
Que a sensação de insegurança está cada vez maior é fato. Diariamente novas notícias de crimes e imagens de flagrantes violentos trazem ainda mais medo para a população, mas onde é mais ou menos seguro? Os números oficiais da Secretaria de Segurança Pública mostram que a área do 2° Distrito Policial de Mauá, no Parque das Américas, teve o maior crescimento de roubos e furtos na região, se comparado o período de janeiro a julho de 2022 com o mesmo deste ano, uma alta de 21,15%. Em segundo lugar, com alta de 16,91%, vem a 4ª Delegacia de Santo André, Vila Guiomar, e depois o 1° DP de Mauá, com acréscimo de 16,42% nos crimes contra o patrimônio.
Os crimes na região do Parque das Américas e bairros vizinhos passaram de 799 registros nos primeiros sete meses de 2022 para 968 no mesmo período deste ano. Na delegacia da Vila Guiomar foram 1.839 casos em 2022 e 2.150 neste ano. A delegacia que atende o Centro de Mauá e bairros do entorno teve 1.961 registros de roubos e furtos no ano passado e neste foram 2.283. O RD usou os números oficiais da Secretaria de Segurança Pública, uma soma do total de roubos aos furtos e furtos de veículos. (Veja quadro abaixo).
Se por um lado duas delegacias de Mauá ocupam o primeiro e o terceiro lugares de altas entre as 25 delegacias de área no ABC, é também em Mauá que está a delegacia que teve o menor crescimento dos crimes patrimoniais. O 4° DP no Jardim Zaíra, uma das regiões mais populosas e e onde se encontram bolsões de pobreza, foi o que teve a maior redução de roubos e furtos da região; queda de 26,37%. Em 2022, entre janeiro e julho, foram 637 boletins de ocorrência, contra 469 neste ano considerando o mesmo período.
Completam a lista das maiores reduções em roubos e furtos o 2° Distrito Policial de São Bernardo, cuja área de atuação pega todo o bairro do Rudge Ramos e que teve queda de 17% (de 1.376 registros para 1.142), e o 2° DP de São Caetano, com redução de 15,87% (de 649 para 546 casos).
Efeito contrário
Para o professor de Direito e coordenador do Observatório de Segurança Pública da USCS (Universidade Municipal de São Caetano do Sul), David Pimentel Barbosa de Siena, os crimes em que os bens são subtraídos das vítimas, como nos roubos e furtos, estão cada vez mais presentes nos bairros mais pobres, ou seja, nas periferias, onde as pessoas são mais humildes e têm menos posses, se esperaria que elas estariam livres de roubos e furtos, porém o que ocorre é exatamente o contrário.
“Toda cidade tem os pontos quentes, onde se concentra a criminalidade que não ocorre em nenhuma cidade de forma homogênea, a depender do tipo de delito ele se concentra em determinados pontos da cidade”, explica o especialista em segurança, também delegado de polícia e que já atuou em diversos distritos do ABC.
Segundo Siena, para entender como o crime se distribui nas cidades, primeiro é preciso entender como é a formação da área de determinada delegacia. Os distritos são criados por decreto e correspondem às circunscrições das delegacias. “Eles compreendem áreas heterogêneas do ponto de vista socioeconômico. Pegamos, como exemplo ,o 4° DP de Santo André, que abrange toda a parte dos bairros Jardim e Campestre, bairros de classe média alta e alta, mas também pega a parte mais pobre da cidade como o núcleos Tamarutaca e Palmares. Temos que ter em mente que os distritos são heterogêneas. O mesmo vale para o 1° DP de Mauá, onde se tem uma parte de renda maior, como nos bairros da Vila Bocaina e o próprio Centro, mas vai chegando mais perto da divisa de área, já se encontram áreas mais pobres. A gente tem essa heterogeneidade, onde não vai ter isso é, no 2°DP de São Bernardo, que em uma área muito pequena que praticamente compreende só o Rudge Ramos mesmo, que é um bairro de classe média. E São Caetano também foge da regra da heterogeneidade”, detalha.

Na opinião do professor, uma hipótese para essas variações pode ser a heterogeneidade, porque as áreas dos distritos compreendem bairros muito ricos e outros muito pobres e como têm aumentado os roubos e furtos nos mais pobres vai ter esse aumento. “A única exceção seria o Zaíra, um bairro mais periférico, que seria um caso à parte para aprofundar e ver o que está acontecendo nele”, diz Siena.
Celular é o objeto de desejo e explica fenômeno
De acordo com o coordenador do Observatório da USCS, não há dúvida que a maioria dos casos registrados nas delegacias de crimes contra o patrimônio está relacionada à subtração de celulares. Isso porque todos, ricos ou pobres, têm o aparelho que há muito deixou de ser apenas um meio de comunicação para concentrar operações de compras, de crédito e de transferência de valores.
Siena diz que os roubos estão crescendo sim, isso é inegável. Afirma que essa é a grande marca de 2023, porém esse aumento de roubos e furtos não é exclusividade do ABC, porque em todo o Estado tem esse aumento, sobretudo de celulares. Esses aumentos são mais vistos nas regiões mais pobres das cidades. “Esse é um fenômeno que a gente tem observado em toda a Grande São Paulo há bastante tempo, percebemos que os crimes contra o patrimônio se concentram nas regiões mais pobres e periféricas”, diz.
Para Siena, nos bairros mais ricos, onde os moradores investem mais em segurança, as casas e prédios têm controle de vigilância, maior policiamento, os moradores não usam transporte público e não ficam expostos em pontos de ônibus, são regiões menos suscetíveis. Já na periferia é justamente o oposto, as pessoas estão mais nas ruas, usam transporte público e saem cedo para trabalhar. “Têm muitos casos em que os roubos se dão nesse horário, no início da manhã, quando o pessoal está no ponto de ônibus. O objeto de predileção dos bandidos é o celular, um objeto que é pequeno, fácil de ser transportado, é valioso, tem liquidez, pois se consegue fazer dinheiro rapidamente com ele e hoje todos têm, independente da classe social, por isso o roubo se transferiu para as classes mais pobres. Lá atrás o pobre estava mais suscetível aos crimes contra a vida, os homicídios, e isso continua, e a classe média e a alta eram os alvos de roubos, e hoje está tudo mais concentrado na classe mais pobre”, completa.