e me pergunto onde eles estarão se não estiverem aqui. Além de toda história lá no circo. São 15 anos de história”, lamenta.
O CaJuv não está apenas sem os cursos. Sem a presença da GCM (Guarda Civil Municipal), a administração do espaço é obrigada a fechar as portas às 17h. Enquanto o local não forma novos jovens no meio cultural, a sua tutela é disputada internamente na Prefeitura, já que Soares queria incorporá-lo à Secretaria de Desenvolvimento Social, mas as informações do Paço sinalizam sua transferência para Esporte.
Burocracia deixa CAV parado
Enquanto isso, o CAV segue esperando pela concretização de promessas do governo Morando, após o rompimento com a Telem S.A., concessionária antes responsável pela revitalização do Pavilhão Vera Cruz e pelo Núcleo de Formação Audiovisual. O governo chegou a estimar as aulas para maio, porém burocracias, como convocação de professores e falta de projeto claro ao público sobre o curso, podem transferir a projeção de retomada das atividades ao segundo semestre.
Movimentos culturais que representam alunos desses equipamentos tentam, sem sucesso, audiência com diretor de Departamento de Ação Artística e Cultura, Pedro Serra, irmão do prefeito de Santo André, Paulinho Serra (PSDB). Também houve busca de diálogo com a secretária de Educação, Suzana Dechechi. A Pasta deve ter o setor de Cultura incorporado aos seus quadros após a reforma administrativa, prevista para ser votada na Câmara dos Vereadores até o fim do semestre.
Marcar uma reunião no Parlamento para discutir a atual situação da Cultura também não é fácil. Em uma reunião realizada no plenarinho da Casa, na noite do dia 7, apenas a vereadora Ana Nice (PT) compareceu. Um dos motivos para o esvaziamento foi a reinauguração do acesso da avenida Aldino Pinotti, no Centro, com a presença do prefeito e de vereadores da base.