As calçadas são vias públicas que garantem segurança ao pedestre. Mas no ABC, se não bastassem ter buracos, desníveis, pisos escorregadios, raízes de árvores, containers e outras armadilhas que o poder público faz vista grossa, as calçadas são cada vez mais bloqueadas, principalmente pelo comércio, que ocupa o espaço como se fosse próprio. Sem fiscalização, esses locais, principalmente bares, ignoram o direito universal do pedestre, que precisa se espremer entre mesas, cadeiras e garçons ou disputar a rua com os carros e correr risco de ser atropelado, para passar. O cadeirante, idoso e quem carrega criança no carrinho são totalmente desrespeitados.
No centro de Santo André, a Padaria Grilo, na rua Monte Casseros, espalha cadeiras e mesas na calçada durante todo dia. Silas de Souza, proprietário, afirma que está certo. “Nós estamos dentro da lei, temos 1,20 metros de passagem para pedestres”, afirma. Mas Marilene Lima, 67, moradora do bairro, diz que a ocupação incomoda. “Eu acho ruim porque esse lugar não foi feito para o pessoal ficar sentado bebendo e fumando”, reclama.
No final de semana, a calçada da esquina das ruas Coronel Ortiz com a rua Santo André também fica bloqueada. O Botequim Carioca instala mesas e cadeiras, e em dias de chuva ou frio ainda fecha com um grande toldo. Para passar, o pedestre precisa ir para rua, que tem trânsito intenso de veículos. Ana Paula Munhoz, advogada e moradora na vila Assunção, reclama que não consegue andar na calçada com o pequeno Murilo, de cinco meses e com carrinho, porque ocupam a passagem. “É um absurdo, cadê a Prefeitura que não vê isso?”, questiona a mãe. Thiago Silvestre, gerente, diz que o botequim tem capacidade para apenas 60 consumidores e quando o movimento é grande, a parte externa é acionada. “Usamos a calçada para os consumidores rápidos, que não permanecem por longo tempo aqui no bar”, afirma.
Ainda em Santo André, a Bardega do Guilherme, na rua Afonso Pena com a avenida Queirós Filho, na vila América, tem o imóvel até o meio fio. Não contente, o dono construiu até degraus sobre todo o espaço da calçada. Guilherme Teixeira, proprietário, diz que o povo só passa e vai embora. “Minha calçada não incomoda ninguém”, se defende. Michel dos Santos Silva, funcionário da Twister, empreendimento vizinho, contra-argumenta. “O pessoal reclama direto aqui, porque não tem segurança, passa muito carro nessa avenida”, diz.
Quem passa em frente à Avicultura São Joaquim, esquina da rua 24 de Maio com a avenida Queirós Filho, tem de andar na sarjeta, porque a casa ocupa toda a largura da calçada. Joaquim Silva Macedo, proprietário, conta que a rua foi ampliada em 1970 e ficou sem calçada desde então. “Na época da eleição municipal eu pedi pra colocarem calçada aqui, mas me disseram que não iam mexer tão cedo”, diz.
No 2º subdistrito, o pedestre enfrenta dificuldade para andar em frente à marcenaria da avenida das Nações, 1.551. A construção avançou um muro para a calçada e deixou apenas cerca de 60 cm para passagem de pedestres. O RD não conseguiu contato com os proprietários.
Privatizada
Em São Caetano, a lanchonete Las Vegas toma conta da esquina da rua Amazonas com a Serafim Constantino, próximo ao Terminal Rodoviário Nicolau Delic. De acordo com Cleiton Teixeira, proprietário, há um acordo com a Prefeitura para utilizar o espaço. “A gente paga para privatizar essa calçada por mês”, diz. Questionada, a assessoria da Prefeitura disse que o espaço foi cedido, porém não forneceu detalhes. Pedestres reclamam que os funcionários da casa costumam mexer com mulheres que passam na calçada. “Eu acho que deveria ter mais segurança e iluminação aqui”, afirma Ariel Correia, estudante de Jornalismo.
No bairro Rudge Ramos, em São Bernardo, há anos um ferro velho ocupa toda a calçada com carcaças de carros em plena avenida Winston Churchill, altura do número 1.182. Quando chove, o local vira berço para proliferação de mosquitos.
No mesmo bairro, a rua do Sacramento e as calçadas são tomadas todos os dias por clientes do Reitoria 237 e do Supra Bar. “A rua fica com um cheiro forte de maconha e tem muita poluição sonora”, reclama Gabriella Pinheiro, estudante de Publicidade e Propaganda. “Quem está a pé tem de andar na rua por causa da calçada bloqueada”, conta Heitor Sola, estudante de Rádio, TV e Internet e morador do bairro.
Prefeituras têm de fiscalizar, diz engenheiro
Luiz Sérgio Mendonça Coelho, professor de engenharia civil e urbanista do Centro Universitário da FEI, ressalta que as pessoas não podem fazer o que querem com a calçada e a maior parte dos pedestres anda na rua porque os passeios não têm acessibilidade. “A responsabilidade e a fiscalização é da Prefeitura. É ela que tem o poder inclusive de mandar fazer calçadas e depois cobrar das pessoas o valor referente ao trabalho. Toda calçada, por lei, tem de ter a largura para um cadeirante passar, e não é isso o que encontramos na maior parte da região”, critica.
Em nota, a Prefeitura de Santo André informa que já foram realizadas diversas operações de fiscalização nos locais em questão, tendo como base a lei municipal nº 7392, que permite aos comerciantes ocuparem o passeio público, desde que deixem espaço livre de 1,10 metros para passagem de pedestres. Os locais alvos de reclamação possuem calçada com tamanho que propicia ocupação para acomodar mesas e cadeiras para consumo de produtos e permitir a passagem satisfatória de transeuntes. As prefeituras de São Bernardo e São Caetano não responderam até o fechamento desta matéria.
(Colaborou Raíssa Ribeiro)