Para o professor de arquitetura e urbanismo da USCS (Universidade Municipal de São Caetano do Sul), Enio Moro Júnior, o ABC poderia adotar novas formas de combate às enchentes, além dos piscinões que requerem grandes áreas e muitos recursos, além do impacto urbanístico negativo. O professor é contra esse modelo, apesar de admitir que pontualmente ele é eficaz para evitar as cheias. O urbanista participou do RDTv desta quinta-feira (24/02) e foi entrevistado pelo jornalista Leandro Amaral.
“O aquecimento global, mudanças climáticas e essa situação que vemos em áreas que são densamente urbanizadas, que criam ilhas de calor, vão se intensificar e o aparecimento de chuvas muito localizadas nas áreas de grande adensamento tende a se aprofundar”, analisa o professor ao lembrar que o mês de março, que se avizinha é conhecido pelas chuvas fortes.
“Teremos períodos de chuvas mais intenso e acho que as agendas municipais tinham que estar um pouco à frente. Temos uma efeméride, de 15 a 20 de março, um período anual de chuvas, imediatamente teria que ver as condições das bocas de lobo e das saídas de água da cidade, num segundo momento, um dia ou dois depois disso, ter ações mais marcantes na cidade”, explica o urbanista que lista três ações principais que as prefeituras poderiam adotar para evitar as cheias e com custos menores do que os piscinões.
A primeira ação proposta por Moro Júnior é o aumento da área permeável das cidades; ele sugere que as calçadas poderiam ter uma faixa de 40 ou 50 centímetros de largura sem concreto e gramada, o que já aumentaria significativamente a permeabilidade. “Com a política pública incentiva a calçada totalmente impermeabilizada a gente já perde uma boa capacidade de retenção de água de chuva”, comenta. A segunda sugestão é ampliar uma situação que já existe no ABC que é a previsão de reservatórios de água de chuva nos novos empreendimentos imobiliários. “Isso já acontece em Santo André, São Bernardo, São Caetano e Diadema, em Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande eu não tenho certeza. “Os novos condomínios têm que ter pelo menos 15% de área permeável, e tem também uma caixa de água subterrânea que retém a água da chuva e que depois pode ser bombeada para limpeza e irrigação”, explica.
A terceira sugestão e também uma das mais baratas é a criação dos Jardins de Chuva. Ele se inspira em uma prática da prefeitura paulistana. “A prefeitura retira algumas vagas de zona azul, retira o asfalto e coloca algumas plantas que absorvem mais água e existe, ainda, uma conexão com o lençol freático, isso foi feito em áreas centrais e acho que isso deveria ser ampliado para áreas periféricas. Os Jardins de Chuva contribuem bastante e são extremamente baratos. Se imaginar que num quarteirão se pode ter de 9 a 10 jardins como este, a captação que eles podem ter é de até 20 mil litros, o que é significativo, é quase um caminhão de água. Se somar isso com a faixa gramada na calçada já ajuda a colaborar para reduzir as enchentes”.
Para Moro Júnior, no lugar de grandes reservatórios, outros menores ao longo dos cursos de água poderiam ter mesma capacidade de retenção dos grandes piscinões e com um impacto urbanístico menor. “Os piscinões são soluções muito impactantes para as cidades, o custo é muito alto, no contexto urbano fica muito fragilizado, onde tem piscinão fica desvalorizado porque é uma área muito feia. Se pensasse os piscinões como grandes parques públicos, porque a gente sabe qual é o período de chuvas, posso ter um parque por 330 dias por ano, que só é fechado nos períodos de chuva. O Piscinão Jaboticabal (obra que está sendo construída na divisa entre os municípios de São Caetano e São Paulo) vai ser um dos maiores piscinões que existem, é uma opção, mas muito agressiva, eu poderia ter esse mesmo volume do Jaboticabal dividido em dez menores, com menor impacto”, comenta.
O internauta Osmar Santos, participou do RDTv e perguntou ao urbanista Enio Moro Júnior sobre a limpeza dos piscinões e citou como exemplo o piscinão do Paço de Mauá, que estaria assoreado. “O piscinão vem com areia, terra e detritos, o que é normal da enchente. Isso diminui a capacidade do próprio piscinão, o ideal é a limpeza desse material assim que passar a enchente. É um material altamente contaminado com produtos químicos e orgânicos, a limpeza precisa ser incluída na rotina de manutenção”, respondeu o professor.
Reportagem do RD publicada no domingo (20/02) (https://www.reporterdiario.com.br/noticia/3063813/mapa-das-areas-de-risco-no-abc-esta-desatualizado-ha-pelo-menos-10-anos/) mostrou que os mapas das áreas de risco no ABC estão desatualizados há pelo menos 10 anos. O professor da USCS defende também um aviso rápido, pelo whatsApp ou por outro mecanismo, que informe que podemos ter uma chuva mais forte. “Quando se sabe que vai ter uma enchente tem que estar preparado para atender pessoas desabrigadas. Um Programa de Resiliência Global deveria criar uma possibilidade de discussão dessas questões”, finaliza.