Houve despertamento geral no País, alerta cientista social

Luci Praun é coordenadora do curso de Ciências Sociais, da Universidade Metodista de São Paulo (Foto:Rodrigo Lima)

O Brasil assiste desde o dia 6 a inúmeras manifestações da população. Por meio das redes sociais, uma geração se organiza e sai às ruas. Começou como mote o elevado preço da tarifa do transporte público e segue com reivindicações para profundas mudanças na política nacional. Para a professora Luci Praun, coordenadora do curso de Ciências Sociais, da Universidade Metodista de São Paulo, o movimento revela a insatisfação generalizada dos brasileiros e mostra a necessidade de mudanças e sentimento de luta enraizado. “No movimento tem se falado muito que não são apenas os 20 centavos. O sentimento de vitória no transporte pode fazer com que busquem outras conquistas. E eles precisam de várias vitórias”, explica.

Embora alguns setores afirmem que as manifestações têm prazo de validade, Luci, que participou de passeata na Capital, acredita que o Brasil entrou na rota dos movimentos. “A resposta já foi dada quando dizem o tempo todo que não é pelos 20 centavos. Isso mostra que existem outras demandas. Acho que outros setores vão se juntar a isso. São jovens de 17 a 30 anos, mas também outras gerações, inclusive, mães com filhos, além da adesão e apoio de moradores nos prédios, o que até os institutos de pesquisas e redes sociais apontam”, ressalta.

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Para a professora, toda vez que os movimentos sociais saem às ruas, vêm mudança e discussões. A questão das passagens e a má qualidade do transporte público foi a gota da água. Havia uma indignação represada, um cansaço geral. A tendência é que as pessoas mostrem mais indignação, saiam às ruas para protestar, inclusive nos grandes eventos, como a Copa do Mundo e Olimpíadas”, avalia Luci.

O que fortalece o movimento, na visão da professora, é a diversidade de interesses. Luci diz que participou, na década de 1980, do movimento das Diretas, que também refletia isso. Várias demandas pontuais, com diferentes grupos representados.

“Cada vez mais, eles tendem a construir propostas em comum para manter a união. Não vai ter pico de participação todo dia, mas isso não quer dizer que o movimento enfraqueceu. Na verdade, ele se enraizou e o debate está posto na sociedade”, enfatiza.

Sobre os atos de vandalismo contra bens público e privado, Luci diz que essa é uma discussão delicada. “O que a polícia fez com os manifestantes, semana passada, foi vandalismo. Atirar nas pessoas, perseguir como fizeram. O problema é que a mídia acaba sempre pegando uma ação mais radicalizada e transforma no total do movimento. Pode ser que tenha quem não saiba o que faz ali, mas a maioria sabe e a dimensão prova isso”, ressalta.

“Jovem não se vê representado”

A ocupação do Congresso Nacional, segunda-feira (17), e os protestos diante do Palácio do Governo de São Paulo e da Assembleia Legislativa, no Rio, evidenciam, segundo Luci, o descontentamento com o sistema político. “A juventude está descontente com os políticos e os partidos. Ela não se vê ou sente representada por eles. O que se discute é a negação dos partidos que estão no poder. Não é à toa que eles estão na rua. Parte desse público não consegue emprego, nem estágio. Muitos não terão carteira assinada. Em contrapartida, eles veem partidos ligados à corrupção, dinheiro sendo gasto em obras vitrines e pouco investimento em educação, saúde e lazer, por exemplo. É um despertamento geral”, explica.

A cientista social diz que houve revolução por meio das redes sociais, que contribuíram para espalhar o movimento no Brasil e Exterior. “Vivemos um momento interessante e contraditório. Parece com o período em que se fez o vídeo da guerra do Vietnã e as pessoas se deram conta das barbaridades dos soldados americanos. E a internet tem funcionado como espaço de contra-hegemonia da informação para alguns movimentos sociais. É uma comunicação alternativa. Isso é contraditório porque nunca vivemos uma situação de tanta vigilância.  

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