Internação involuntária para dependentes químicos divide opiniões

O anúncio, no entanto, divide a opinião de especialistas de Saúde, profissionais de Direito e familiares.

No último dia 3, o governador Geraldo Alckmin (PSDB) anunciou a implantação do sistema de internação involuntária de dependentes químicos em estado grave. A medida, que deveria ser colocada em prática duas semanas após o anúncio, prevê a criação de equipes compostas por médicos, promotores e juízes, que avaliarão as condições do paciente e informar a necessidade ou não de internação do viciado.

O anúncio, no entanto, divide a opinião de especialistas de Saúde, profissionais de Direito e familiares. O secretário de Saúde de São Bernardo, Arthur Chioro, é contra o projeto. “É uma medida para fingir que o problema não existe, porque internar obrigatoriamente não resolve nada. Não se resolve o problema trancando as pessoas. Quando ela retornar ao convívio social, depois de seis meses, ela vai voltar para os mesmos amigos e mesmos traficantes”, acredita.

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O secretário de Saúde defende um acompanhamento mais presente no cotidiano do paciente, pois a recuperação, segundo ele, vem por meio da construção de um projeto de vida. Além do tratamento, Chioro defende a prevenção por meio de orientação aos jovens e também o trabalho nas comunidades, a fim de envolver também as famílias no processo de recuperação.

Favorável ao projeto, o presidente da OAB de São Caetano, Adilson Paulo Dias, explica que a medida será voltada apenas para as pessoas sem condições de manifestar vontade própria, por conta do uso abusivo de substâncias químicas. “Depende muito da pessoa que vai ser internada. A internação vai ser daquela pessoa que não tem condição de manifestar a vontade dela. São aquelas pessoas que estão com estágio muito avançado da doença”, diz.

Dias afirma que até o momento ainda não houve movimentação na sede e também nas outras subseccionais da Ordem em relação à implantação da internação à força. “Esse trabalho é mais específico na Cracolândia, em São Paulo, pois aqui em São Caetano não temos um grande número de pessoas nestas condições”, ressalta.

Arthur Guerra de Andrade, presidente-executivo do CISA (Centro de Informações sobre Saúde e Álcool) e professor da FMABC (Faculdade de Medicina do ABC), afirma que o Brasil está atrasado no quesito em relação a diversos países, que já adotam a prática de internação à força de viciados em estado grave.

Brasil atrasado

“De forma geral, a internação involuntária é um procedimento médico realizada no mundo todo há muitos anos que obedece a critérios super objetivos. A visão médica não vai deixar esse paciente se matar. O médico, no mundo todo, não acha que é um direito do ser humano se matar, pois entende que esse paciente está doente e tem de ser internado. Depois daquele momento de fissura e excesso, quando estiver recuperado, o paciente vai dizer: ‘ Obrigado, doutor”, defende Andrade, ao afirmar que a internação à força é um procedimento de emergência frente à situação gravíssima.

A internação involuntária é o maior desejo da dona de casa Sonia de Toledo, que sofre com o vício do filho de 27 anos, em Santo André. Além do uso abusivo do crack, o rapaz sofre de esquizofrenia e, quando faz uso da droga, permanece desaparecido por dias – situação que levou a dona de casa a amarrá-lo a uma barra de ferro, neste mês de janeiro, diante da negativa dos profissionais da rede pública em internar compulsoriamente o jovem.

“Esse negócio de querer ser internado não tem cabimento, porque a pessoa doente não tem discernimento para saber o que é melhor. Ela só quer saber de droga, droga e droga. O viciado não está em condições de querer ou não querer. Se meu filho estivesse bem, ele não iria pra rua, ficar na chuva para ser maltratado e judiado pelos outros”, argumenta a mãe.

Clínica particular não sai por menos de R$ 3 mil

O ABC tem pouquíssimas opções de clínicas terapêuticas para tratamento de dependentes químicos, cuja internação não sai por menos de R$ 3 mil. Duas delas são a Bezerra de Meneses e Recanto do Riacho, ambas em São Bernardo. Mesmo assim, o vendedor J.S.D. está à procura de um segundo lugar que possa ajudar a recuperação de sua esposa alcoólatra, diz que. “ Essas aí não saem por menos de R$ 4 mil, na verdade”, afirma.

Inacessível para a maioria das famílias com dependentes de drogas e álcool, o que faz com que estas clínicas sejam tão caras é, além do confinamento, a presença de um psiquiatra e de um médico.

Uma alternativa mais econômica é a internação em clínicas terapêuticas, que são coordenadas por profissionais de atendimento psicossocial. “Nestes casos é possível encontrar mensalidades a partir de R$ 1 mil”, diz o vendedor.

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