Os restaurantes na região do ABC tiveram autorização para reabrir nesta segunda-feira (06/07), mas nem todos ergueram as portas neste primeiro dia, justamente pela preocupação com os custos da reabertura e o horário reduzido de funcionamento. Falta de acesso ao crédito foi uma das maiores razões para essa incerteza. Apesar das dúvidas, mesmo quem ainda não abriu planeja voltar a recepcionar os clientes depois que quase três meses fechados, alguns trabalhando apenas com entregas.
O RDTv desta segunda-feira (06) deu espaço para tradicionais e novos restaurantes da região e seus proprietários que falaram sobre suas expectativas e dificuldades. Participaram do programa o chef Simon Calcin, proprietário do Restaurante 7 Mares, em São Caetano; Ricardo Furtado, do Maddiê Restaurante e Pizzaria, em Diadema; Viviane Braga, proprietária do Trem Bão, em Mauá; e Melchior Neto, chef e proprietário do Botequim Carioca e do Gema Restaurante, ambos em Santo André.
Melchior reabriu o salão do seu restaurante, mas o botequim ainda não. “Estava muito preocupado ontem não dormi. Contratei funcionários extras para trabalhar, acabei fazendo compras, me precipitando. Fiquei feliz que as pessoas estão mais preocupadas do que a gente imagina; estão se protegendo e também a suas famílias, coisa que a gente sabe que na periferia não está acontecendo”, disse o chef sobre o retorno. Segundo ele o delivery manteve o Gema nestes três meses. “Foi foi uma loucura que nunca tinha feito o delivery. Hoje entrego meu prato em uma embalagem personalizada e vai até o álcool gel junto”, disse o empresário que antes da pandemia tinha 70 e hoje tem 60 funcionários. “Fui obrigado a fazer a retomada porque a gente perdeu o benefício do governo que tava pagando metade do salário dos funcionários. Meu desafio agora é abrir o delivery no Carioca também e esperar que o governo ajude”, comenta o empresário.
O desafio de equilibrar as contas é bem conhecido do empresário Ricardo Furtado, que deixou uma carreira na área financeira há sete meses para investir no Maddiê, restaurante e pizzaria que fica no Centro de Diadema. O estabelecimento tem dois perfis de atendimento, o almoço e as pizzas à noite, tanto no delivery quanto no salão. “A gente fechou e teve o aluguel e outras despesas; investimos em aplicativo para que viabilizasse”, disse o proprietário da casa que tinha grande expectativa para o primeiro dia de salão aberto, mas ela foi bem maior do que o resultado. “Nosso primeiro dia foi um pouco frustrante, vendemos bem menos do que esperava; foram 30 almoços e costumava vender entre 110 e 130. Todos nossos locais são bem higienizados e com ambiente arejado. Tudo que manda a lei e um pouco mais temos feito”, comentou.
Viviane Braga, do bar Trem Bão, em Mauá, fechou completamente o estabelecimento, onde trabalha com o filho e mais três funcionários, mas depois de dois meses com as dívidas se acumulando aceitou uma sugestão e passou a fazer batata recheada, bolinho de costela e bolinho japonês para entrega e isso garantiu a continuidade da casa. Ela ainda não reabriu as portas, o que acontecerá nesta terça-feira (07). O estabelecimento de Viviane é diferente da tradicional casa de frutos do mar de São Caetano, o 7 Mares, mas os problemas são parecidos, como também são parecidos com os do Maddiê e do Gema, e se resumem na falta de oportunidade de crédito a juros baixos. “Não procurei ajuda, esperei as dívidas chegarem para negociar depois. Se eu procurasse o crédito é mais uma coisa que ia ficar devendo”, disse a proprietária do Trem Bão.
