Caso Celso Daniel: 10 anos, oito mortes e uma dúvida

Morte de ex-prefeito andreense completa 10 anos

Nesta sexta-feira (20) a morte de Celso Daniel completa 10 anos. Uma década depois, a dúvida permanece. Afinal, o petista foi alvo de um crime de mando ou vítima da violência urbana? Além do próprio prefeito, sete pessoas ligadas ao caso – entre testemunhas e acusados de participação no crime – morreram neste período. Celso Daniel foi encontrado morto numa estrada de terra em Juquitiba, interior paulista, crivado por oito tiros, após dois dias de sequestro.

O caso já foi reaberto duas vezes, sendo alvo de investigações do Ministério Público, Polícia Civil e até da CPI dos Bingos, em Brasília. Segundo o Ministério Público, Daniel foi vítima de crime de mando, encomendado pelo amigo e ex-segurança Sérgio Gomes da Silva. Os promotores defendem que ele teria descoberto um esquema de corrupção na Prefeitura para financiar campanhas do PT e que o sequestro teria sido simulado.

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Já a polícia afirma que houve crime comum. Dos oito acusados pelo Ministério Público, somente Marcos Bispo dos Santos foi julgado e condenado, em 2010, a 18 anos de prisão. A maior expectativa, este ano, é a realização do júri popular de Sérgio Gomes – também conhecido como Sombra – previsto para ocorrer até o fim do ano.

Mais sete mortos

A lista de mortos ligados ao caso impressiona. Além do próprio Celso, mais sete pessoas morreram. O garçom Antônio Palácio de Oliveira, que serviu o prefeito e Sérgio Sombra no restaurante Rubaiyat, em 18 de janeiro de 2002, noite do sequestro, foi assassinado em fevereiro de 2003.

Vinte dias depois da morte de Oliveira, Paulo Henrique Brito, única testemunha desse assassinato, foi morto com um tiro nas costas. Em dezembro de 2003, o agente funerário Iran Moraes Rédua foi assassinado com dois tiros quando estava trabalhando. Rédua foi a primeira pessoa que reconheceu o corpo de Daniel na estrada de terra e chamou a polícia. Dionízio Severo, detento apontado pelo MP como o elo entre Sérgio Gomes, acusado de ser o mandante do crime, e a quadrilha que matou o prefeito, foi assassinado na cadeia, na frente do próprio advogado.

O homem que o abrigou no período em que a operação teria sido organizada, Sérgio Orelha, também foi assassinado. Outro preso, Airton Feitosa, disse que Severo lhe relatou ter conhecimento do esquema para matar Celso e que um ‘amigo’ (de Celso) seria o responsável por atrair o prefeito para uma armadilha. Otávio Mercier, investigador que ligou para Severo, foi morto em julho de 2003. O último da lista foi o legista Carlos Delmonte Printes – encontrado morto em 12 de outubro de 2005 – que constatou, na época, que o petista havia sido torturado.

Promotor acredita em ‘outros’ mandantes

O promotor do Ministério Público, Roberto Wider Filho, revelou nesta quinta-feira (19), que acredita na existência de outros participantes na morte do ex-prefeito de Santo André, mas que ainda continuam no obscurantismo. “Eu mesmo, até o momento em que eu era responsável pelas investigações, tinha novas diligências para fazer. Acredito que nem todos os responsáveis pela morte foram identificados. Eu acredito que existem outros executores e outros mandantes do crime”, disse Wider.

Segundo ele, deveriam ter “mais diligências até a identificação de todos”. “Nada impede que mesmo depois do julgamento do Sérgio, com novas provas, possamos identificar outras pessoas. Dentre os mandantes é possível que tenham pessoas da classe política”, destaca o promotor. Wider, Amaro Thomé e José Reynaldo Guimarães Carneiro foram os promotores de Justiça que protagonizaram a tese que define o crime como de mando, uma morte encomendada. (LA)

Demora no Judiciário é questionada

O caso emblemático foi desdobrado em duas linhas de investigação: uma sobre o esquema de corrupção no Paço e o outro propriamente sobre a morte de Daniel. O primeiro processo corre o risco de ser prescrito este ano, caso não haja modificações e nem ganhe agilidade nas investigações. Já a morte do petista, por se tratar de homicídio, será prescrita depois de 20 anos.

“A demora é injustificável. Ela decorre de vários episódios pequenos. Um deles foi uma greve de cinco meses dos funcionários do Judiciário. Outro foi a substituição de juízes na Vara. O novo juiz que assume tem de estudar todo o processo. Mas nada justifica um prazo tão longo para solução desses processos”, explica Wider. O processo do homicídio tem mais de 100 volumes e o da corrupção 60 volumes.

O promotor – que não está mais debruçado sobre o processo, agora nas mãos de Francisco Cembraneli (conhecido pelo caso Isabela Nardoni) – ressalta que mesmo neste momento em que a morte completa 10 anos, será difícil comover o Judiciário no intuito de dar celeridade ao caso.

“Em diversos momentos do processo houve repercussão como o ‘investigar é preciso’. O Sérgio Gomes da Silva está solto por medida liminar do presidente do Supremo que, na época, era o Nelson Jobim. Até hoje não houve julgamento desse processo. Vários movimentos foram feitos para que essa ação fosse julgada. O Judiciário não se comove com a opinião pública neste aspecto de dar celeridade”, diz Wider. (LA)


Mortes supostamente ligadas ao assassinato

Celso Daniel: prefeito. Assassinado em janeiro de 2002
Antonio Palacio de Oliveira: garçom. Assassinado em fevereiro de 2003
Paulo Henrique Brito: testemunha da morte do garçom. Assassinado em março de 2003
Iran Moraes Rédua: reconheceu o corpo de Daniel. Assassinado em dezembro de 2003
Dionizio Severo: suposto elo entre quadrilha e Sombra. Assassinado em abril de 2002
Sérgio Orelha: amigo de Severo. Assassinado em 2002
Otávio Mercier: investigador que ligou para Severo. Morto em julho de 2003.
Carlos Delmonte Printes: legista encontrado morto em 12 de outubro de 2005.
 

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