A PEC (Proposta de Emenda Constitucional) que prevê a redução da jornada máxima de trabalho de 44 para 36 horas semanais, a chamada PEC 6×1, que esta semana teve o número de assinaturas suficientes para ser protocolada na Câmara dos Deputados, já causa grande preocupação no meio empresarial, que prevê perdas no faturamento e na produção. Para economista do Dieese a preocupação é exagerada e o debate ainda mal começou no Congresso.
Empresários estão incomodados com a proposta ter entrado para discussão no Congresso sem antes um debate com os setores econômicos e também com o governo. Para Valter Moura Júnior, presidente da Acisbec (Associação Comercial e Industrial de São Bernardo do Campo), os empresários terão que reorganizarem a produção ou atendimento, no caso de serviços e contratar mais mão de obra para cobrir os dias de folga.
“O nosso posicionamento é que isso é uma barbaridade porque uma PEC para reduzir a carga horária não mexe só com os trabalhadores, mexe com toda a economia, por isso tem que discutir com toda a sociedade, que inclui os trabalhadores, os empresários e com o governo e este último vai ter que ver como reduzir a carga de encargos trabalhistas para os empresários contratarem outros funcionários”, aponta Moura.
Segundo Moura Júnior, ou o empresário terá que contratar mais ou vai reduzir a produção, e com isso terá mais custo ou menos faturamento. “Se tem dois caminhos, ou supre os dias com amsi funcionários e isso vai elevar o custo, ou produz menos. Isso vai levar ao fechamento de pequenas e microempresas. O governo teria que eliminar encargos e negociar com os empresários. Um outro efeito vai ser a diminuição dos salários, já que o trabalhador vai trabalhar menos, também vai ganhar menos. O argumento de que o trabalhador precisa de mais tempo com a família vai penalizar o empresário que terá menos tempo. Enquanto isso o governo tira o foco da redução do gasto público”, critica. Apesar do descontentamento com a medida, o presidente da Acisbec acredita que tem espaço durante os debates sobre a PEC para negociar mudanças. “O debate é essencial, e como disse o ministro do trabalho, Luiz Marinho, essa discussão tem que ser travada entre a classe trabalhadora e os empresários. Da forma como foi proposta a PEC joga um contra o outro trabalhadores e empresários”, completa.
Para o presidente do Sehal (Sindicato das Empresas de Hospedagem e Alimentação do ABC), Beto Moreira, prevê falência de empresas se a PEC não for alterada durante seu trâmite. “O fim da escala 6×1 poderá exigir contratações adicionais para manter os padrões de atendimento e serviço dos estabelecimentos e vai impactar bastante o setor de hospitalidade, como restaurantes, hotéis, enfim, todas as empresas que operam com horários prolongados. Em um restaurante, que abre pela manhã e fecha à noite, ou em hotéis e motéis que funcionam 24 horas, será necessário contratar mais funcionários para manter o mesmo padrão de serviço e atendimento. Além de tudo, a mudança na logística e nas escalas elevará os custos com mão de obra, o que pode, inclusive, levar algumas empresas à falência”, sustenta.
O diretor titular do Ciesp (Centro das Indústrias do Estado de São Paulo) de Diadema, Anuar Dequech Júnior, diz que sem ampla discussão as entidades da indústria não aceitam a proposta. “Pelo Ciesp, oficialmente ainda não temos nada a comentar sobre o assunto, estamos nos aprofundando no tema para entender melhor a proposta e emitir uma opinião. Temos reunião na próxima semana e tenho certeza que comentaremos o assunto para definir o caminho que vamos seguir. Sem um estudo prévio fica difícil se posicionar”, disse ao RD. A reportagem também procurou os diretores de outros Ciesps da região, que também não quiseram tecer comentários sobre o tema.
Adaptação
O economista do Dieese (Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos), Warley Soares, explica que o fim da escala 6×1 é uma pauta dos movimentos sindicais já faz tempo e que não há indicativos dos problemas citados pelos empresários. “Se pegarmos ao longo da história, toda vez que tem um avanço na legislação do trabalho os empresários pensam assim, mas rapidamente eles se adaptam e essa proposta ainda vai ter transformações no Congresso”, avalia.
Para Soares, o setor mais impactado será o do comércio que é o que adota mais a escala 6×1. “Na maioria dos acordos coletivos que são fechados já não há mais essa escala e quando tem a carga horária é muito abaixo das 44 horas semanais. A escala 6×1 acontece mais no comércio mesmo e o empresário, desde a reforma trabalhista, tem como contratar folguistas para cobrir os horários do fim de semana, então o mercado se adapta rapidamente”, avalia.
Para o economista o emprego nas empresas que adotam a jornada de 6×1 há muita rotatividade de trabalhadores. “Acaba ficando uma ocupação transitória, porque essa escala é tão penosa que o trabalhador só espera a oportunidade de mudar para outro emprego com carga horária menor”, destaca.
Warley Soares considera que muitos debates vão ocorrer e o empresariado vai pressionar seus representantes na Câmara e no Senado por atenuação da PEC. “O Congresso tem muita representação dos empresários apesar dessa pauta agregar vários partidos”, completa.
Repercussão
Na política do ABC a medida repercutiu e gente de diferentes ideologias falando sobre o tema. O vereador de Diadema Josemundo Dario Queiroz, o Josa, (PT) falou que a medida é importante e aproveitou para convocar trabalhadores para atos em favor da PEC. “Que bom que a maioria dos deputados entendeu a importância do debate e dessa discussão, mas precisamos ter apoio popular. Essa pauta unifica não apenas a esquerda, unifica os trabalhadores e as trabalhadoras por um tratamento mais justo, mais igualitário, decente e com mais qualidade de vida”, disse em sua rede social.
O ato a que Josa se refere acontece na avenida Paulista nesta sexta-feira (15/11), a partir das 9h. Em Diadema, está previsto outro ato neste feriado, só que às 16h na Praça da Moça.
O prefeito de São Bernardo, Orlando Morando (PSDB), admite que a pauta é polêmica e aproveitou para criticar o governo Lula. “Um dia a mais de descanso, OK, quem não quer ter um dia a mais de folga? Mas o governo lançou isso porque tem outras coisas que ele precisa resolver e não resolve, como o corte de gastos, depois precisa discutir a questão das BETs que está tirando o dinheiro do trabalhador para jogo. Sobre a escala, o trabalhador vai ter que ganhar hora extra, aumenta o custo da empresa, então tem que ser uma discussão ampla, para mim a pauta surgiu para fazer uma cortina de fumaça para o governo se esconder daquilo que precisa fazer”, critica.
Ministério do Trabalho
O ministro do Trabalho, Luiz Marinho, defendeu o fim da escala 6×1 sem redução salarial. Segundo ele, essa jornada atual é “cruel”. No início desta semana, a pasta publicou uma nota propondo que a mudança fosse resolvida por meio de negociações entre empresas e trabalhadores. “A jornada 6×1 é cruel. Pensar você um, dois, três, quatro, dez anos, ter um único dia de folga na semana, imagina só o quanto é cruel, em especial para as mulheres”, disse. Marinho reiterou que o governo tem “grande simpatia” pela proposta e pede serenidade no debate para que seja possível trabalhar fortemente pelo fim da jornada 6×1. “É minha posição. Mas aqui entra fortemente o papel da negociação, da convenção coletiva, do entendimento, porque fixação de horários deve ser feita em mesa de negociação”, completou.