Os dados cadastrais e assinaturas de milhares de clientes da agência do Banco Mercantil do Centro de Diadema foram, literalmente, expostos em plena rua. Na segunda-feira (21/10) populares fizeram imagens de dezenas de sacos de lixo colocados na calçada e repletos de fichas cadastrais de clientes, que contam com dados confidenciais dos correntistas. Para especialistas em direito e em segurança digital, o flagrante fere a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e também pode configurar crime. O banco diz que apura o fato.
Os sacos de lixo colocados na calçada tinham fichas cadastrais, aquelas que o cliente assina três vezes para comparação de assinaturas e outros dados. A internauta que publicou o vídeo na internet não escondeu indignação com o fato. A publicação viralizou e a subseção local da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) tomou conhecimento. O presidente Renato Moreira Figueiredo e a vice Priscila Dias Modesto foram até a agência pedir esclarecimentos.
“Estamos aguardando uma resposta formal do banco. Depois vamos oficiar o Mercantil e comunicar as autoridades, como o Banco Central, por exemplo. Avaliamos se é caso de uma Ação Civil Pública, pois quando o banco não protege o sigilo dos dados de seus clientes, ele os coloca em vulnerabilidade. A situação ainda pode ser considerada crime contra a proteção de sigilo bancário, já que o banco é responsável pela guarda desses documentos. A lei complementar 105/2021 trata do sigilo das operações financeiras”, explica Figueiredo em entrevista ao RD.
A lei citada pelo presidente da OAB prevê multa e cadeia para que expuser indevidamente os dados sigilosos. “A quebra de sigilo, fora das hipóteses autorizadas nesta Lei Complementar, constitui crime e sujeita os responsáveis à pena de reclusão, de um a quatro anos, e multa, aplicando-se, no que couber, o Código Penal, sem prejuízo de outras sanções cabíveis”, diz o artigo 10 da lei complementar.
Crime
Para o advogado especialista em direito digital, Luiz Augusto D´Urso, a situação pode ser considerada um crime. “Não há dúvida nenhuma que essa conduta, se foi realizada pelo banco com os dados pessoais dos seus consumidores fere a LGPD. Caso seja comprovado que essa documentação foi jogada ali por um funcionário ou pelo banco, poderá haver, além da Lei Geral de Proteção de Dados, um crime, como o de divulgação de segredo e crime de violação de segredo profissional”, avalia.
O presidente do Sindicato dos Bancários do ABC, Gheorge Vitti, obteve a informação de que a agência da avenida Antônio Piranga, que teria deixado os sacos com a documentação na calçada, vai fechar. O Mercantil tem outra agência também no Centro, que fica na avenida Nossa Senhora das Vitórias. “Pelo que soubemos do próprio departamento de recursos humanos do Mercantil, aquela agência vai fechar, mas nos garantiram que os funcionários não vão perder o emprego e serão remanejados”, disse.
O sindicalista disse que a maior parte da carteira de clientes do Mercantil é formada por pessoas que recebem benefícios do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), como aposentadorias e benefícios pagos pelo instituto a pessoas afastadas do trabalho e ainda benefícios sociais, como os de prestação continuada para deficientes e pessoas hipossuficientes.
Fere a LGPD
Vitti também ficou indignado com a exposição dos dados dos correntistas do banco. “Isso claramente fere a LGPD e tem que ser apurado; o Ministério Público pode agir imediatamente independente de representação, mas o que vamos lamentar é que não vai ser um CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica), ou seja, o banco, a ser responsabilizado, vai sobrar para um funcionário que poderia estar apenas cumprindo ordens”, comentou.
Em nota, o banco resumiu a situação em uma curta nota. “O Banco Mercantil lamenta o ocorrido e informa que está apurando o fato para tomar as providências necessárias para preservar a segurança dos clientes e garantir que o fato não se repita. A instituição segue rigorosamente todos os normativos relacionados à Lei de Proteção de Dados e o procedimento de descarte de documentos é regido por política interna, reforçada em treinamentos anuais obrigatórios para todos os empregados – que são orientados a fragmentar qualquer documento impresso ou manuscrito que contenha informações pessoais”, diz o comunicado.
A nota do Mercantil não respondeu questionamentos feitos pelo RD, tais como se o material foi recolhido de volta para a agência ou se foi levado pela coleta de lixo; nem avaliou se a conduta dos funcionários foi correta e nem se os clientes que se sentirem prejudicados terão algum amparo. O Banco Central foi procurado para comentar o assunto, mas não se manifestou até o fechamento desta reportagem.
Veja abaixo o vídeo cedido pela rede social Diadema Problema: