Ação econômica começou a ser estudada pelos governos do Brasil e da Argentina. A ideia é criar uma moeda comum que possa ser usada nos fluxos comerciais e financeiros. O objetivo é reduzir os custos operacionais e a dependência de moedas estrangeiras.
No entanto, muitas dúvidas pairam no ar sobre a efetividade da medida e a quem realmente seria vantajosa. Isso porque o real é uma moeda forte e consolidada, por outro lado o peso está desvalorizado e a inflação em terras vizinhas, de acordo com dados oficiais, mostram que os preços ao consumidor subiram 94,8% nos 12 meses encerrados em dezembro.
Para analistas de mercado, a parceria, na atual conjuntura econômica e política, seria de uma relação de “ganha-perde”, na qual o Brasil levaria desvantagem ao sustentar oscilações negativas da política monetária argentina.
Lula, em declaração pública, em Buenos Aires, disse que a proposta será “muito debatida” entre as duas nações soberanas. Para o presidente brasileiro, a prática de comércio exterior em moedas dos países envolvidos, sem a conversão para dólares, facilitaria as transações e reduziria custos, além de promover a facilitação de acordos comerciais.
Entre propostas e declarações, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, veio a público desmentir que projeto visa a substituir o real e o peso e explicar que a proposta é de estudo de viabilidade para criação de uma moeda digital comum para trocas comercias e desta forma reduzir a dependência do dólar americano.
Volney Gouveia, gestor adjunto da Escola de Gestão e Negócios da USCS (Universidade de São Caetano do Sul), afirma que a proposta não tem nada a ver com algo similar ao euro, moeda utilizada entre 20 países do continente europeu. “Pelo menos por enquanto”, diz.
A análise precisa levar em consideração diversos fatores internos e externos, entre pontos que precisam ter uma leitura mais apurada é exatamente o da relação político-econômica entre os dois mercados Brasil e Argentina são os dois principais parceiros do Mercosul (área de comércio comum que estabelece tarifas de importação iguais aos países do bloco, que inclui ainda Uruguai e Paraguai).
A Argentina é o terceiro maior parceiro comercial do Brasil, com volume exportado de US$ 9 bilhões de dólares por ano (2020); enquanto o Brasil é o primeiro parceiro comercial da Argentina, com volume exportado de US$ 9,8 bilhões (2020).
Ao se criar a moeda comum, espera-se a redução de custos nas transações, pois há uma menor dependência do dólar americano. Volney explica, a título de exemplo, um empresário argentino que exporta um motor de 1.000 dólares para o Brasil e um empresário brasileiro que exporta uma máquina de 2 mil dólares para a Argentina. Pelo câmbio argentino, esta máquina brasileira custaria 370 mil pesos para o importador e pelo câmbio brasileiro, o motor custaria R$ 5.110.
“A questão central é que, não tendo a Argentina os dólares disponíveis – situação vivida pelo país atualmente em razão dos sucessivos problemas de pagamento de sua dívida externa – as chances de calote se elevam. A adoção da moeda comum, em tese, eliminaria essa “fragilidade” em dólar”, explica o professor.
A moeda comum visa a neutralizar a dependência do dólar e destrava o comércio entre os dois países, isso porque, seriam eliminadas as diferenças de valores com a conversão de câmbio. A criação desta nova moeda não é fácil e muitas dúvidas pairam no ar, se realmente ela seria vantajosa para os dois lados ou apenas para um.
Volney Gouveia ainda levanta outras questões ainda em aberto. “Quem emitiria a nova moeda?, quanto valeria a nova moeda?, como se harmonizariam as políticas econômicas dos dois países?, A taxa de juros – importante instrumento de controle da “temperatura” do consumo e da produção interna, operaria como?, e como se comportariam os custos internos de produção nos dois países?”, cita o professor da USCS.
Diante das dúvidas, ainda é muito cedo para concluir que a adoção de uma moeda comum seja maléfica e ou benéfica para qualquer um dos lados. Ainda será preciso muito estudo e conversa para se chegar a um denominador comum. “Mas, preliminarmente, é possível inferir que o Brasil – sendo metade da economia da América do Sul – teria muito a ganhar. A nossa complexidade industrial e agrícola é oportunidade de ampliação das exportações”, esclarece o professor.