ABC - terça-feira , 14 de janeiro de 2025

Conselheiros de Santo André dizem que é irregular tirar dinheiro de fundo municipal

Retirada de dinheiro dos fundos municipais foi debatida na audiência pública que debate outro projeto, o que define o orçamento municipal para 2025. (Foto: Guss Costa/CMSA)

O projeto de lei de autoria do prefeito de Santo André, Paulo Serra (PSDB), que prevê tirar dinheiro  dos fundos municipais deve entrar na ordem do dia da Câmara nesta terça-feira (26/11) e já começou a causar polêmica na Casa desde esta segunda-feira (25/11) quando foi realizada audiência pública para debater o LOA (Lei Orçamentária Anual). O projeto diz que a prefeitura não vai mais devolver cerca de R$ 80 milhões retirados dos fundos municipais para o combate à pandemia da covid-19, conforme projeto do próprio Executivo e que a Câmara aprovou em 2021, e ainda permite, se for aprovado, a retirada de todo o superávit, ou seja, os valores não utilizados pelos fundos municipais até o final do ano, dinheiro que iria para pagar dívidas da prefeitura tais como precatórios.

Conselheiros ouvidos pelo RD, demonstram preocupação diante da possibilidade da medida ser aprovada sem nenhuma discussão com os conselhos e passando por cima também de normas legais, como o Estatuto das Cidades. Segundo Raquel Fernandez Varela, vice-presidente do MDV (Movimento em Defesa da Vida) entidade que tem assento em dois conselhos municipais, entre eles o CMPU (Conselho Municipal de Política Urbana) gestor do Fundo Municipal de Desenvolvimento Urbano, a medida vai “descarimbar” um dinheiro público que tinha um objetivo, e o coloca para o pagamento de dívidas contraídas pelo município. “O CMPU é um conselho paritário, formado meio a meio por governo e sociedade civil e que tem sido bastante atuante, tanto que conseguimos barrar algumas das tentativas do governo de usar o recurso do fundo para outros objetivos, como por exemplo a reforma do paço orçada em R$ 15 milhões e a compra de carro para a Defesa Civil. O dinheiro do fundo é carimbado e garantido pela lei federal e a gestão deste fundo é do conselho e não do governo”, explica.

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O Fundo Municipal de Desenvolvimento Urbano é um dos fundos com maior volume de recursos isso porque ele é constituído com recurso público que vem das outorgas onerosas, ou seja, dinheiro pago por construtoras para poderem construir mais na cidade, uma compensação pelo uso do solo. De acordo com o Estatuto das Cidades o dinheiro da outorga onerosa deve ser usado para o ordenamento da expansão urbana, em programas habitacionais, criação de espaços de lazer e comunitários e ainda a preservação de áreas de interesse histórico, cultural ou paisagístico. “Os fundos são criados para se garantir uma verba mínima para cada área e o prefeito quer ‘descarimbar’ esse dinheiro para cobrir a dívida da prefeitura”, diz Raquel.

A representante do MDV alerta para conselhos em que a presença da sociedade civil em comparação com os membros ligados ao governo não é paritária. O Fungephapa (Fundo de Gestão do Patrimônio Histórico da Vila de Paranapiacaba e Parque Andreense) teria, segundo Raquel, apenas um representante da sociedade civil e seis do governo. “Para todos os fundos, existe um claro cerceamento da participação popular nas decisões. Se os recursos vão ser utilizados para os respectivos fins, para quê tirá-los dos fundos? Trata-se então de ‘matemágica’, onde  recursos destinados à educação, política urbana e Paranapiacaba, por exemplo, vão ser utilizados para pagar dívidas mal geridas. Alguns fundos em particular têm gestão e utilização dos recursos disciplinados por lei, o que pode gerar problemas legais para a atual gestão.”, opina Raquel Fernandez Varela.

A conselheira Elena Rezende, que faz parte do Comugesan (Conselho Municipal de Gestão e Saneamento Ambiental de Santo André), teme que o governo passe a não mandar projetos para usar as verbas dos Fundos Municipais e, assim, ao final do exercício retirar esse dinheiro para pagamento de dívidas municipais. “Se existe um fundo e o dinheiro dele não é gasto, é por incompetência do governo municipal”, aponta a conselheira que participou da audiência pública na Câmara de Santo André nesta segunda-feira (25/11) e questionou o secretário de Gestão Financeira, Pedro Henrique Ruiz Seno, sobre os recursos do fundo. De acordo com ela, o secretário disse que a prefeitura também usa dinheiro do tesouro municipal para obras nas mesmas áreas em que os fundos municipais atuam. “Se gastou com a mesma finalidade é má gestão do governo. Essa discussão de tirar o dinheiro dos fundos tem que passar pela discussão dos conselhos, não pode ser feita assim, a (Lei Orgânica Municipal)  prevê a gestão democrática dos conselhos. Eles não podem alegar que estão fazendo igual fez Porto Alegre, lá eles passaram por uma tragédia, aqui não temos uma situação assim”, completa Elena.

O prefeito, em sua mensagem ao Legislativo que acompanha o projeto de lei, diz que o recurso será usado para pagar a dívida pública, mas sustenta que a medida não pode trazer prejuízo às políticas públicas. “Vale dizer que os recursos obtidos através da desvinculação do superávit financeiro serão destinados à amortização da dívida pública do município, inclusive dos precatórios e, na ausência de dívida pública a amortizar, o superávit financeiro desvinculado dos fundos municipais, poderá ser utilizado na garantia da sustentabilidade financeira do município, quando em situações de déficit ou necessidade emergencial de recursos. Por derradeiro, destacamos que a pretendida desvinculação do superávit financeiro dos fundos municipais ao Tesouro Municipal fica condicionada à obediência das normas constitucionais e legais pertinentes a aplicação dos recursos do fundo municipal e em não implicar em prejuízo às políticas públicas de criação do fundo municipal”, destacou Serra. As comissões de Justiça e de Finanças da Câmara deram aval ao projeto de lei.

Dezoito fundos municipais serão afetados: Habitação, Iluminação Pública, Trânsito, Transporte, Segurança, Proteção e Defesa do Consumidor, Gestão do Patrimônio Histórico da Vila de Paranapiacaba e Parque Andreense, Saneamento Ambiental e Infraestrutura, Promoção da Igualdade Racial, Fundo do Trabalho, Desenvolvimento Econômico, Emprego e Turismo, Proteção e Defesa Civil, Desenvolvimento Urbano, Apoio ao Esporte, Preservação da Arborização Urbana, Conservação Viária, Proteção dos Animais e Gestão dos Parques Públicos e Unidades de Conservação.

 

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