Rigidez política faz mercado adotar cautela com Marina

Consolidada a candidatura de Marina Silva pelo PSB no lugar de Eduardo Campos, morto em acidente aéreo na última quarta-feira, o namoro inicial do mercado financeiro com a candidata deu lugar a um tom de cautela. Apesar de os acenos tanto do principal assessor econômico dela, Eduardo Giannetti, como da própria candidata terem sido bem recebidos pelo mercado, economistas ponderam que a rigidez política demonstrada por Marina pode se sobrepor a uma política econômica “market friendly” e se mostrar um problema na hora de governar. Analistas avaliam agora que é preciso esperar para ver qual dos dois aspectos prevalecerá durante a campanha para tomar um posicionamento mais claro em relação à candidatura dela.

O economista-chefe de um banco brasileiro que pediu para não ser identificado afirma que, em 24 horas, Marina Silva mostrou o melhor e o pior da sua candidatura. O melhor, de acordo com ele, é o programa econômico apresentado por ela até agora, que deve agradar ao mercado, sobretudo os aspectos como a defesa do tripé macroeconômico (defendido por ela durante lançamento oficial da candidatura em Brasília) e a autonomia do Banco Central, seja ela formal ou não. “Em termos econômicos, a possibilidade de ela ser eleita não causaria estresse ao mercado”, diz.

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A avaliação é a mesma do Eurasia Group, importante consultoria política de Washington, expressa em relatório assinado pelo chefe de Pesquisas para América Latina, Christopher Garman.

Ele afirma ser provável que Marina monte uma equipe econômica “market friendly” e que revele sinais construtivos durante a campanha sobre a necessidade de promover uma gestão fiscal responsável, de controlar a inflação e conceder autonomia ao Banco Central. No relatório, Garman destaca ainda os posicionamentos de Giannetti, “mais influente assessor econômico de Marina Silva”, que não só defendeu uma gestão mais responsável das contas fiscais como minimizou possíveis diferenças entre PSB e PSDB. Na semana passada, durante palestra em Curitiba, ele disse ver “uma forte convergência” entre os dois partidos “para adotar as políticas econômicas necessárias”, caso derrotem Dilma Rousseff nas eleições deste ano.

A consultoria americana ressalta que, mesmo Giannetti não se tornando ministro da Fazenda de Marina, ele será muito influente na escolha que ela fará. “É provável que sua equipe econômica venha de um grupo de economistas bem respeitados e favorável ao mercado”, afirma Garman no relatório. Dessa forma, ele vê Marina como mais parecida com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao delegar responsabilidades aos poderosos ministros de sua equipe, do que com o estilo centralizador de Dilma, que restringe as decisões a um círculo íntimo de assessores. O Eurásia Group pondera, contudo, que Marina demonstra alguns limites na condução de uma gestão econômica construtiva.

Garman afirma que a consultoria está “cética” sobre a disposição de Marina de implantar uma política fiscal muito apertada e tomar decisões politicamente difíceis para alcançar o superávit primário. “Como resultado, a administração dela é suscetível de conduzir a um ajuste fiscal e de relaxar os preços represados em setores como a gasolina e energia de forma gradual”, afirma, ponderando que não espera um forte ajuste fiscal nem se o candidato do PSDB à Presidência, Aécio Neves, for eleito. “Mas o ponto que chama atenção é que essa tolerância de Marina para decisões fiscais dolorosas provavelmente não é muito alta”, pondera.

A consultoria faz ressalva ainda em relação ao “perfil verde” de Marina, que gerou significativa animosidade com o agronegócio no passado e preocupa atualmente grupos da indústria em relação à possibilidade de a obtenção de licenciamentos ambientais se tornar mais rígida para projetos de infraestrutura. Apesar disso, o Eusaria Group ressalta que a indicação do deputado federal Beto Albuquerque como candidato a vice é um “bom sinal”. “Ele tem laços com o agronegócios, e seus conselheiros são claramente a favor de aberturas do governo ao setor privado, para impulsionar os investimentos”.

Terceira via

Tanto o economista-chefe quanto o Eurasia Group avaliam que o principal ponto ruim de Marina, no entanto, é a rigidez política. Para eles, apesar de ser benéfica para a candidata eleitoralmente, ao ajudá-la a se viabilizar como uma terceira opção à polarização entre PT e PSB, isso poderá prejudicar a candidata durante seu governo. “Vivemos em um regime presidencialista, mas a Constituição de 1988 foi feita pensando em um regime parlamentarista. Ou seja, apesar de ter a caneta, o presidente precisa fazer maioria no Congresso para se sustentar. (…) Esse pouco jogo de cintura dela, de ser muito rígida nos conceitos, sem espaço para discussão, pode complicar o governo dela”, diz o economista.

Na avaliação da consultoria, essa característica de Marina faz com que um eventual governo dela seja “menos previsível” do que uma administração petista ou tucana. “Ela tem uma forte convicção sobre a necessidade de renovar a política e estabelecer governança em novos territórios. Na prática, isso significa que ela se opõe a se engajar nos meios tradicionais de conseguir maioria no Congresso, por meio da distribuição de ministérios a partidos”, afirma, lembrando que a candidata já declarou publicamente que não faria aliança formal com o PMDB, maior partido do Brasil. Nesse aspecto, Garman ressalta ainda que o discurso de campanha dela de que o estilo de governar de PT e PSDB está passado também sugere uma improvável aliança formal com tucanos.

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