Simon Calcin, do 7 Mares disse que só vai reabrir seu salão na quinta-feira (09), por enquanto os funcionários estão em treinamento quando as novas normas de atendimento, na verdade um reforço do que já era feito na casa. O problema maior é a falta de crédito. “Estamos aguardando o Pronamp, me antecipei em relação a pandemia, não esperávamos tanto tempo e vemos agora uma briga política e quem está pagando são os eleitores. O banco gosta de emprestar dinheiro para quem não precisa, quando você precisa os juros são altíssimos”, sustenta o empresário.
A solução foi tentar arrumar a casa com o que se tem, cortar gastos e tentar se manter. Assim fez Ricardo Furtado para garantir o funcionamento do Maddiê. “Quando percebi já busquei medida de redução de custo, mas até agora não conseguimos destravar o Pronamp com carência e juro baixo. Se tivesse isso há dois meses teria conseguido manter os empregos e negociado melhor o aluguel. Com essa falta de clareza e ajuda efetiva ninguém conseguiu. Só pedimos o que temos direito; me sinto jogado, sozinho, tendo que pagar os impostos atrasados. Estamos navegando sozinhos pois é empréstimo da família que sustenta o negócio”, lamenta o dono do restaurante de Diadema que passou a investir mais no seu marketing para garantir lucro no delivery. “Criamos umas pizzas diferentes e calzones. Resolvi investir mais em marketing, para chamar a atenção para o restaurante através da mídia social”, relata.
Com a experiência de muitos anos no ramo o chef Melchior Neto também passa pela mesma dificuldade. “Aprendi que aquele dinheiro todo que passa pela tua conta não é teu, só uma pequena parte dele e ainda tem que reservar um pouco para propaganda e outra para o capital de giro, por isso estou vivo até hoje, mas tudo que eu tinha guardado acabou, fui buscar o banco (pedir empréstimo) e claro que foi negado. O que eu espero hoje é o Pronamp”.
Como Furtado, Melchior também alterou o cardápio do delivery e está vendendo mais nesta modalidade. “Meu público é muito mais família e não vai se arriscar, vai pedir em casa. Os pratos individuais custavam R$ 29,90 e fizemos uma promoção para quem comprasse na segunda-feira iria pagar R$ 20 no restante da semana. Foi um super sucesso e estou vendendo muito, ganho menos por prato mas ganho na quantidade”. No 7 Mares o cardápio para entrega também mudou, com opções a preços mais acessíveis. “No delivery tem que agradar muito mais o cliente”, diz Calcin.
Horário
Os empresários ouvidos no RDTv foram unânimes em criticar o horário de abertura das 11h às 17 horas. “Essa retomada com período curto é ridículo, apenas para fazer politicagem, esse é o meu pensamento. Poderiam facilitar para os empreendedores. Deveria deixar a gente a trabalhar até um determinado horário. Está selecionando o público sem critério nenhum e pondo a culpa na pandemia”, disse Simon Calcin que sugeriu por ofício enviado a prefeitura que fosse permitida a abertura de três horas no almoço e outras três no jantar. “O estado poderia pensar numa solução melhor; abertura parcial mais atrapalha que ajuda”, acrescenta Furtado. “Aqui em Mauá já teve bagunça de bares no fim de semana, antes de permitida abertura, tinha que ter fiscalização para não acontecer como no Rio de Janeiro”, avalia Viviane.
“Deveria ter um estudo melhor, cada negócio é um. O restaurante Gema funciona de um jeito o meu botequim Carioca funciona só a noite, acho que tá tudo errado”, disse Melchior, que deixa uma mensagem para os consumidores. “Não deixe de prestigiar os restaurantes, o pequeno do bairro”, concluiu. O dono do Maddiê, se preocupa com o resultado da abertura se ela for feita de forma errada. “Preocupa essa abertura e que corre o risco de fechar de novo o que seria um desastre para a gente. Tem que ver o quanto a gente vai impactar nas próximas duas semanas o nível de contaminação. Se tiver que fechar, para quem comprou muita mercadoria, pode gerar uma outra crise”, analisa Ricardo Furtado.