
A Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público da Câmara dos Deputados realizou na manhã desta quinta-feira (15/12) uma audiência pública para discutir a situação da metalúrgica Paranapanema, empresa que está em recuperação judicial e já demitiu 87 trabalhadores de sua unidade de Santo André. A empresa tem outras duas unidades, nos estados da Bahia e Espírito Santo. Do encontro, mediado pelo deputado Daniel Almeida (PCdoB), participaram representantes de diversas entidades sindicais envolvidas, dentre eles Adilson Torres dos Santos, o Sapão, vice-presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Santo André, e também a advogada Fabiana Solano que representa o escritório que assumiu a recuperação judicial da empresa.
A representante da empresa garantiu que o objetivo da nova gestão é salvar a empresa de uma falência e manter as atividades do grupo. “A Paranapanema é uma referência para o setor e vem tentando sobreviver há alguns anos. A ideia é que usemos essa medida legal prevista na legislação para que possamos reestruturar as atividades do grupo. O processo foi aceito pela justiça na terça-feira e já foi nomeado um administrador judicial que atestou que a empresa tem condições de se reestruturar e pagar suas dívidas. Fizemos acordo com os fornecedores mais importantes e vamos manter todos os empregos. Mas o processo não é indolor, precisamos da colaboração de fornecedores de energia, gás, para que mantenham o fornecimento ativo”, disse Fabiana.
Já Sapão diz que a situação não é tão tranquila assim. Ele citou as 110 demissões, 23 na Bahia e 87 em São Paulo, ocorridas pouco antes da recuperação judicial, como demonstração da preocupação, principalmente porque, com o processo de recuperação, esses trabalhadores ficaram sem receber suas rescisões trabalhistas. “Mandaram um representante em vez de termos aqui o presidente para uma discussão tão importante. Nos últimos anos tem sido dessa forma; a direção da empresa não conversa com o sindicato ou com os trabalhadores para, juntos, traçarmos alternativas”, disse o sindicalista. Ele lembrou da mobilização que o Sindicato dos Metalúrgicos de Santo André fez em 2020 levando trabalhadores para protestar em São Paulo, em frente à sede do banco canadense Scotiabank que tinha pedido a falência da empresa. Após o manifesto o pedido foi retirado.
“Estamos cobrando que a empresa tenha transparência para que os trabalhadores possam se precaver, porque temos duas situações, a amargura e angústia do trabalhador que foi demitido e que ficou sem previsão de receber a rescisão. Esse pagamento pode vir em oito meses, ou em um ano. E a segunda situação é a dos trabalhadores que ficaram, que não sabem se terão um futuro na empresa, se ela vai realmente reagir”, disse Sapão durante a audiência na Câmara Federal.
A advogada que representa a nova gestão disse que os ajustes foram “mínimos” diante do tamanho da empresa. “Não é um calote eles (trabalhadores demitidos) serão pagos ao longo da recuperação judicial e terão prioridade”.
O deputado Daniel Almeida disse que a empresa tem a oportunidade de resgatar a confiança dos trabalhadores. “Eles são parte fundamental e inseparável desse processo e essa comissão vai acompanhar e continuar dialogando”, disse o parlamentar ao encerrar a audiência.
Em entrevista ao RD, Almeida disse que a reunião foi produtiva dentro do que a comissão poderia fazer. “Eu acho que foi produtiva sim, até porque como é uma empresa privada há pouco o que se possa fazer dentro da política. Mesmo assim assumi o compromisso de ajudar a encontrar uma solução”, disse o deputado do PCdoB. O comunista disse que apesar da mudança de governo em 2023, é possível a continuidade do acompanhamento pela Câmara e pelo próprio deputado que foi reeleito. Ele também tem esperança de buscar aproximar o novo governo da questão para ver o que pode ser feito.
Sapão também falou com o RD, logo após deixar a sala de reuniões onde aconteceu a audiência na Câmara Federal. Para ele ainda é cedo para avaliar se a empresa vai mudar a postura na sua relação com os trabalhadores. “A gente não tinha expectativa de resolver tudo hoje. A representante disse que vai ser mais transparente, mas a teoria é uma coisa e a prática é bem outra. Eles disseram que não vão demitir mais, que o ajuste que foi feito, o enxugamento, foi o suficiente para eles voltarem a produzir. De outro lado os trabalhadores demitidos devem esperar de oito meses a um ano para receberem, isso se correr tudo bem. Eu acredito que a Câmara vai acompanhar essa situação e vai ajudar”, completou o sindicalista.
O presidente da Agência de Desenvolvimento Econômico do ABC, Aroaldo Oliveira da Silva, disse que o órgão não tem ainda, mas pretende fazer um mapeamento das empresas que estão em situação de recuperação judicial na região. “Essa é uma lacuna, algo que a gente precisa levantar, a gente só vai reagindo. A situação da Paranapanema é uma situação geral resultado de um desmonte da política industrial como um todo e todos os setores vêm sentindo isso. O Brasil sente, o Estado sente e o ABC sente mais ainda. A nossa ideia é para reorganizar esse debate na região. Sabemos que temos que dialogar muito com o governo do Estado, com o governo Federal, mas estamos caminhando para juntar os atores da região, para construir o que chamamos de Pacto pela Indústria do ABC. A gente vem debatendo com as universidades, com os trabalhadores, com a própria indústria e o poder público para convergir esforços para barrar esse processo de desmonte, primeiramente. Depois podemos pensar sobre as oportunidades, seja readensando as cadeias ou pensando em novas cadeias produtivas”, resume.
Dívidas,
Em nota, a Paranapanema disse que a situação financeira da empresa foi agravada neste ano por conta de incidente na Bahia e por isso recorreu à recuperação judicial. “A Paranapanema recorreu à recuperação judicial depois de registrar dificuldades de crédito junto a fornecedores de matérias primas e insumos e de enfrentar um incidente na planta da Caraíba Metais, em Dias d’Ávila (BA), em 20 de junho deste ano, que resultou na paralisação das operações por 38 dias, o que impactou o equilíbrio financeiro da operação. O processo de recuperação será conduzido pela Íntegra Associados, uma das principais consultorias do mercado especializada em reestruturação de empresas. A gestão interina da Paranapanema será comandada pelo executivo Marcelo Milliet, sócio da Íntegra, que atuou recentemente no projeto de recuperação da Renova Energia. Com 40 anos de mercado, o executivo assumiu do posto de CEO e Diretor de RI da companhia em novembro de 2022”.
Segundo a nota da empresa há R$ 2,6 bilhões em dívidas já negociadas junto a instituições financeiras, cujas garantias estão atreladas a direitos creditórios e ativos reais da companhia. Este montante não integra o pedido de recuperação judicial que tem como objeto as dívidas operacionais de R$ 450 milhões, que serão negociadas de acordo com a capacidade de pagamento da empresa.
A Paranapanema possui três plantas industriais, sendo uma produtora de cobre refinado ou Cobre Primário, localizada em Dias d’Ávila (BA) – Caraíba Metais – e duas plantas de produtos de cobre e suas ligas, uma localizada Santo André (SP) e outra em Serra (ES) – Eluma. A Paranapanema, que registrou receita líquida de R$ 4,715 bilhões em 2021, é a única empresa do setor no país que realiza laminação a quente para produtos de cobre e a única empresa brasileira que produz cobre (cátodo) de alta qualidade.