Segundo a Organização Mundial de Saúde, a catarata é responsável por metade dos casos de cegueira reversível no mundo, o que representa cerca de 20 milhões de pessoas. No País, surgem cerca de 550 mil novos registros por ano, de acordo com a Sociedade Brasileira de Oftalmologia. No ABC quem precisa de cirurgia encontra atendimento nas prefeituras que fazem o procedimento ou encaminham para o SUS (Sistema Único de Saúde). O tamanho da fila é desconhecido, mas quem está na fila relata drama de muito tempo de espera.
Oftalmologista ouvido pelo RD conta que os pacientes com catarata são cada vez mais jovens e a doença cresce nos centros urbanos, como o ABC, devido a uma vida mais estressante.
A moradora de Diadema, Terezinha Ferreira Gonçalves Apolo, de 69 anos, está com catarata e possível glaucoma. Terezinha conta que tem o diagnóstico com indicação para cirurgia há quase dois anos. A notícia de que estava com a doença recebeu na UBS (Unidade Básica de Saúde) da Vila Conceição, onde foi encaminhada para o Quarteirão da Saúde, mas até agora aguarda com ansiedade pela cirurgia. “Já tiveram mutirões de cirurgia, eu não fui chamada. O meu marido operou há dois anos no AME (Ambulatório Médico de Especialidades), vinculado ao Estado, e foi tudo bem. Não sei por que comigo demora tanto”, relata.
A doença atrapalha a vida da moradora de Diadema até nas situações mais simples. Terezinha relata o medo de quedas em casa e já não sai mais sozinha. “Eu não consigo nem ler o itinerário do ônibus. Para ler algum papel eu tenho de tampar um olho, pois só consigo ler com o direito, o olho esquerdo não vejo nada, tudo embaçado para perto e para longe”, completa.
Quarteirão da Saúde
A Prefeitura de Diadema aponta que os casos são atendidos no Centro de Especialidades Quarteirão da Saúde e também são encaminhados casos para hospitais do Estado. “O município conta com o Centro de Especialidades Quarteirão da Saúde Engenheiro Osvaldo Misso, que absorve grande parte da demanda oftalmológica da população e realiza cirurgias de catarata. É preciso ressaltar que procedimentos de alta complexidade, como as cirurgias, são realizados em âmbito estadual dentro da estrutura do Sistema Único de Saúde (SUS) e, assim, também há encaminhamento para serviços de referência”, diz a nota do município sem explicar a demora no atendimento da moradora.
Para Renato Leça, professor da disciplina de Oftalmologia do Centro Universitário FMABC (Faculdade de Medicina do ABC), a catarata está ligada ao envelhecimento, quando o cristalino, que é uma lente intraocular, começa a ficar mais amarelado, menos transparente. O médico explica que outros fatores podem contribuir para o surgimento da catarata, como o diabetes ou um traumatismo. “A catarata é progressiva, mas seu avanço depende da pessoa. Hoje em dia, como a cirurgia está muito evoluída e o resultado é muito bom, quando a pessoa apresenta uma catarata até no nível inicial já se encaminha para a cirurgia para que a pessoa retorne a sua visão perfeita”, explica.
A tecnologia envolvida na cirurgia faz com que o procedimento seja rápido e eficaz com boa recuperação do paciente. “A cirurgia de catarata é a mais feita no mundo, os resultados são muito bons pela alta tecnologia utilizada. O SUS cobre todo o procedimento, tanto que aqui na FMABC a gente opera bastante casos de catarata, é uma cirurgia para o paciente bastante simples, com anestesia local e termina já vai para casa”, diz Leça.
Aumento
A fila, segundo o especialista, é grande pois a catarata tem sido uma doença comum. “É comum que as prefeituras façam mutirões e até aqui na FMABC também são feitos, isso ocorre porque a fila é muito grande. As pessoas de mais idade têm mais chance, então os mutirões são feitos para reduzir essa fila”, diz.
Renato Leça percebe que o número de casos tem aumentado. “Pela minha experiência vejo que tem crescido sim. A gente tem visto mais casos entre os mais jovens. Chama atenção é ver a catarata em pessoas de 50 anos ou menos, o que era bem incomum antigamente. Nós temos operado até em casos de início da doença, por isso que também temos um volume maior de cirurgias”, acredita.
O oftalmologista da FMABC avalia que as condições locais também podem contribuir para o surgimento da catarata. O ABC, na opinião de Leça, entra no contexto das regiões metropolitanas com cidades grandes, competitividade e muito movimento de pessoas que geram estresse. “O que mais pode contribuir com a catarata, em cidades grandes como as do ABC, seria o estresse, por isso que a gente vê a doença em pessoas mais jovens hoje em dia. Imagina-se que isso ocorra pelo estresse oxidativo que vai acabar lesando várias partes do corpo, inclusive gerando a catarata”, avalia.
Início
O principal sintoma da catarata é quando o paciente começa a ter um embaçamento da visão para longe. Esse é o momento de procurar um oftalmologista. “O profissional vai ver se é apenas trocar o grau do óculos ou se tem algum outro problema. O sinal que pode levar o paciente a suspeitar que está com catarata é a baixa de visão, especialmente nas pessoas com mais idade. Pode ser simplesmente o grau, então tem de passar por um oftalmologista para avaliação. Se for caso de cirurgia, o resultado é muito bom”, completa Renato Leça. No limite, a catarata pode levar a cegueira.
Cidades
As prefeituras da região apontam atendimento à demanda em seus próprios equipamentos ou encaminhamento para atendimento especializado na FMABC ou em hospitais estaduais de referência.
Rio Grande da Serra encaminha para o AME de Santo André. Já a Prefeitura de São Bernardo envia para a FMABC. “A Prefeitura de São Bernardo informa que as cirurgias de catarata do município são realizadas na Faculdade de Medicina do ABC – Fundação do ABC, por meio de contrato de prestação de serviço. São realizados, em média, 80 procedimentos por mês”, informa em nota.
São Caetano realiza as cirurgias na própria rede. Cerca de 100 cirurgias são feitas por mês e o município informa que não há fila, apenas o tempo de espera entre a recuperação de um olho para a cirurgia do outro, o que leva, em média, 30 dias.
Santo André também diz que o tempo de espera não ultrapassa 30 dias. O Poupatempo da Saúde é onde os procedimentos são realizados, e são, em média, 400 por mês. Em nota, o município informa que não há mutirões programados porque os atendimentos atendem a demanda. “Temos 198 pacientes em processo de agendamento da cirurgia, que serão realizadas no próximo mês. Portanto, não temos fila superior a 30 dias”, informa. As cidades de Ribeirão Pires e Mauá não responderam.
Mutirões
No ano passado, em apenas um mutirão de cirurgias o AME (Ambulatório Médico de Especialidades) de Mauá, gerenciado pela Fundação do ABC, realizou 646 cirurgias de catarata só entre novembro e dezembro. O AME de Santo André, também administrado pela FUABC, iniciou neste mês uma força-tarefa de cirurgias de catarata. O cronograma contempla o atendimento de 1.200 pacientes entre agosto e novembro. A iniciativa tem como objetivo reduzir o tempo de espera dos pacientes diagnosticados com catarata que estão inseridos no Sistema Informatizado de Regulação do Estado de São Paulo (Siresp) no aguardo por tratamento cirúrgico na unidade.