Com o avanço da urbanização, os condomínios se consolidaram como principal modelo de moradia nas grandes cidades. O crescimento no número de prédios e blocos aumentou a complexidade da convivência entre moradores. Regras claras se tornaram essenciais, mas nem sempre estão atualizadas ou são respeitadas, e por isso tramitam no Senado mudanças no Código Civil que afetam diretamente o cotidiano condominial.
O advogado Disan Santana Pinheiro Junior, presidente da Comissão de Direito Condominial da OAB Diadema/SP, explica em entrevista ao RDtv que as alterações representam um avanço importante por oferecerem mais segurança jurídica a síndicos, administradoras e moradores. As principais propostas envolvem regras para locações por aplicativos, medidas contra moradores antissociais e aumento da multa para inadimplência.
Locação, comportamento e inadimplência
Uma das mudanças mais relevantes trata das locações por plataformas digitais, como Airbnb e Booking. O Código Civil, hoje omisso sobre esse tipo de uso, abre margem para decisões judiciais conflitantes. A proposta em debate estabelece que a locação atípica só será permitida com autorização expressa na convenção do condomínio ou após deliberação em assembleia. Caso contrário, ficará proibida.
“A rotatividade de pessoas é o maior problema. Isso afeta a segurança e exige mais controle nas entradas. A proposta busca equilibrar o direito de propriedade com o interesse coletivo”, afirma Santana.
Antes de adquirir um imóvel com intenção de alugá-lo por aplicativo, o comprador deve consultar a convenção condominial. “É fundamental saber se o prédio permite esse tipo de atividade. Assim se evita frustrações futuras e disputas jurídicas desnecessárias”, comenta.
Outra mudança importante trata da conduta dos chamados moradores antissociais — pessoas que desrespeitam regras, perturbam vizinhos ou colocam outros em risco. Atualmente, o Código permite a aplicação de multa de até dez vezes o valor da cota mensal. No entanto, o impacto costuma ser baixo e ineficaz. A nova proposta autoriza a assembleia, com quórum qualificado de dois terços, a deliberar pela exclusão do morador, com posterior homologação judicial. “Em casos extremos, como rojões lançados contra apartamentos vizinhos, o condomínio precisa reagir. Não se trata de retaliação, mas de proteção da coletividade”, explica o advogado.
A inadimplência, outro problema frequente, também deve sofrer impacto. A multa atual de 2% sobre cotas em atraso passará para 10%, conforme o novo texto. O objetivo é desestimular o não pagamento e preservar o caixa dos condomínios. “Muitos priorizam outras dívidas porque a penalidade condominial é muito baixa. Essa mudança traz mais seriedade à gestão financeira”, diz. O limite de inadimplência considerado aceitável varia entre 5% e 10%. Acima disso, a gestão precisa adotar medidas mais firmes, inclusive ações judiciais.
Síndico mais técnico, conselho mais presente
Além das mudanças legais, velhos conflitos continuam presentes. As vagas de garagem não comportam os veículos maiores, o latido constante dos cães incomoda, especialmente quem trabalha em casa, e nas férias, as crianças ocupam intensamente as áreas comuns, exigindo atenção extra da equipe de manutenção. A função do síndico passou por transformações.
Apesar de continuar como autoridade máxima da gestão condominial, passou a atuar sob acompanhamento mais rígido por parte dos conselheiros. A participação ativa desses membros aumentou. Hoje, cobram reuniões periódicas, relatórios e clareza na prestação de contas. “O síndico atual precisa dominar aspectos legais, administrativos e humanos. A gestão exige preparo constante. Não basta apenas boa vontade”, destaca o presidente da comissão da OAB.
A contratação de síndicos profissionais e administradoras requer análise criteriosa. Currículo, certidões negativas e referências devem ser avaliadas com atenção. Verificar a atuação em outros condomínios ajuda a evitar problemas futuros e assegura uma gestão qualificada. As assembleias continuam sendo um desafio. A participação costuma ser baixa, o que não impede a aprovação de pautas relevantes. Em prédios com 100 apartamentos, muitas decisões ocorrem com a presença de 10 a 15 moradores. Mesmo assim, as deliberações se aplicam a todos. “As pessoas reclamam dos aumentos e reformas, mas não aparecem para votar. Quem participa decide, quem não comparece, concorda por omissão”, diz Santana.