
O Tribunal de Justiça do Piauí decidiu nesta quinta-feira (16/07) soltar o morador de Ribeirão Pires, Daniel dos Santos, de 40 anos, que estava preso desde o dia 1/07 por um crime que não cometeu naquele estado há quase dez anos. Um homem cuja justiça ainda tenta identificar usou documentos falsos ao ser preso após um roubo. Sem saber disso, Santos foi julgado e condenado a 4 anos de prisão em 2013. A defesa conseguiu juntar provas de que ele estava trabalhando em uma indústria de móveis em São Caetano na data do crime e também no mesmo período em que o falso Daniel esteve preso naquele estado.
A decisão foi publicada as 11h50 desta quinta-feira pelo desembargador Edvaldo Pereira de Moura, da Primeira Vara da Comarca de Floriano (PI). O magistrado, em seu despacho, acolheu os argumentos da defesa e sustenta que nem as características físicas do homem que chegou a ser preso – e depois colocado para responder em liberdade -, nem as informações fornecidas pelo detido batem com a aparência e a documentação verdadeira de Daniel dos Santos. “Consultando detidamente os autos, constata-se que existem discrepâncias entre a identificação visual do requerente e do mencionado réu, bem como de sua assinatura, constante em diversos atos do processo, além do fato de que, nas oportunidades em que foi ouvido, ele menciona ser natural de diferentes cidades no Estado de São Paulo. Além disso, conforme se vê dos documentos acostados, notadamente dos cartões de ponto e do seu demonstrativo de salário, no período em que o réu esteve preso aqui no Piauí – de setembro de 2010 a fevereiro de 2011 – o requerente aparenta ter estado em São Paulo, trabalhando diariamente numa indústria de móveis pré-fabricados”, disse Moura.
Em entrevista concedida na data anterior ao portal de notícias da Globo no Piauí, delegado que fez a prisão na época, Daniel Cavalcante, já havia dito que o homem preso em Ribeirão Pires não tinha as mesmas características daquele capturado na data do crime.
O juiz do Piauí expediu juntamente com o despacho no processo de revisão criminal o alvará de soltura. “Defiro o pedido liminar pleiteado, para suspender todos os efeitos penais e extrapenais da condenação proferida nos autos da ação penal 0000126-71.2010.8.18.0083 em relação, exclusivamente, ao requerente Daniel dos Santos, até ulterior decisão ou até o julgamento da presente Revisão Criminal”.
A irmã de Daniel, Nair Marcelina dos Santos Oliveira disse que a família prepara uma festa para receber o rapaz. “Estamos todos muito emocionados. Estou indo para a casa da minha mãe e vamos fazer uma festa para recebe-lo”, comentou. A advogada Madre Ana Barbosa e familiares foram para o presídio de Franco da Rocha, onde Daniel está preso, para acompanhar o trâmite de soltura e trazê-lo de volta a Ribeirão Pires.
Entenda o caso
Desde de que Daniel dos Santos, de 40 anos, foi preso em sua casa em Ribeirão Pires, acusado de um roubo que ocorreu há 10 anos no Piauí, a família do rapaz não descansa para provar que o rapaz foi vítima de um erro processual e que está respondendo no lugar do verdadeiro criminoso que falsificou seus documentos.
No dia 10 de setembro de 2010 um homem que se identificou como sendo Daniel dos Santos, foi preso na BR 343 após um acidente de carro. O homem e outros dois, além de uma mulher, teriam participado do roubo de um malote que pertencia a prefeitura de Francisco Ayres, e onde estavam R$ 30 mil. Após a fuga três homens bateram o carro, dois fugiram pelo mato um foi preso com uma fratura no braço. Ele estava com uma carteira de habilitação que tinha sua foto, mas o nome de Daniel dos Santos. O criminoso foi solto três dias depois para responder em liberdade e desapareceu.
No último dia 1/07, quase dez anos após o crime, policiais da Delegacia de Ribeirão Pires foram até a casa de Santos para o cumprimento de um mandado de prisão. O caso foi julgado à revelia em 2013. Os policiais o levaram para a Delegacia, depois para o CDP (Centro de Detenção Provisória) de Santo André, onde Santos ficou até esta quarta-feira (15/07) quando foi transferido para o presídio de Franco da Rocha, distante mais de 90 quilômetros de sua família.
Para a advogada da família, Madre Ana Barbosa, o que houve com Daniel dos Santos foi uma sequência de erros. O rapaz soube, ainda em 2010 que seus documentos poderiam ter sido clonados, recebeu cobrança do sistema Sem Parar, com uma conta feita em seu nome. Teve que pagar o débito para não ficar com nome sujo. “Informe da Polícia Federal do Piauí, destaca que o documento apresentado pelo homem preso aparentava ser falsificado, mas a Polícia Judiciária de lá não colheu as impressões digitais do preso para a legitimação. Colher as digitais é o mínimo em qualquer delegacia, por mais pequena e sem recursos que seja”, aponta a defensora. “Não relataram nem fizeram uma descrição do homem preso. Porque a foto do documento falso não é compatível com as feições do Daniel”, explica.
A família de Daniel dos Santos diz que ele nunca esteve no Piauí. “Nesse tempo todo nunca chegou nenhuma intimação aqui. Na época do crime meu irmão trabalhava na fábrica de móveis Bartira, em São Caetano, temos o cartão de ponto para provar”, diz a irmã Nair Marcelina dos Santos Oliveira. “Meu irmão é trabalhador, nunca foi preso, nunca entrou numa delegacia e nunca foi ao Piauí”.
A advogada diz que o acidente na BR 343 no Piauí aconteceu as 16 horas, mas as 16h45 daquele dia ele estava batendo o cartão de saída da Bartira. “Nem que ele fosse o Super-homem não chegaria a tempo. É um absurdo o que fizeram com esse rapaz, nem o exame datiloscópico fizeram para confrontar as digitais”, disse a advogada que fez o pedido de Habeas Corpus no Tribunal de Justiça do Piauí. O Ministério Público se posicionou favorável ao relaxamento da prisão, mas o juiz Carlos Eugênio Macedo de Santiago, da Primeira Vara da Comarca de Santiago (PI) negou, alegando que a solução jurídica não era adequada.
Madre Ana recorreu à segunda instância da justiça piauiense na qual o juiz Edvaldo Pereira de Moura definiu pela soltura. O rapaz é casado, trabalhador e mal acabou de construir sua casa em Ribeirão Pires e nem pode usufruir do esforço do seu trabalho e foi preso”, disse a defensora. A família contratou ainda outro advogado no Piauí, Jairo Lima, para ajudar no processo.