Dino bicudo e sem dentes achado no PR pode ajudar a entender como surgiram as aves

Uma nova espécie de dinossauro brasileiro, chamada de Berthasaura leopoldinae, foi apresentada na manhã desta quinta-feira, 18, por pesquisadores do Museu Nacional e da Coppe, ambos da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), e do Centro Paleontológico da Universidade do Contestado, em Santa Catarina (Cenpaleo). É a primeira espécie desdentada já achada na América Latina. A descoberta pode ser crucial na compreensão da evolução desses répteis.

Uma tomografia computadorizada revelou que, apesar de pertencer ao grupo dos terópodes – em que predominam animais carnívoros como o Thyranossaurus rex -, a Berthasaura não tinha dentes. Era dotada de uma espécie de bico, com uma lâmina óssea bem desenvolvida na arcada superior. É muito diferente de todas as espécies encontradas no País até hoje. Para os pesquisadores, a descoberta pode ajudar a entender como se deu a transição dos dinossauros do passado para as aves atuais.

Newsletter RD

“De todas as descobertas de que participei em minha carreira, eu diria que essa está entre as cinco maiores”, afirmou o paleontólogo Alexander Kellner, diretor do Museu Nacional. Ele é um dos autores do trabalho, publicado na “Scientific Reports”, a plataforma de acesso aberto da “Nature”.

‘Bertha tem bico semelhante ao das aves atuais

O fóssil é um dos mais completos desses répteis já achados no Brasil. Foi encontrado no município de Cruzeiro do Oeste, no Paraná. Trata-se de um animal de porte pequeno, com cerca de um metro de comprimento. Viveu entre 70 e 80 milhões de anos atrás, no período Cretáceo.

“Temos restos do crânio e mandíbula, coluna vertebral, cinturas peitoral e pélvica e membros anteriores e posteriores, o que torna “Bertha” um dos dinos mais completos já encontrados no período Cretáceo brasileiro”, contou Kellner.

Mas, segundo o paleontólogo, o que torna esse dinossauro genuinamente raro, é o fato de ser um terópode desprovido de dentes. Foi o primeiro com essa característica encontrado no País, “uma verdadeira surpresa”, o que foi confirmado por meio de uma microtomografia computadorizada.

O doutorando do Programa de Pós-Graduação em Zoologia do Museu Nacional da UFRJ Geovane Alves Souza desenvolveu uma pesquisa sobre o novo dino como parte de sua tese de doutorado. Segundo ele, “além da Berthasaura não possuir dentes, a espécie também não apresentava qualquer sinal da existência de cavidades portadoras de dentes (alvéolos) na mandíbula e no maxilar”. Foram identificadas, afirmou, marcas e sulcos que sugerem a presença de um bico de queratina. É semelhante ao das aves atuais.

“É difícil confirmar se a Berthasaura poderia ter usado seu bico para rasgar nacos de carne, assim como os gaviões e urubus fazem hoje em dia, ou se o bico seria utilizado para cortar material vegetal”, afirmou Souza. “Vivendo em uma área restrita como o deserto, esse dinossauro deveria se alimentar do que estivesse disponível, tendo provavelmente desenvolvido uma dieta onívora (que incluía vegetais e animais).”

Réptil estava em ‘cemitério de pterossauros’

O fóssil foi encontrado em escavações conduzidas entre 2011 e 2014, por equipes do Cenpaleo e do Museu Nacional. O trabalho foi em uma região conhecida como “cemitério de pterossauros”. É rica em fósseis de répteis voadores.

“Na última década, dezenas de fósseis foram coletados nessa região, o que levou a descrição de novas espécies, particularmente de pterossauros”, contou o geólogo Luiz Weinschutz, do Cenpaleo, que coordenou as escavações. “Essa nova descoberta de um dinossauro, o segundo achado na região, mostra a importância desse sítio fossilífero.”

Os cientistas não conseguem saber se, de fato, o animal era do sexo feminino. Mas o nome escolhido foi uma tripla homenagem, explicou a pesquisadora Marina Bento Soares.

“Bertha se refere à professora/pesquisadora Bertha Maria Júlia Lutz (1894 – 1976), bióloga do Museu Nacional/UFRJ e uma das principais líderes na luta pelos direitos políticos das mulheres brasileiras”, contou. “Já leopoldinae homenageia tanto a Imperatriz brasileira Maria Leopoldina (1797 – 1826), que foi uma grande entusiasta das ciências naturais e uma das principais responsáveis pela Independência no Brasil, como também a escola de Samba Imperatriz Leopoldinense que honrou o Museu Nacional/UFRJ com o tema do seu desfile na Marquês de Sapucaí em 2018.”

Receba notícias do ABC diariamente em seu telefone.
Envie a mensagem “receber” via WhatsApp para o número 11 99927-5496.

Compartilhar nas redes