Estudo apresentado durante a oitava Carta de Conjuntura do Observatório de Políticas Públicas, Empreendedorismo e Conjuntura da USCS (Universidade Municipal de São Caetano do Sul) neste mês de julho, aponta que os negros enfrentam preconceito mesmo quando demonstram capacidade para empreender. O levantamento revela o pouco incentivo ao afroempreendedorismo e o desenvolvimento do potencial do empreendedor negro nas cidades do ABC, além de contextualizar historicamente o racismo no país.
Na região 28,2% da população economicamente ativa é negra. As cidades com maior número de negros trabalhando em relação ao contingente de brancos são Diadema, com 8,7% mais negros que brancos, e Rio Grande da Serra onde o número de negros é 32% maior do que o de brancos na população ativa. Em Santo André há mais do que o dobro de brancos no mercado, mas a diferença é mais evidente em São Caetano, onde a quantidade de brancos economicamente ativos é 468% maior que a de negros. O estudo mostra, no entanto que, mesmo nas cidades onde os negros são maioria entre os ativos, os brancos são maioria dos empreendedores e patrões, ou seja, há mais negros empregados do que empregadores.
Os pesquisadores apontam que o negro encontra dificuldades para ser patrão, até mesmo de si próprio, quando abre uma empresa tradicional ou quando implanta uma inovação tecnológica, a startup. “Se você é um empreendedor negro, não vai ter acesso ao crédito igual um branco, pois o banco já te olha diferente. Se a startup é de um negro o investidor não recebe igual o branco, isso já foi diagnosticado”, analisa professor de economia da USCS e coordenador do Observatório Econômico, Jefferson José da Conceição, um dos autores do estudo. “Os negros sofrem racismo também no meio empreendedor, por isso, na área da Educação é preciso fazer o negro ter uma visão empreendedora”, continua o economista.
Para a cientista do trabalho Vânia Viana, outra pesquisadora que assina o estudo da USCS, a chave são as garantias legais. Ela chama a atenção para a parte do levantamento em que são listadas as políticas públicas destinadas a estimular o empreendedorismo negro. Segundo o trabalho apresentado há poucas experiências na seara das leis pelo país. Na região do ABC apenas Diadema tem uma lei que datada de maio de 2016 que trata do programa municipal de afroempreeendedorismo. Santo André manteve no último dia 13 de junho o veto ao projeto de lei que criaria um programa semelhante na cidade. O projeto é de autoria do vereador Alemão Duarte (PT) e foi apresentado em 2017. “Falta investimento em políticas públicas neste setor para propiciar ao povo negro o mínimo de igualdade. O Estado está fazendo essa discussão na Assembleia Legislativa. A cidade de São Paulo já tem uma lei e aqui no ABC, temos lei efetiva só em Diadema. É preciso que os outros municípios se atendem para essa necessidade. Tendo a lei o Executivo tem que cumprir, não ficamos mais com o pires na mão”, destaca a pesquisadora.
Segundo Vania, existe uma relação entre riqueza e o menor coeficiente do afroempreendedorismo, como São Caetano, que é a cidade com maior renda percápita e melhor Índice de Desenvolvimento Humano do ABC, e é a que também registra a maior desigualdade entre brancos e negros. “Como os negros normalmente estão em uma parcela esquecida, acaba-se criando um grande desequilíbrio”. Vânia explica que o afrodescendente precisa de uma combinação de fatores, para que essa realidade mude; primeiro a educação para empreender e também de políticas públicas específicas. “Precisamos sempre de tudo, mas um marco regulatório nos coloca na posição de exigir o que está na lei. Precisamos de incentivos em todas as áreas, não só na de empreendedorismo”, conclui.